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    Moisés Mendes

    Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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    Precisamos salvar Fernando Haddad

    “O desfecho da eleição e as barbeiragens da campanha mostram que Boulos terá de esperar mais um pouco para assumir protagonismos”, escreve Moisés Mendes

    Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante reunião no Palácio do Planalto, em Brasília 17/09/2024 REUTERS/Ueslei Marcelino (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)

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    O que pode ser dito por alguém que, em meio aos escombros da tempestade, põe a cabeça de fora e tenta enxergar o que sobrou? Pode ser dito que, no projeto para o futuro de curto e médio prazo das esquerdas, Fernando Haddad volta a fazer parte da pauta do começo da reconstrução.

    Vamos começar por um nome? Vamos pelo menos tentar incluí-lo na conversa sobre inevitáveis pacotes com ideias de reabilitação do PT. Para que seja possível voltar a entender o Brasil que a esquerda passou a ouvir, se é que ouve, apenas em eleição. 

    A esquerda sabe bem, desde muito antes do domingo, que Brasil é este, que não é mais o do século 20. Haddad talvez seja um dos que mais sabem, por suas vivências em várias frentes e pela capacidade de entendimento da realidade.

    O ministro seria, na tentativa de reconstrução das esquerdas e da preparação da transição da liderança de Lula, o nome que se apresenta com naturalidade. Podem até contestar, como contestam, se é de fato de esquerda, mas essas classificações quase colegiais cada vez importam menos. 

    Haddad poderia ser essa figura, para oferecer perspectiva a quadros e bases dispersas e abaladas, se estivesse num ministério da área social. Parece óbvio demais. Só que hoje Haddad conversa com a Faria Lima e com investidores estrangeiros, para acalmar e animar mercados. E vai ter que avalizar e anunciar os cortes de 'despesas'.

    Lula chamou Haddad para perto para cuidar da área mais decisiva para o sucesso de um governo. Haddad será forte se contemplar, também, e talvez até antes de qualquer outra coisa, a confiança e as expectativas do mercado. Enquanto isso, Boulos seria testado.

    Mas há como Haddad conversar pela manhã com um banqueiro, no gabinete, e à tarde, por live, com a comunidade do Vidigal? Parece ruim para um projeto de resgate das esquerdas puro e imaculado, como muitos desejam, mas é o que temos. E ainda teremos os cortes.

    Porque o segundo turno deixou claro que Guilherme Boulos não é essa figura. Não para o daqui a pouco. Porque Haddad conversa com os homens da Moody's, mas nunca conversaria, em encontro a dois, com Pablo Marçal.

    Haddad não se submeteria à armadilha de ficar cara a cara com a figura que desdenhou e agrediu não só Boulos, mas atacou muito mais os gays, os pobres e as mulheres. Haddad não falaria com esse sujeito sem escrúpulos.

    Mas isso é relevante? Pode não ser para quem acha que as esquerdas, por seus líderes, não precisam voltar a ser referência para a base extraviada. Pode não ser para quem subestima a perda de poder das esquerdas de inspirarem os jovens que, segundo Bolsonaro, votam na esquerda.

    Tudo o que foi escrito antes nesse artigo é para dizer que, juntando as peças do que sobrou da eleição, não se remonta um Boulos competitivo para mais adiante.

    Teriam que descobrir fórmulas capazes de reduzir o alto índice de rejeição e dizer, num Brasil que correu para a direita, em parte disfarçada de centro, que Boulos será logo mais uma outra pessoa amadurecida pela derrota.

    As esquerdas estão diante do retrato assustador da direita, que é mais jovem do que parece e lançou nomes com força eleitoral como a esquerda conseguia décadas atrás e não consegue mais. 

    Boa parte da cara da direita, mesmo a velha, que venceu no primeiro e foi para o segundo turno, é terrivelmente jovem. A direita ressuscitou antigas bases, com a mesma índole de velha Arena, incorporada por PSD, PP e por parte do MDB, com gente com menos de 40 anos.

    Os evangélicos, o empreendedorismo, as emendas PIX, o desalento, a universidade sequelada pelo bolsonarismo, os sindicatos sem força, as milícias digitais ainda atuantes, os grileiros, o conservadorismo paroquial que voltou com tudo. Esse é o cenário que desafia as esquerdas, e que não é hegemonicamente bolsonarista.  

    Por que falar de um nome em meio a esse ambiente desconfortável? É simples assim, é só citar um nome, mesmo que Lula esteja ativo e pronto para a disputa da reeleição? Não, é bem complexo. 

    Mas é também a hora de buscar âncoras. Haddad continua no primeiro lugar da fila. Podemos começar pelo que é mais simples e que todos nós entendemos, e não só os cientistas formuladores de ideias, que dominam o debate público nas esquerdas há muito tempo. 

    Vamos começar de novo por um nome, mesmo que seja conhecido e já tenha sido testado e derrotado. Vamos voltar a falar de Haddad. Lula foi eleito na terceira tentativa. 

    Mas lembremos que antes temos os cortes, a Moody´s, a Faria Lima, o Congresso e a incógnita Gabriel Galípolo. É preciso salvar Haddad.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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