Procuradores da Lava Jato, respondam à Nação
"Procuradores, afinal urge esta explicação. Que prática criminosa dos senhores, a exigir doações de empresários, dentre eles, Patrícia Fehrmann, na própria sede do MP, em Curitiba, destinada a uma tal Fundação Mude. Com esta peroração, despeço-me", diz o jurista Agassiz Almeida
Foi constituinte em 88 e um dos principais artífices do fortalecimento do Ministério Público na Constituição. Recebeu a máxima comenda da Associação Nacional do Ministério Público pelos relevantes serviços prestados ao MP. É escritor brasileiro e ativista dos direitos humanos
Norteado pelos objetivos de salvaguardar a nossa Instituição, assentada em sólidos postulados constitucionais pelos quais lutei ao lado de uma plêiade de companheiros na Assembleia Nacional Constituinte (1986-1988), encaminhei aos senhores, no dia 14 de julho do corrente ano, mensagem sob o título “Carta Aberta aos Procuradores da Lava Jato”. Não recebi nenhuma resposta, apenas ouvi um rosnar de ameaças, cujos ecos pareciam vir de algum covil de malfeitores. No curso da vida, desde a minha juventude, caminhei à beira de abismos, e, logo cedo, a ditadura militar lançou contra mim a baba do ódio, arrastando-me ao cárcere. Os sóis dos cariris do Nordeste me temperaram para os embates do mundo, e aprendi a não temer a turba raivosa dos lunáticos.
Em todos os tempos, os algozes e lacaios se assemelham. Nos porões do Doi-Codi, ouviam-se gritos dos torturados. Hoje, lá no calabouço da Lava Jato, sabe-se apenas do soluço abafado dos prisioneiros, muitos deles devastados pelo terror, como Palocci, fronteiriço a um psicopata. Cai sobre eles a mordaça do autoritarismo togado. Que depoimento se extrai de farrapos humanos?
No regime fardado, nas caladas da noite, a violência se desencadeava com prisões, torturas e desaparecimento de presos. Na ditadura paranoica da Lava Jato, assiste-se a espetáculos midiáticos debaixo de holofotes televisivos, durante os quais acusados são arrastados de suas residências e locais de trabalho. A execração moral os condena sem julgamento. A prisão de Michel Temer retrata esse drama tragigrotesco.
Procuradores! Os senhores olharam sempre para a glorificação dos seus egos, pouco importando as consequências econômicas que esta doutrina satânica causou ao país, prejuízos em torno de 300 bilhões de reais, afora milhões de desempregados. Na escalada da insensatez, as provas processuais se fizeram instrumentos de suas ambições, a pisotear no devido processo legal. Que audácia! Tiveram por anos a nação ajoelhada às suas vontades, e as instituições, encurraladas. Bradavam: "Quem não apoiar a Lava Jato, defende a corrupção". O senador Delcídio do Amaral pagou caro por sua rebeldia. Na cruzada judicante, lançavam-se no mesmo caldeirão delitos eleitorais e crimes de corrupção. Como epílogo do devastador tsunami, praticaram, à sombra da justiça, o crime de distorção das eleições presidenciais de outubro de 2018. Que farsa! Estão sendo desmascarados.
Atualmente, que vultos movem os cordéis do poder no país? Carregados de apetites primários e despossuídos de uma mínima visão de mundo, eles são capazes de todos os caprichos, mesmo os mais insensatos. Calígula, imperador romano, fez do seu cavalo Incitatus senador; no Brasil, Bolsonaro, o falastrão, quer fazer embaixador nos EUA, um seu pimpolho, até há poucos anos, surfista em Copacabana. Entre o grotesco e a truculência, o bufão do Planalto encarna estas anomalias: Nero, Idi Amin Dada, Kadafi e Papa Doc. Eles se desandam na bestialidade e na ferocidade, e o do Brasil solta esta excrecência: “Brilhante Ustra, herói nacional". Seu apego ao deboche o faz acolher qualquer infâmia. Charlie Chaplin, na sua obra “O Grande Ditador”, disseca esses tipos.
