Problemas estruturais demandam soluções estruturais
A criação de um Sistema Único de Mobilidade nos moldes do SUS é a radicalização necessária para garantir transporte público gratuito de qualidade
De forma geral, é possível afirmar que o transporte público brasileiro vive um momento de crise. Dados apontam que desde os anos de 1990, o número de passageiros cai progressivamente, resultando em um desiquilíbrio entre o custo do serviço e a tarifa cobrada. Calcado em um modelo pouco transparente, em que o custo é bancado majoritariamente pelo usuário, existem poucos incentivos para ações que garantam mais qualidade, previsibilidade e economia para quem usa.
A pandemia de Covid-19 deu contorno mais fortes ao problema. A necessidade de isolamento social fez despencar o número de usuários, obrigando o poder público a aumentar cada vez mais o repasse de recursos para subsidiar o funcionamento do serviço.
Esses são questões administrativas, mas ainda temos as questões operacionais, como aumento do combustível e demais insumos derivados de petróleo, entre outros.
Usuários
Do lado do usuário, o problema é ainda maior. Veículos cada vez mais lotados, que transitam por ruas congestionadas, ou seja, conforto e previsibilidade são utopia, principalmente em horário de pico. Tudo isso coroado com o desembolso de uma tarifa cara, incompatível com a baixa qualidade do serviço prestado.
Diversos acadêmicos e movimentos sociais voltados ao debate da reforma urbana e mobilidade entendem que a solução para estes problemas é a criação do Sistema Único de Mobilidade (SUM). Nos moldes do SUS (Sistema Único de Saúde) e SUAS (Sistema Único de Assistência Social), a ideia central é criar uma política pública de transporte e mobilidade em que União, estados atuem em conjunto com os municípios no compartilhamento de responsabilidades e cofinanciamento do Sistema.
Duplo Zero
Ressalto mais duas questões. Primeiro, a promoção de participação popular no planejamento e fiscalização da das políticas de mobilidade, dando voz à parte mais interessada no processo: usuários; segundo, a política Duplo Zero (Tarifa Zero; Emissão Zero), em que se direcione uma política nacional de gratuidade universal do transporte público, bem como a promoção de uma renovação tecnológica com a aquisição de uma frota de veículos elétricos.
A linha guia de atuação do SUM será dar prioridade ao transporte público coletivo em detrimento do transporte individual, com integração de modais e corredores exclusivos, amparado por políticas de mobilidade ativa e segurança no trânsito, em especial a de pedestres. Vale a pena ler o manifesto produzido pelo Idec a respeito do sistema.
Construção Social
Essa política pública será fruto de processo de construção social, que institua uma política nacional respeitando as necessidades e características regionais, mas que garanta a todas as pessoas acesso a serviços e espaços urbanos de forma democrática, em que ninguém é excluído pela falta de recurso para se locomover.
O Brasil é marcado por desigualdades, em especial nos espaços urbanos, que dividem geograficamente as classes sociais, concentrando empregos e serviços em regiões centrais, onde habitam as classes média e rica, enquanto a população de baixa renda fica na periferia, arcando com o ônus de se locomover para ter acesso a serviços públicos e privados. O Sistema Único de Mobilidade é uma solução estruturante para um problema estrutural, e a construção dele será uma das minhas principais bandeiras na Câmara Federal.
Com este texto, finalizo uma série de 3 artigos para o Brasil 247 em que me propus a debater a importância da Tarifa Zero e as implicações envolvidas para chegar até ela. O assunto ainda não está esgotado e outras questões surgirão. Utilizarei esse espaço para tornar compartilhar com o público aquilo que defendo como soluções para nossos problemas.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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