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    George Torres Barbosa

    Advogado concursado da Petrobrás de 1990 a 2021. Foi presidente do Conselho de Administração da Termomacaé Ltda., conselheiro da UEG ARAUCÁRIA e diretor financeiro da Baixada Santista Energia SA. É especialista em direito ambiental e LL.M. em direito corporativo

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    Pra não dizer que não falei de flores. Primavera de 2024

    "Hidrogênio verde e expansão fotovoltaica marcam a transição energética no sertão potiguar"

    (Foto: Paulo Emílio)

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    A UTE Jesus Soares Pereira, incluída no PAC juntamente com a Refinaria Clara Clara Camarão, ambas da Petrobrás e situadas no Rio Grande do Norte, reverenciam personalidades construtoras da nação brasileira. A UTE Jesus Soares Pereira implantou uma usina fotovoltaica, a partir de 2012, cujos aspectos regulatórios e obtenção de financiamento, com recursos de Pesquisa & Desenvolvimento, acompanhei de perto. Gerando 1,1 MW, em virtuosa articulação do Centro de Tecnologias Renováveis do Gás & Energias Renováveis (CTGAS-ER), da Petrobras, com o Laboratório de Eletrônica de Potência e Energias Renováveis do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), apoiados pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) no que tange às atividades de prospecção solar.

    Naquele engenhoso arranjo institucional, seis estações de captação de dados da energia solar CTGAS-ER, da Petrobrás, complementam o Sistema Nacional de Organização de Dados Ambientais (Rede Sonda) do INPE. O CTGAS-ER teria laboratório, acreditado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) para homologar equipamentos usados na geração fotovoltaica, além de um centro de capacitação e certificação de pessoal para atuar em projetos, montagens, operação e manutenção de sistemas fotovoltaicos. Aquela planta tenra que vicejou, a partir de 2012, na aridez do sertão frutifica, neste novembro de 2024, em novo investimento de Pesquisa & Desenvolvimento, consubstanciado numa planta de hidrogênio verde, em venturosa sinergia com aquela experiência pioneira localizada no sertão do Alto do Rodrigues, experiência da qual tive a honra e o privilégio de participar na antiga diretoria de Gás & Energia da Petrobrás.

    O hidrogênio verde será obtido pela eletrólise da água com uso de energia solar. A usina de eletrólise terá diferentes modos de operação, variando a conexão com a malha de distribuição de energia elétrica da UTE Jesus Soares Pereira e o sistema de armazenamento de energia já instalado naquele ativo da Petrobrás. A usina fotovoltaica, originalmente concebida para pesquisa e desenvolvimento, terá sua capacidade ampliada de 1,1 MWp para 2,5 MW e hidrogênio se destinará, não só, para geração de energia mas, também, em estudos sobre adição do hidrogênio ao gás natural, abastecendo microturbinas cujo desempenho e integridade estruturais serão testados com essa mistura inovadora.

    Segundo a Petrobras, a adição do hidrogênio verde ao gás natural em microturbinas tem caráter pioneiro no Brasil. Maurício Tolmasquim, diretor de Transição Energética e Sustentabilidade da Petrobras, declarou que o projeto é crucial na estratégia de investir em descarbonização, sic: “É o primeiro passo para futuras iniciativas comerciais no segmento de hidrogênio sustentável. A produção de hidrogênio renovável a partir da eletrólise da água utilizando energia solar não apenas reduz a emissão de gases de efeito estufa, como também promove o uso de recursos naturais abundantes e sustentáveis no país”. Uma nota terminológica: a Petrobrás, durante a era Temer/Bolsonaro retirou os nomes históricos com os quais seus ativos foram batizados nos primeiros governos de Lula pelo, então, diretor de Gás & Energia, Ildo Sauer, que homenageavam grandes vultos da nação, como as UTEs Barbosa Lima Sobrinho, Leonel Brizola, Romulo Almeida, Aureliano Chaves, Euzébio Rocha, Fernando Gasparian, Luís Carlos Prestes, Mário Lago, Sepé Tiarajú e a Jesus Soares Pereira, agora denominada Termelétrica do Vale do Açu. Com os navios, nossos algozes tiveram mais dificuldade devido ao regime de inscrição no Registro Geral de Imóveis, e, assim, tiveram que continuar com os nomes de navios tais como João Cândido, Dragão do Mar e Celso Furtado.