Impactados pelo desatinado e raivoso dom Quixote que nos governa, a nação queda-se, sem rumo, numa sombria conjuntura, e vive num cenário surrealista, em que o país se isola do contexto mundial, perdido entre o grotesco e o furor inconsequente, no meio do qual um troglodita congelou a sua mente entre a Idade Média e a Guerra Fria. E nesta arena de saltimbancos, ouve-se um eco imbecil, lá de Brasília: “a mulher de Macron é mais velha do que a minha” (refere-se ao presidente da França). E, nos solavancos da marcha esquizofrênica, ele se proclama vencedor das hordas vermelhas, e, para tanto, investe-se de demolidor de códigos e tratados internacionais. Numa viagem ao Japão, ao sobrevoar a China, um pesadelo o sacode e ele grita: Sou o presidente dos Estados Unidos do Brasil e vou vencer a China. Por estas travessuras, um fanatismo imbecilizado envolve o país aguçado por uma classe média, perdida na sua capacidade de olhar o mundo e de analisar os fatos. Idiotizou-se.
Lembro esta lenda chinesa: um homem e um boi são tangidos para o matadouro. Ao final, ouve-se um berro; do homem, a mudez.
Procuradores, reconheçam os seus atos ilegais. Descortina-se o obscurantismo sobre o futuro da nação e a estagnação do seu desenvolvimento quando a idiotia se apossa do poder e ri da inteligência, a estupidez renega o legado das gerações passadas, o deboche rompe todos os limites da racionalidade, atingindo líderes mundiais e até a zombar do rosto e da idade das mulheres, a agressividade violenta os mais profundos sentimentos do ser humano revolvendo satanicamente a memória de entes queridos, a disparar este absurdo: “O pai dele foi morto por seus próprios camaradas” (refere-se a Felipe Santa Cruz, presidente da OAB nacional).
Esfarrapa-se a justiça num balcão de vis interesses, a investigação serena cede espaço à trama criminosa dos senhores na Lava Jato, confluídos nestes fatos e vultos que se agregaram em torno de um projeto político-econômico, a alçar à presidência um dom Quixote sombrio, que empurra o país para um descaminho, cujo porvir se faz imprevisível.
Saibam os senhores, se não houver uma junção de forças para deter a incapacidade delirante direcionada por uma estratégia de deboche e ferocidade que desconhece fronteiras, então o país caminhará para o imponderável e aí ouviremos, já tardiamente, o desastrado do Planalto a rugir: “Depois de mim, o dilúvio”. Este egocentrismo vem de Luiz XV, rei da França no auge do Estado Absoluto.
Clamo como um indignado que o fardo dos anos não abateu: Onde se encontra a mobilização de entidades que historicamente se levantavam em defesa dos direitos humanos, da ordem democrática, do direito e da vida dos direitos? Embutidas no comodismo. Calam-se, quando deviam falar: Barbosa Lima Sobrinho, Sobral Pinto e Dom Helder Câmara soluçam nas suas tumbas.
Neste momento que atravessa o país, por que a ira de entidades corporativistas contra a Lei do Abuso de Autoridade, a decisão do STF na salvaguarda do devido processo legal (direito de defesa do acusado), contra o direito constitucional da presunção da inocência até o trânsito em julgado de sentença penal? De onde vêm esses ecos, pergunta um viandante? Dos truculentos da Lava Jato, que, à sombra do poder, afrontaram as leis e distorceram a sucessão presidencial de 2018, destruíram empresas nacionais e as substituíram por norte-americanas.
Saibam os senhores, quando o medíocre se investe no poder – vê-se na história –, ele se desanda em temerárias ações, propiciando a formação de fanáticos seguidores, que se fazem arautos dos novos tempos. Na política e na religião, estes tipos se agigantam e se proliferam. Por um trabalho do jornalismo investigativo do site The Intercept Brasil, destampou-se um monturo de iniquidades e ilegalidades. Em face deste cinismo que infesta o Brasil, relembro esta exortação de Cícero, no Senado romano, há mais de dois mil anos: Quousque tandem abutere, Bolsonaro, patientia mostra? Procuradores! Foi para esse desastre nacional que os senhores e o justiceiro Moro arrastaram o país?
Ao olharmos os personagens que a obra de Shakespeare fez desfilar, difícil é encontrar onde os cavaleiros andantes de Curitiba se encarnam, talvez em Yago, Macbeth ou Brutus. Neste desencontrado país, estes tipos estão por aí a governar o povo brasileiro.
Os senhores irão responder perante o tribunal da História por estes crimes: o de lesa-pátria, pela destruição de empresas nacionais; e o de lesa-soberania popular, perpetrado com ilegalidade e maquiavelismo no objetivo criminoso de fraudar o pleito da sucessão presidencial de 2018.
