Se o crime é organizado, é preciso organizar o combate a ele
Política do confronto é ineficaz e mata inocentes, acusa o deputado Reimont
No mesmo dia 24 de dezembro, véspera de Natal, dois eventos se interpuseram e abriram um debate que seria produtivo, se todos tivessem voz. Mas não é bem assim que acontece; nossa mídia é seletiva.
Pela manhã, o governo Lula publicou um decreto que estabelece protocolos para as forças policiais e visa a estancar a brutal escalada da violência nas abordagens feitas por agentes que deveriam ser de segurança. Imediatamente, governadores e parlamentares da oposição ganharam grande espaço, acusando o nosso governo de favorecer a bandidagem. Politizaram um tema grave e tenho pra mim que nem leram o decreto.
À noite, a violência policial explodiu em mais uma triste manchete. Mais de 30 tiros disparados por agentes da Polícia Rodoviária Federal atingiram o carro da família Rangel, acertando a jovem Juliana, de 26 anos. Eles trafegavam tranquilamente pela Rodovia Washington Luis (BR-040), na altura de Duque de Caxias, a caminho de Niterói, onde passariam o Natal. A confraternização foi interrompida pela bala que entrou na cabeça de Juliana, hoje em estado gravíssimo no Hospital Adão Pereira Nunes. Não houve abordagem prévia, não houve diálogo, não houve explicação; apenas a artilharia disparada contra a família.
"Na hora, eu pensei que era bandido com carro da polícia atirando em mim, porque pensei que um policial não iria fazer isso", disse o pai, Alexandre, ainda em choque.
A violência policial é uma tragédia, que contamina, ameaça e corroi a sociedade, inclusive os agentes e instituições de seguranças. Os envolve em uma rede de mentiras, acobertamentos e crimes, como a que levou um PM de São Paulo que atirou a queima-roupa em um jovem de 24 anos, enquanto ele filmava uma ação policial. Inicialmente, a Secretaria da Segurança Pública do estado afirmou que o rapaz "tentou tirar a arma de um policial". Depois, as câmaras de segurança mostraram que a instituição mentiu.
A mesma violência matou a jovem Thainara Vitória Francisco Santos, de 18 anos, grávida de quatro messes, em Governador Valadares, Minas Gerais, assassinada ao tentar proteger o irmão autista durante uma abordagem brutal da PM.
Todos estamos sob risco diante da violência policial, que pode vitimar qualquer cidadã ou cidadão. Mata inocentes e é absolutamente ineficiente na redução da criminalidade.
O Brasil registrou 6.393 mortes por intervenções policiais em 2023, o que significa 3,1 mortes por 100 mil habitantes. Em dez anos (2013 a 2023), a letalidade policial no país aumentou 188,9%. Mas o crime não recuou um único milímetro. Ao contrário.
No Rio, outro estado de alta letalidade policial, dobrou a extensão dos territórios da Região Metropolitana sob controle de grupos armados, com um crescimento de 105,73% desde 2008 - as milícias cresceram 204,6%; o Comando Vermelho, 89,2%, e o Terceiro Comando Puro, 79,1%.
Nesse período, passaram pelo governo do estado os senhores Wilson Witzel e Claudio Castro (atual), adeptos fervorosos das políticas de confronto. Houve uma intervenção militar sob o comando do general Braga Netto (ele mesmo). Gastou-se milhões dos cofres públicos, milhares de inocentes morreram ou foram feridos, mas os barões do tráfico e os senhores das armas continuam circulando livremente, protegidos pela ineficiência ou deficiência nas investigações de um negócio que movimenta centenas de bilhões de dólares.
É preciso interromper essa lógica estúpida, ineficaz e mortal. Se o crime é organizado, é preciso, com urgência, organizar o combate a ele.
O novo decreto do Ministério da Justiça é uma resposta bem-vinda a essa questão, combatendo o uso indiscriminado de armas de fogo a partir de protocolos que reforçam a inteligência, o planejamento, integração e coordenação de ações e o treinamento dos agentes de segurança, como defendem especialistas e inúmeros policiais comprometidos com a vida.
O decreto não se limita ao uso da força e nem proíbe medidas extremas, isso é mentira. O que o texto estabelece é o conceito do uso progressivo da força, de acordo com as situações apresentadas, e que as armas letais devem ser usadas como último recurso. Se esse conceito estivesse em vigor, Juliana teria comemorado o Natal em casa, Thainara veria a filha ou filho crescer e o músico Evaldo Santos e o catador Luciano Macedo não seriam chorados por suas família, entre tantas e tantas outras vítimas.
A polícia está perdendo a confiança dos brasileiros. Na última pesquisa da Datafolha, 51% brasileiros afirmaram ter mais medo do que confiança na polícia. A segurança deve ser pública, servir ao conjunto da população. Só assim haverá eficiência e confiança.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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