    Naqueles primeiros mandatos de Lula, além da geração de energia elétrica, a partir do gás natural, havia um vaporduto, partindo da UTE Jesus Soares Pereira, levando exaustos de vapor da usina para estimular a produção de petróleo no mar. O vaporduto já foi desativado, após a privatização de 22 campos de petróleo do Polo Potiguar, junto com a refinaria Clara Camarão, entregue de brinde para a 3R Petroleum de Roberto Castelo Branco, "ex-CEO da Petrobras", por indicação de Paulo Guedes, ao arrepio do marco regulatório que deveria ser implementado pela ANP. A 3R Petroleum, para onde migraram 14 ex-gestores de topo da Petrobrás na era Bolsonaro, secundado o seu líder Castelo Branco, adotou o nome de Brava, logo após a fusão com a Enauta, também aquinhoada regiamente com aquisição de campos petrolíferos da Petrobrás à preços módicos. Na gestão de Pedro Parente, vendeu-se o campo de Carcará para a norueguesa Statoil, hoje Equinor, tendo o preço do barril de 159 litros, que hoje custa cerca de 419 reais, sido entregue por preço equivalente ao de uma lata de refrigerante. A Enauta era dirigida por Décio Odone, ex-presidente da Petrobrás/Bolívia, e, depois, guindado à diretoria-geral da ANP, como tantos outros beneficiários daquela cornucópia que jorra, continuamente, das portas giratórias, aqui em Pindorama e, também, alhures como denota a expressão inglesa "Revolving Doors" muito conhecida dos estudiosos da propalada governança corporativa.

    Eu atuava, exatamente, na governança corporativa de participações societárias da Petrobrás, nas sociedades proprietárias de ativos em energia, como a UTE Jesus Soares Pereira, no Rio Grande do Norte, e de outras 9 UTEs, movidas a gás natural, o combustível da transição, em diversos estados; na governança da Brasil PCH, que é a holding de 13 pequenas centrais hidroelétricas, já privatizada na bacia das almas como outros 63 ativos que, apesar de vendidos a preço vil, totalizaram 32,3 bilhões de dólares ou 187,66 bilhões de reais, transformados em dividendos estratosféricos, os maiores do planeta, àquela época, em detrimento dos investimentos necessários à perenidade da Petrobrás.

    A refinaria Landulfo Alves-RLAM, em Mataripe na Bahia, a primeira do Brasil foi vendida na era Bolsonaro ao fundo Mubadala, dos Emirados Árabes, junto com Terminal Marítimo Madre de Deus e seus dutos, por meros 1,65 bilhão de dólares, muito menos da metade do preço estimado pela XP e pelo BTG, cuja avaliação ia de 3,6 a 4 bilhões de dólares e, pasmem, por valor menor do que constava na apólice de seguro da RLAM, sob a falaciosa argumentação de promover a concorrência. Hoje a Acelen, sob controle do fundo Mubadala, vende derivados bem mais caros do que a Petrobrás. Na gestão de Jean Paul Prates, a área de conformidade da companhia abriu um processo interno contra o coordenador da Frente Única dos Petroleiros – FUP por cobrar apuração de responsabilidades dos gestores que conduziram essa benemerência aos pobres coitados do Fundo Mubadala. Como estou aposentado, não conheço o deslinde desse processo.

    Quando eu estava na ativa, tinha a responsabilidade pela governança do Parque Eólico de Mangue Seco, igualmente localizado no Rio Grande do Norte, cujas 4 sociedades, integrantes do Parque Eólico já foram todas privatizadas. Na UTE Jesus Soares Pereira, lutei por anos contra a voracidade da nossa sócia privada, a Neoenergia, em uma exaustiva arbitragem que tinha o influente escritório de Sérgio Bermudes como advogado da Neoenergia.

