TV 247 logo
    Rudá Ricci avatar

    Rudá Ricci

    Rudá Ricci é sociólogo

    18 artigos

    HOME > blog

    Reencontro do Estado com as ruas

    Nada mais equivocado. O que está no decreto é respaldado numa experiência de mais de duas décadas em todo o território nacional, por meio dos 30 mil conselhos de gestão pública existentes

    O desencontro do campo institucional de representação política com o cotidiano dos brasileiros ficou estampado nos últimos meses. As manifestações de junho do ano passado expuseram ressentimentos e novas demandas. A reação dos políticos profissionais foi conservadora.

    Durante a Constituinte de 1987, o reencontro do país teve sua chance. O municipalismo se aliou com o que alguns juristas denominaram de participacionismo. O primeiro artigo da Constituição de 1988 é explícito quando afirma que o poder popular é plasmado através dos representantes eleitos e diretamente. Diretamente. O artigo 14 indica o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular como instrumentos de exercício da soberania popular. O artigo 204 inaugura o campo da cidadania ativa.

    Serviu de inspiração para a produção de inúmeras leis federais, como a de nº 8.742 (de 1993), que institui a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas assistenciais; ou a de nº 8.080 (de 1990), que impõe que o SUS observe a participação dos cidadãos na formulação da política e na execução de ações de saneamento básico.

    O Brasil incorporou, há décadas, a participação do cidadão na gestão das políticas públicas como metodologia institucional, muito mais complexa que meros mecanismos de democracia direta, ampliando a representação social. A prática se tornou objeto de interesse mundial. Pesquisadores de Bangalore (Índia) recorreram ao Brasil para estudar tais inovações. Os Estados Unidos discutem a introdução do orçamento participativo em sua prática cidadã. Diversas experiências internacionais seguem a mesma lógica, como os comitês de bacia hidrográfica da França ou o Grande Conselho de Londres.

    Esse é o espírito que preside o decreto nº 8.243, que cria a Política Nacional de Participação Social. Trata-se de reencontro do Estado com as ruas. O clima artificialmente contaminado pela eleição --já que grande parte da população a percebe como disputa entre elites-- procurou solapar uma das raras tentativas de revitalização do aprendizado da nossa Constituição Federal. Opiniões apressadas foram disseminadas como se estivéssemos à beira da reedição dos sovietes.

    Nada mais equivocado. O que está no decreto é respaldado numa experiência de mais de duas décadas em todo o território nacional, por meio dos 30 mil conselhos de gestão pública existentes (saúde, assistência social, educação e outros), grande parte deles deliberativa cujas resoluções nacionais já são acompanhadas pela Secretaria-Geral da República. O que faz de algumas opiniões disseminadas uma irresponsabilidade política e jurídica.

    Os protestos de rua precisam de resolução institucional urgente. Conservar o que parece estar à beira da deslegitimação é apostar na crise. Ouvir o desejo dos brasileiros deveria ser princípio de todos profissionais desta terra. Nesse assunto, desinformar o cidadão, criando artificialmente o pânico, é fazer joguete com nossa democracia.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

    ❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com redacao@brasil247.com.br.

    ✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.

    iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

    Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: