Presidência brasileira no BRICS é extremamente promissora
Não se trata de ter “medo” dos EUA, mas sim de insistir na linha diplomática correta de se apostar, pacificamente, nas mudanças que o planeta deseja e precisa
O Brasil presidirá o BRICS, neste ano de 2025.
A julgar pelo grande êxito pragmático que foi a elogiada presidência brasileira do G20, em 2024, a nossa presidência do BRICS é muito promissora.
No G20, Lula e nossa diplomacia conseguiram avanços inéditos. Aprovamos a vital Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e criamos o chamado G 20 social. Ademais, a presidência brasileira conseguiu fortalecer compromissos internacionais relacionados às mudanças climáticas e ao desenvolvimento sustentável. Também se fizeram importantes progressos no debate sobre a imprescindível reforma e fortalecimento da governança global. A menção, na declaração final, sobre a necessidade da taxação mundial dos super-ricos foi outro relevante êxito diplomático da gestão brasileira.
Esse êxito pode ser explicado, em parte, porque o Brasil tomou o cuidado de evitar a inserção, em sua gestão, de conflitos geopolíticos que dificultavam os consensos possíveis. Embora os EUA e a Argentina, por exemplo, tivessem tentado introduzir condenações a países específicos, como à Rússia, o Brasil conseguiu, com muita habilidade, repeli-las, aprovando uma declaração final politicamente muito equilibrada.
Pois bem, a mesma estratégia diplomática exitosa deve ser seguida, agora, na gestão brasileira do BRICS.
As prioridades já estão definidas. São elas:
- facilitação do comércio e investimentos entre os países do agrupamento, por meio do desenvolvimento de meios de pagamento (alternativas ao dólar);
- promoção da governança inclusiva e responsável da Inteligência Artificial para o desenvolvimento;
- aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas, em diálogo com a COP 30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025);
- estímulo aos projetos de cooperação entre países do Sul Global, com foco em saúde pública e
- fortalecimento institucional do BRICS.
Como se vê, em que pese algumas especificidades naturais, a agenda proposta conflui com a mesma agenda da gestão brasileira do G20, principalmente no que tange ao desenvolvimento sustentável e à cooperação no âmbito do Sul Global.
Trata-se de uma agenda que visa contribuir com uma ordem mundial mais pacífica, cooperativa e simétrica, que represente melhor os interesses da maior parte dos países do mundo.
Nesse sentido, não se deve supor que o Brasil fará uma gestão que acirre os conflitos geopolítico mundiais. Uma política de confronto com o “Ocidente”.
Uma política desse tipo seria contrária aos interesses do Brasil, aos do Brics e aos do Sul Global.
Alguns, tanto à direita quanto à esquerda, veem o mundo sob a ótica falaciosa de um jogo de soma zero.
Consideram que o Brasil deva ceder aos imperativos geopolíticos de uma nova e obtusa “Guerra Fria”.
Em outras palavras, nosso país teria de fazer a falsa escolha entre ter boas relações com os EUA e o Ocidente ou ter relações igualmente densas com China, Rússia etc., além de ser um membro do BRICS.
Ora, como já observei em artigos anteriores, o Brasil não pode se submeter a esse dilema geopolítico falacioso. O Brasil não tem de escolher um “lado’. O lado do Brasil é o Brasil, país que tem interesses próprios e soberanos, os quais não se subordinam ao de nenhum outro país.
O Brasil vê a ordem mundial como um jogo de soma positiva, no qual a ascensão e a prosperidade de novos atores não implicam, necessariamente, a ruína de protagonistas já consolidados. Se houver cooperação, respeito mútuo e reciprocidade, todos podem ganhar. A prosperidade de uns pode e deve estimular a prosperidade de outros. Apostar em assimetrias e confrontos é burrice.
De acordo com essa visão, o Brasil de Lula pratica uma política externa universalista e amplamente cooperativa.
No ano passado, por exemplo, aprofundamos nossos laços estratégicos com a China, com a assinatura de novos e amplos acordos, e, pouco tempo depois, celebramos, junto com nossos parceiros do Mercosul, um tratado de livre comércio com a União Europeia. Sei que há alguns que questionam esse último tratado, mas os fatos demonstram que o nosso país não exclui ninguém de seu escopo diplomático e negociador.
Ao praticar esse tipo de política, o Brasil contribui para o fortalecimento do multilateralismo e da criação de um mundo multipolar. Dessa forma, fortalece também a influência do BRICS no planeta.
Obviamente, o crescente protagonismo do BRICS e o grande número de pré-candidatos para integrá-lo são resultados de uma clara insuficiência de governança global, da inação e insuficiência representativa do Conselho de Segurança da ONU, da política muitas vezes agressiva dos EUA contra alguns países do Sul Global e da necessidade de se superar a extrema dependência que o mundo ainda tem, relativamente ao dólar, entre vários outros fatores.
Contudo, o BRICS não pode ser visto como um grupo de natureza “antiocidental”.
Conforme já argumentei em textos anteriores, nem a Rússia, nem a China buscam ou buscaram confrontos com os EUA.
No caso específico da Rússia, é preciso enfatizar que Putin, no início deste século, buscou ativamente um ambiente cooperativo com os EUA e a União Europeia. Chegou até mesmo em cogitar tornar a Rússia um membro da Otan.
Jeffrey Sachs, que foi conselheiro econômico da Rússia, dá o testemunho pessoal dos esforços reiterados e sinceros das autoridades russas em propor cooperação ampla com o chamado Ocidente. A mesma atitude não-confrontadora teve e tem a China, que se empenha em manter relações pacíficas com os EUA, desde a década de 1970. De igual maneira, o Irã atual, intenta, há mais de uma década, consolidar um acordo sobre seu programa nuclear com os EUA e a Europa, e dessa forma, levantar as sanções existentes e manter relações cooperativas com o Ocidente.
Sachs também dá o testemunho pessoal de como o establishment estadunidense ignorou as ofertas russas e se aproveitou do colapso da União Soviética para criar uma ordem mundial unilateralista, de hegemonia absoluta, que não admite concorrência efetiva de outros países.
Não obstante, o mundo mudou celeremente neste século e não cabe mais na antiga ordem unilateralista que está se desfazendo, tanto do ponto de vista geoeconômico como geopolítico.
Há, é claro, a reação dos EUA, que deverá se acirrar com o novo governo Trump, que ameaça o mundo com uma onda de protecionismo e confrontos. Alguns, como a questão do Canal do Panamá e a da imigração, envolvem diretamente nossa região.
Entretanto, ao Brasil, ao Sul Global e ao BRICs não convém intensificar essa reação e aceitar provocações.
Não se trata de ter “medo” dos EUA, mas sim de insistir na linha diplomática correta de se apostar, pacificamente, nas mudanças que o planeta deseja e precisa.
Afinal, quem vê “inimigos” em todos os lados torna-se inimigo de seus próprios interesses e acaba se enfraquecendo.
A pior paz é melhor que qualquer guerra. E investir na cooperação e no diálogo sempre provoca melhor resultado que investir em sanções e intervenções unilaterais.
O governo Lula, tanto no campo interno quanto no externo, está do lado certo da História.
O Brasil fará, temos certeza, uma excelente gestão à frente do BRICS.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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