    Na Termomacaé Ltda, proprietária da UTE Mário Lago (922 MW de potência, maior do que Angra 1), cujo Conselho de Administração eu presidi por 2 mandatos consecutivos, litigamos contra a texana El Paso, apesar da oposição dos meus superiores na estrutura da Petrobrás que procuravam todos os meios e modos de pagar o suposto benefício tributário que a El Paso alegava existir, quando da compra de cem por cento da sociedade pela Petrobrás, por meio do Quota Purchase Agreement, assinado pelo chefe do Jurídico e o da área de Novos Negócios da Petrobrás. Por falar em fraudes tributárias, o meu primeiro grande embate foi contra o desvio de ICMS na Refinaria de Manaus, orquestrado pela equipe do governador Gilberto Mestrinho, o Boto Tucuxi, em 1990, que ao receber o cheque administrativo da Petrobrás no Banco do Estado do Amazonas-BEA, único credenciado pela Secretária de Fazenda-SEFAZ, e lá chancelava o Documento de Arrecadação-DAR em uma máquina fria, compensando, concomitantemente, o valor recolhido com uma duplicata fria, provinda do Banco Rural na mesma data e de mesmo valor do DAR. A quadrilha com tentáculos no BEA e na SEFAZ praticava o desvio, quinzenalmente, sempre que aportava um navio da Venezuela, trazendo o óleo Leona para ser refinado na REMAN. O que os meliantes não esperavam é que eu obtivesse os microfilmes dos cheques administrativos emitidos pela Petrobrás, no Banco do Brasil, responsável por toda a compensação àquela época, e desvendasse a trama. Ajuizei uma responsabilidade civil contra o BEA e a SEFAZ pois o artigo 58, da Lei do Cheque, estabelece que o cheque nominativo, indicando no verso a finalidade do pagamento vale como quitação. Então, o superintendente da REMAN dizia que eu estava prejudicando a relação institucional da Petrobrás com o Estado do Amazonas e passou a me perseguir ferozmente. Depois de dois assassinatos, naquele triste episódio, o Superintendente do SEJUR, Helio Shigenobu Fujikawa, me resgatou daquele verdadeiro batismo de fogo e vim para a Divisão de Contratos em 27 de março de 1992.

    Retornando à fraude tributária perpetrada pela El Paso, que encaminhou à Receita Federal supostos créditos para compensação jamais homologada ao ponto de fazer recair sobre o terreno da UTE Mário Lago e suas 22 turbinas um espécie de arresto administrativo ao cabo da história que culminou com a constatação de crime contra a ordem tributária, cometido pelo presidente da El Paso no Brasil, Eduardo Rabelo Karrer, ex-empregado da BR Distribuidora, também privatizada por valor equivalente ao Copacabana Palace. No embate com meu chefe na Gerência Geral de Participações Societárias, eu defendia a tese de que, só após a homologação pela Receita Federal, poderíamos fazer o reembolso pleiteado pela El Paso com base no Quota Purchase Agreement. Meu chefe na estrutura da Petrobrás era o diretor financeiro lá na Termomacaé e chegou a contratar um parecer da ex-ministra Ellen Gracie Northfleet, para encerrar a questão e respaldar sua sofreguidão por realizar o pagamento indevido que eu dizia só ser possível mediante uma garantia bancária ou homologação pela Receita Federal. Ao apresentarmos essa proposta da garantia bancária à El Paso, ela ofereceu garantias corporativas no melhor estilo “La Garantia Soy Jo” o que era inaceitável. Então, a El Paso instaurou arbitragem internacional em Nova York e, na sequência, fui exonerado da gerência de participações societárias da Petrobrás mas o diretor de Gás & Energia, Alcides José Santoro, me manteve na presidência do Conselho de Administração Termomacaé e, também, no CD da UEG Araucária contra reiteradas solicitações de dispensa da minha parte pois o Jurídico, ao qual eu retornara para exercer meu cargo permanente de advogado, objetava minha atuação nos Conselhos e, sobretudo, viagens para ir à reuniões.

    Um belo dia o Diretor Alcides me chama em seu gabinete, às 7 horas e meia da manhã, e revela que havíamos vencido a arbitragem contra a El Paso em Nova York, integralmente, com base nos meus argumentos, apesar de meu antigo chefe haver enviado uma antiga contadora da própria El Paso, comprometida com a origem do imbróglio tributário na Termomacaé, cujo ingresso na Petrobrás, sem prestar concurso, ele propiciou. Tal contadora foi à Nova York, às vésperas da decisão arbitral, com o fito de fazer uma derradeira oferta de acordo à El Paso que a rejeitou, prontamente, crendo em um provável êxito na arbitragem. Quando o diretor de Gás & Energia, José Alcides Santoro, me revelou o deslinde favorável, in totum, à Petrobrás depois daquele calvário que me custara a exoneração, junto com outras lutas inglórias, vi que o sacrifício não fora em vão e me emocionei, às lágrimas, tangindo por um sentimento de brasilidade do qual comungamos todos nós, os verdadeiros petroleiros. É a energia que nos anima a travar o bom combate na defesa da soberania nacional com desenvolvimento inclusivo e sustentável, desiderato que tem na Petrobrás uma alavanca que, se aplicada, no ponto certo pode mover o mundo.

