Sobre as imunidades e garantias dos deputados estaduais
A defesa do Estado Democrático de Direito, muitas vezes, requer sejam arrostados clamores por descumprimento da ordem jurídica, em nome seja lá do que for. Nada justifica rasgar a Constituição
SOBRE AS IMUNIDADES E GARANTIAS DOS DEPUTADOS ESTADUAIS
O art. 53, da Constituição da República, e seus parágrafos, dispõem acerca dos Deputados e Senadores o seguinte:
"Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
§ 1º omissis
§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.
§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação."
Dos dispositivos constitucionais acima transcritos decorre que os parlamentares são detentores de imunidade material, ou seja, são invioláveis nas esferas cível e penal em razão de suas opiniões, palavras e votos perpetrados no exercício do mandato ou em função deste. São detentores, ainda, de imunidade formal ou processual, ou seja, não poderão ser ou permanecer presos a partir da expedição do diploma, além de a Casa Legislativa a que pertencem ter a prerrogativa de sustar o andamento de processo criminal a que algum de seus membros responda.
Por sua vez, estatui o § 1 º, do art. 27, da Carta de 88, em textual:
"Art. 27. omissis
§ 1º Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas."
Vê-se, pois, ser insuscetível de contraditório que os deputados estaduais gozam das mesmas imunidades e garantias dos membros do Congresso Nacional – Deputados Federais e Senadores.
O texto constitucional não autoriza, portanto, o tratamento discrepante, no que diz respeito à sistemática das imunidades e garantias dos congressistas e dos deputados estaduais. Estes gozam, em decorrência da dicção constitucional, de idênticas prerrogativas em face dos membros do Congresso Nacional.
Entendimento diverso é abertamente inconstitucional.
Dessa forma, sustento que a prisão dos deputados estaduais por determinação da Justiça Federal é abertamente inconstitucional, eis que não se deu em flagrante de crime inafiançável. A prisão preventiva, nesse caso, se choca com prerrogativa decorrente da imunidade formal de que gozam os parlamentares – federais e estaduais.
Como se trata de medida cautelar determinada pelo Poder Judiciário, que interfere diretamente no exercício do mandato parlamentar, caberá à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro dar a última palavra, que não poderá ser outra que não determinar a soltura dos deputados presos preventivamente.
As prerrogativas constitucionais de que gozam os parlamentares constituem conquista da Democracia brasileira. Os integrantes do Parlamento, no exercício de seu múnus funcional, não podem estar sujeitos a interferências indevidas dos outros dois poderes, sob pena de violar-se cláusula pétrea constitucional consubstanciada no princípio da separação dos poderes.
Nenhum temor ditado por impopularidade e/ou decorrente de clamores da chamada opinião pública deve intimidar a Casa Legislativa na defesa de prerrogativas que não pertencem a esse ou aquele parlamentar isoladamente, mas sim ao próprio Parlamento.
Se os deputados estaduais hoje indevidamente presos praticaram crimes, que estes sejam apurados no devido processo legal e não, como sói acontecer, por inconstitucional interferência de um dos poderes, ao decretar prisão fora da hipótese expressamente prevista na Lei Constitucional.
A defesa do Estado Democrático de Direito, muitas vezes, requer sejam arrostados clamores por descumprimento da ordem jurídica, em nome seja lá do que for. Nada justifica rasgar a Constituição.
Vale lembrar que esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Rio de Janeiro, 21 de outubro de 2019
Wadih Damous
Advogado, ex-Presidente da OAB/RJ
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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