Política: os recursos de governo disponíveis ao dirigente público, suas estratégias de atuação e o Governo Lula
O governo Lula entra na metade de sua gestão. É preciso que nossos dirigentes façam os balanços daquilo que prometeram no seu plano de governo
Para governar, qualquer líder ou dirigente político - não importa em quais dostrês níveis de governo - tem à sua disposição uma gama de recursos materiais e imateriais. A busca por deter e acumular esses recursos fica evidenciada pelo placar do jogo sociopolítico que é indicado pelo nível da correlação de forças de cada um, em determinada circunstância ou situação. Para obter sua governabilidade sobre o jogo, ele dependerá de quanto de recursos detém, quer dizer, de seu poder político em relação aos outros jogadores. Esse placar do jogo é situacional muda a cada instante, a depender das jogadas dos atores sociais. A alusão desse processo é o jogo de xadrez; mas é também um jogo de adesão e oposição. Nessa arena, digladiam-se ou se atraem atores sociais que, por possuírem recursos políticos, econômicos, financeiros, tecnológicos ou de organização e mobilização, dentre outros, estão aptos a jogar. Só pode jogar e interferir nesse jogo, quem tem recursos para tanto, quem detém algum poder para influenciar a mudança situacional do xadrez.
Na sociedade, é um jogo constituído pelos representantes de segmentos e de classes sociais, que se constituem em atores sociais. Esse jogo é também um jogo de acumulação e perda de recursos, quer dizer, de poder. Por isso, esse jogo tem ganhadores e perdedores momentâneos, situacionais. Estamos aqui diante de uma realidade que muda e se transforma constantemente, e até mesmo, de forma instantânea. É, assim, um jogo situacional que muda a cada jogada dos atores sociais. Esse é o jogo político da democracia. É um jogo de adversários, mas também de aliados, portanto, como já referido, um jogo de correlação de forças e de permanente tensão e espionagens mútuas. Cada ator busca se capacitar, com alianças estratégicas e táticas para adquirir mais governabilidade a fim de emplacar seus objetivos. Quanto maior força em seu favor, mais governabilidade e capacidade de governo das situações representadas pela realidade das conjunturas. Nenhum governante detém 100% de todos os recursos, mesmo em um regime ditatorial (aqui há, também, a ocorrência de resistências, mesmo que clandestinas). Mas é na democracia que esses recursos estão distribuídos, de forma desigual, claro, entre os atores sociais que têm capacidade de interferência na mudança das situações, em seu favor ou não. Podem acumular em uma jogada tática ou podem perder e, assim, desacumular poder no jogo.
Como atuar, então, em uma situação política em que não há determinismo (certeza) em seu resultado, mesmo que momentâneo, mas sim incertezas quanto ao plano almejado?
Em artigo anterior, discorri sobre estilos de governar, quais sejam, um tipo mais duro de agir em que o dirigente político detém muito poder e impõe sua vontade, não reconhece qualquer oposição, sendo, portanto, um regime ditatorial. Um segundo estilo em que há o reconhecimento de oponentes (do outro) e se é obrigado a, minimamente, pensar antes de agir, usando de artimanhas e diversionismo diante de possíveis oponentes para poder tentar congelar sua ação. E um terceiro, que é o estilo de uma permanente negociação almejando o consenso entre as partes. Este último é como um verdadeiro líder esclarecido e democrata atua preponderantemente.
Diante desse quadro, podemos alinhar várias estratégias de ação disponíveis a um governante que atua, em uma democracia. Estamos aludindo a um dirigente que, por princípio, atua no terceiro estilo acima descrito. Esse modo de governar concede ao líder grande valor de força moral (credibilidade e confiança) para buscar soluções de consenso através de uma permanente negociação dos objetivos conflituosos que se estabelecem em determinadas situações entre os atores sociais do jogo democrático.
As estratégias do jogo sociopolítico que um dirigente público pode lançar mão são de variados aspectos, e que, indubitavelmente, estão presentes na atuação de líderes nos três estilos de governo. Os recursos disponíveis na sociedade para a efetivação do jogo político-social são de diferentes dimensões: recursos econômicos e financeiros (orçamento, máquina estatal, financiamento e investimento), tecnológicos e científicos (know-how, conhecimento), comunicação social, organização e mobilização da sociedade ou de aliados e outros ainda. Esses recursos, como já mencionado, são repartidos entre os atores sociais atuantes no jogo. Alguns atoressão mais hegemônicos na manipulação de alguns recursos, outros nos demais.
A regra do jogo é a acumulação de poder. De fato, cada jogador busca a governabilidade das situações através dessa estratégica. As táticas são também variadas: alianças entre os jogadores, dissuasão, dissimulação, cooptação, traição etc. Quem é aliado hoje, pode ser oponente em outra situação ou indiferente lá adiante.
Um estadista deve saber usar essas estratégias e táticas. Atrair o oponente para aderir a seu projeto de governo, através da negociação e há de ter expertise em manejar os três estilos de governar: o de saber dizer não a determinados pleitos da oposição, o de lançar mão da postergação das respostas e o de negociar permanentemente, em determinadas circunstancias, até mesmo como árbitro nas lutas e ambições de outros jogadores. Em síntese, a atuação de governar pode ser descrita por três determinantes: (i) o Plano de Governo do dirigente (é o rol de macroproblemas que prometeu resolver ao ser eleito) (ii) a Governança do Plano (é o manejo dos recursos para realizar os objetivos do plano- é a gestão do plano – tem a ver com todos os aspectos econômicos) e, (iii) a Governabilidade do Plano (é a correlação de forças que o governante deve perseguir
sempre ao longo de sua gestão- é a condução política do Plano, quer dizer do próprio Governo em si).
Como atuar, então na condução do governo? Um bom governante deve estar atento durante a sua gestão para três tipos de balanços: (a) o balanço político (está mais ligado à questão de sua governabilidade, que por sua vez reflete o grau de adesão dos atores sociais a seu projeto de governo; o balanço econômico (está ligado à governança; a avaliação dos resultados dos indicadores socioeconômicos e a da utilização dos recursos – foi eficiente, eficaz foi efetivo?) e, finalmente (c) o balanço dos resultados da solução dos problemas prometidos em seu plano de governo).
Esses balanços hão de ser feitos e monitorados de forma permanente em todo o período da gestão. Fica claro que o grande balanço, ao final do governo, se for deficitário nas três avaliações será a derrocada de seu líder, que se refletirá no resultado de sua (re)eleição futura. Entretanto, como as situações são carregadas de relatividades, pode ocorrer que em um ou dois dos balanços a avaliação não seja totalmente deficitária e o dirigente se torna ainda capacitado a continuar no jogo político.
Tudo isso, para dizer de nossa preocupação, como cidadão, sobre a atual conjuntura política do País. O governo Lula entra, agora, na metade de sua gestão. É preciso que, urgentemente, nossos dirigentes façam os balanços positivos e os negativos daquilo que prometeu em seu plano de governo. Ao ver os indicadores, eles nos soam positivos em determinados aspectos, mas o quer falta ainda? O manejo dos recursos econômicos, financeiros e de organização é o locus atual das grandes contradições e lutas, que por sua vez, depende do constante balanço da governabilidade, onde efetivamente se dá a luta de quem ganha e quem perde.
Como será o amanhã? Não nos é dada a capacidade de predizer o futuro. Entretanto, o homem é o sujeito de sua História e acreditamos que, mesmo na adversidade, ele poderá moldar uma perspectiva promissora, não em sua totalidade, como gostaria, mas ao menos, em parte. Será, contudo, preciso jogar com destreza e lutar permanentemente para acumular força.
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