    Na UEG Araucária, posteriormente privatizada de cambulhada, na esteira da privatização da própria sócia majoritária, a estatal paranaense COPEL, por decisão do governador Ratinho, travamos uma luta épica contra um dos maiores ícones do capitalismo estadunidense. Naquela sociedade, eu fui o mais longevo conselheiro de administração indicado pela Petrobrás e havíamos instaurado arbitragem internacional contra a maior epcista (engenering, procurement and construction) do mundo, a Bechtel Corporation. Aquela arbitragem tinha por objeto definir a responsabilidade por defeito construtivo na usina da UEG Araucária. Conseguimos preservar partes da turbina sinistrada no CEPEL da Eletrobrás e produzimos prova material daquilo que os estadunidenses nomeiam de “Gross Negligence” perpetrada pela Bechtel.

    A Gross Negligence enseja indenização por danos emergentes e, também, lucros cessantes, uma condenação algo rara nos EUA. A Bechtel tentou frustrar nosso êxito na arbitragem, levando a questão ao judiciário do estado de Nova York, sob a alegação de prescrição. O Jurídico da Petrobrás era contrário ao recurso da UEG Araucária. Porém, como a COPEL era sócia majoritária naquela sociedade, e ainda estávamos sob a égide do governo Requião, quando da instauração da arbitragem, tínhamos mandato para ir às últimas consequências desde o início do litígio até o deslinde final. Então, fomos à Suprema Corte de Nova York e derrotamos a Bechtel em seu próprio terreno. Minha trajetória de 3 décadas na Petrobrás me ensinou que é sempre uma luta hercúlea ousar defender a Petrobrás de seus algozes e da sua própria tecnoburocracia, capturada, em parte, por stakeholders (grupos de interesse) e shareholders (acionistas).

    Na década de 90, fui afastado de minhas funções como assessor jurídico no projeto do gasoduto Brasil Bolívia - GASBOL, ao apontar, em parecer de 1992, inúmeras ilegalidades na contratação do CSFB, sem licitação, a peso de ouro pela própria Petrobrás, para desenhar a engenharia financeira que só favorecia à Enron; à Shell e à British Gas. O líder do projeto na Petrobrás, Luis Carlos de Lemos Costamilam, foi presidir a British Gas, logo depois de concluir a tarefa, e dezenas de colegas, envolvidos naquela empreitada, tiveram suas carreiras catapultadas, meteoricamente, dentro e fora da Petrobrás, no governo e na iniciativa privada. Eu fui para o corredor da morte, como divulgou o jornalista Chico Otávio no Estado de São Paulo, em matéria de junho de 1992, com a manchete: “CONTRATO SERIA COMO ENTREGAR UM CHEQUE EM BRANCO AO BANCO”. Graças ao meu interesse por direito ambiental, fui resgatado pelo chefe do contencioso, Dagoberto Pinheiro das Chagas, que me levou para o SEJUR/DIVIC/SEMAN, o setor de direito marítimo e ambiental, o que pavimentou minha carreira até a Transpetro, aonde atuei como Consultor em Direito Ambiental, de 2003 até meados de 2006, quando o diretor de Gás & Energia, Ildo Sauer, me levou para exercer a Gerência de Participações Societárias no segundo semestre de 2006. Buscávamos estar aptos a alcançar o almejado ponto de mutação, como diria Fritjof Capra, do combustível fóssil para a descarbonização, quando viesse, sem sermos extintos e continuando a prover a energia para o Brasil. A Petrobrás estava alguns anos à frente de suas congêneres na trilha da transição energética justa. Todo esse ingente esforço de vanguarda seria demolido na triste era Temer & Bolsonaro.

    Mas, tornando ao sertão do Alto do Rodrigues e à UTE Jesus Soares Pereira, justa homenagem ao chefe da equipe econômica de Getúlio Vargas, na qual pontificaram Ignácio Rangel e Rômulo Almeida, vejo agora florescer essa planta exuberante de hidrogênio verde em venturosa sinergia com a usina fotovoltaica que outrora, modestamente, ajudei a partejar e, por felicidade, os quinta colunas terminaram por esquecer, apesar do seu furor ensandecido na razia, remanescendo a flor do sertão pela resiliência da semente esquecida " n'algum canto de jardim " em meio a tantos espinhos.

    Primavera de 2024

    George Torres Barbosa.

    [13/11/2024 16:42:07]

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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