PT enfrenta dilema entre pragmatismo e ideologia após eleições municipais
Diante do resultado nas urnas, legenda do presidente Lula se divide entre conciliação para ampliar alianças e retorno às raízes à esquerda, escreve Aquiles Lins
O Partido dos Trabalhadores (PT) enfrenta um dilema central que determinará sua trajetória política após o desempenho abaixo das expectativas nas eleições municipais de 2024. Diante desse cenário, surgem duas correntes internas que propõem caminhos divergentes: uma defende um movimento mais pragmático, aproximando o partido do centro político, enquanto a outra sugere um retorno às suas raízes ideológicas, com ênfase na defesa de pautas à esquerda. A decisão a ser tomada não é trivial e precisa considerar a realidade política atual do Brasil, marcada por uma polarização ideológica, mas também por uma demanda crescente por resultados concretos que impactem a vida dos brasileiros.
A primeira corrente argumenta que, para reconquistar o apoio de um eleitorado mais amplo, o PT deve adotar uma postura menos ideológica e mais pragmática. Isso significaria, em termos práticos, buscar uma aproximação com setores do centro político, além de priorizar temas que dialoguem diretamente com as preocupações cotidianas dos brasileiros, como o controle da inflação, geração de emprego, e a melhoria dos serviços públicos. Esse grupo acredita que a esquerda, quando se torna demasiadamente rígida em suas posições, pode perder a capacidade de construir alianças amplas e de viabilizar uma agenda reformista no contexto atual. A estratégia de flexibilização seria uma forma de expandir o alcance do partido e de conquistar eleitores que têm receios em relação a uma agenda mais à esquerda. Quadros importantes do PT já expressaram defesa de um PT mais pragmático. Entre eles estão a prefeita reeleita de Contagem (MG), Marilia Campos, o deputado e candidato a prefeito de Cuiabá (MT), Lúdio Cabral, o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha, e o prefeito de Araraquara (SP) e cotado como próximo presidente nacional do PT, Edinho Silva.
Por outro lado, há quem defenda que o PT deve retomar a disputa de ideias à esquerda e resgatar seu papel como partido de oposição ao neoliberalismo e ao conservadorismo. Para esses membros, o desempenho aquém nas urnas é um sinal de que o partido perdeu parte de sua identidade histórica e de sua conexão com as bases populares que tradicionalmente o apoiaram. A proposta aqui é que o PT se reafirme como um defensor vigoroso de reformas estruturais, como a tributária progressiva, a ampliação dos direitos trabalhistas e a defesa de políticas públicas voltadas para a redução da desigualdade social. Este grupo acredita que, ao suavizar suas posições para se aproximar do centro, o partido corre o risco de alienar sua base histórica e perder relevância como representante legítimo das pautas sociais no Brasil. Entre os nomes que defendem esta tese está o do ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino. O dirigente do PT Valter Pomar escreveu neste 247 um artigo que sinaliza esta linha de raciocínio.
Para definir qual caminho seguir, é fundamental considerar o atual contexto político do Brasil. Após anos de polarização, muitos eleitores buscam alternativas que ofereçam soluções concretas e imediatas para os problemas socioeconômicos, como inflação, desemprego e precarização dos serviços públicos. Neste sentido, uma postura mais pragmática e centrada pode ser benéfica, pois permitiria ao PT estabelecer uma ponte com setores que historicamente não se identificavam com o partido, mas que hoje estão em busca de estabilidade e melhorias nas condições de vida. No entanto, ao mesmo tempo, há uma parte expressiva do eleitorado que vê nas pautas à esquerda uma forma de resistência aos retrocessos sociais e à manutenção de direitos. Ignorar essas demandas pode resultar na fragmentação da própria base do PT, que, sentindo-se desamparada, poderia migrar para outras legendas ideologicamente mais comprometidas com as bandeiras progressistas.
A decisão sobre qual caminho o PT deve seguir não é simples. Equilibrar pragmatismo e identidade, adaptando-se às exigências de um eleitorado em transformação, caminhando para uma visão de mundo mais conservadora, sem abrir mão de seus princípios fundadores é um desafio digno do tamanho do PT. Uma alternativa seria adotar uma postura pragmática na construção de alianças e na articulação política, mas sem abdicar de uma agenda clara de transformação social que mantenha viva a essência do partido, de defesa dos direitos dos trabalhadores, da soberania nacional, do combate à desigualdade. O PT poderia se posicionar como uma força capaz de propor mudanças que dialoguem com as demandas imediatas da sociedade, mas que, ao mesmo tempo, sinalizem um compromisso com um projeto de longo prazo voltado para a construção de um Brasil mais justo e igualitário.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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