E, nesta saraivada de crimes, inclusive o de induzir o STF a erro, os senhores encarnam dupla personalidade. Sob os holofotes televisivos, aparecem como vestais do moralismo público; nos sótãos e bastidores do poder judicante, moviam-se como vilões e se davam as mãos em criminoso conluio, acusadores e julgador. Que monstrengos processuais excretaram! Traumatiza a nação conviver com estas excrecências.
Procuradores, a que respondem os senhores? A essa avalanche de iniquidades que ensombreia o processo condenatório do ex-presidente Lula, do qual, cumpliciados com o justiceiro Moro, foram os carrascos de uma câmara de gás que asfixiou o povo brasileiro. Nele se escancaram as vísceras de uma trama criminosa e de uma justiça corporativista. Tenham a grandeza da humildade e reconheçam as suas culpas e crimes. No afã de alcançar seus vis objetivos, e flagrados na urdidura criminosa, como agentes da prestação jurisdicional, cinicamente berram: “Não reconhecemos estas provas ilegais”. Que desfaçatez! E poderiam ser legais, se os farsantes são os próprios guardiões das leis e da legalidade?
Vozes poderosas de Émile Zola e Ruy Barbosa se levantaram em defesa de Dreyfus nos séculos XIX e XX. E neste Brasil de apequenados por um oportunismo dominante, que vozes se erguem contra as indignidades judicantes desabadas contra o nordestino de Caetés?
Em meio às chamas que incendiavam Roma, Nero tocava lira; em Brasília, enquanto a floresta amazônica ardia em chamas, Bolsonaro debochava das ONGs e dos líderes mundiais.
A Lava Jato sangra a justiça coonestada pelos tribunais
Procuradores, basta! Investidos nas funções de fiscais da ordem jurídica, os senhores se desandaram na ilegalidade, dominados pela excitação a que a voragem dos aplausos públicos os alçou. No curso dos anos, lá por 2017, começaram a se antever circunstâncias e acontecimentos incompatíveis com a responsabilidade das funções investigativas. Num certo dia, há poucos meses, eclode como um furacão, atingindo em cheio as consciências livres da nação, um jato de dejetos, tendo como epicentro os porões e bastidores da Lava Jato, em Curitiba, no qual se misturavam, numa organização de pilantragem, atos judiciais ilegais em que se mancomunavam acusadores fiscais da ordem jurídica e julgador. Veículos de comunicação no país e no mundo estamparam a face cruel e cretina de uma operação que devastou o país, com nefastos crimes de lesa-soberania popular e de lesa-pátria, tripudiando na ordem democrática, instrumentalizada num balcão de vis interesses.
Procuradores! Os senhores, face ao torvelinho de atos de iniquidades que os envolve, lançam mão deste instrumento: o cinismo. Há poucos dias, o STF, rompendo o encurralamento de suas conveniências, já tardiamente, anulou sentença de condenação do ex-juiz Moro, sob fundamento de afronta ao direito de defesa do réu, tolhendo-o de se manifestar após depoimento do delator. Vozes do autoritarismo judicante se levantaram, criticando a decisão da Suprema Corte.
Um primitivo, lá dos sótãos da Lava Jato, berrou: “é sem fundamento a decisão do STF, não existe na legislação penal lei que a ampare”. Panaca, vá ler o clássico “A Lógica das Provas,” de Malatesta. Os direitos à liberdade, à vida, ao sol, ao ar integram o direito natural. Eles não estão inseridos nos códigos e tratados, pertencem ao patrimônio imaterial da humanidade. O direito romano, na obra “Institutas”, do jurisconsulto Gaio, já traçava as linhas cardeais do direito natural. A Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, manifestou-se: “a decisão do STF está equivocada, pois o processo padece de preclusão”. Ora, ilustre procuradora, os institutos da decadência, prescrição e preclusão não alcançam, no âmbito do Direito Penal, os direitos naturais como liberdade, vida etc., são bens imateriais e imprescritíveis.
Procuradores, afinal urge esta explicação. Que prática criminosa dos senhores, a exigir doações de empresários, dentre eles, Patrícia Fehrmann, na própria sede do MP, em Curitiba, destinada a uma tal Fundação Mude. Com esta peroração, despeço-me.
Eu vim das caatingas do Nordeste, quebrando marmeleiro, bom-nome e jurema-preta, e digo: o país precisa reencontrar o seu desenvolvimento, perdido desde 2010.
PS.: Deixo estas palavras: A História marca a condenação de Alfred Dreyfus como um erro judiciário; a do ex-presidente Lula passará à posteridade como a canalhice do século.
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