Tábata e sua ignorância e desprezo pela esquerda
Ela demonstra, orgulhosamente, apatia e ignorância sobre os avanços dos estudos feministas, cujo movimento ela inferioriza acusando-o de seguir uma cartilha de séculos atrás
A apatia, aversão e ignorância que a deputada Tabata Amaral ostentou sobre lutas de classes e os avanços dos estudos sobre a sociedade dividida em classes e raças no programa Roda Viva, nesta segunda-feira (14), chamaram a atenção nas redes sociais. Ela demonstra, orgulhosamente, apatia e ignorância sobre os avanços dos estudos feministas, cujo movimento ela inferioriza acusando-o de seguir uma cartilha de séculos atrás.
A deputada afirmou que não pretende seguir "cartilhas criadas há 200 anos". E que "parece que para ser de esquerda ou feminista, precisa seguir uma cartilha ditada por outras pessoas ou criadas há muito tempo atrás”. Porém, até onde sabemos, o feminismo e o marxismo não têm 200 anos de trajetória. Mas se tivessem, não seriam inferiores por essa razão, mesmo porque, muitos conhecimentos produzidos séculos atrás continuam sendo importantes, inclusive para os campos da Ciência Política.
Quantos livros e teses de estudos feministas, marxistas e neomarxistas dos séculos XX e XXI a deputada já leu para depreciar os movimentos de esquerda? Com base em que conhecimento, ou propriedade no assunto, ela afirma que esses movimentos e estudos são uma cartilha de 200 anos atrás? Até onde se sabe, o movimento de mulheres surge com esse adjetivo na segunda metade do século XIX. Mas no século XX se consolida com o nome de feminismo, e não parou em Simone de Beauvoir, cuja referência mais citada teve as primeiras publicações entre as décadas de 1960 e 1970.
Marx também não envelheceu, pois serve como fundamento para importantes análises atuais. Ana Fani Carlos, Milton Santos, David Harvey, Henri Lefebvre e outros intelectuais trazem seu olhar crítico e marxista sobre o mundo, o espaço geográfico e a política sobre ele. Não seguiram cartilha, produziram ciência e reflexões sérias sobre o espaço geográfico a partir do século XX considerando o papel importantíssimo de Karl Marx para analisar os modos de produção e suas implicações sobre a sociedade, que continua estratificada e sob o modo capitalista de produção.
Um movimento social e uma área científica são produções sociais, portanto, coletivas, com a participação de outras pessoas. Ninguém parte do zero ao fazer política e ciência, pois há práticas e conhecimentos acumulados pelas sociedades, que não devem ser desconsiderados, como se as gerações atuais estivessem descobrindo algo sem conhecimento produzido anteriormente. Os discursos, por serem produzidos em processos histórico-sociais, conforme Brandão (2004), foram produzidos por outras pessoas, inclusive os que Tabata reproduz pensando ser a autora, mas é sujeita a ideologias no discurso, como todo sujeito que reproduz enunciados produzidos historicamente. Enunciados que já foram ditos, estão sendo ditos e continuarão a ser ditos (FOUCAULT, 1999).
A ignorância sobre um tema ou sobre alguma área das ciências não é algo condenável. Mas é digno de repúdio o ato de inferiorizar pesquisas científicas e movimentos que são vozes de grupos de subalternos contra a dominação, num mundo em que as classes dominantes e o masculino branco e rico ditam a ideologia e as regras. Regras e ideologia às quais a deputada Tabata segue, atirando clichês como "empreendedorismo" em qualquer contexto, como se estivesse pregando um evangelho do empresariado. Esse "evangelho" que ela prega foi produzido por outras pessoas.
Eu espero que ela seja mais cuidadosa com lutas e pesquisas científicas no mínimo nas áreas da Astronomia e da Física, e não despreze Albert Einstein e sua teoria sobre ondas gravitacionais, da primeira metade do século XX, nem Galileu Galilei, que viveu entre os séculos XVI e XVII, e fundamentado em Copérnico (1473-1543) defendeu a teoria heliocêntrica. Para escapar da condenação à fogueira conservadora e reacionária da Inquisição, Galileu precisou renegar essa teoria.
Os conservadores estão sempre aí, na história, contra movimentos dos subalternos e contra as ciências, tanto quanto a Terra continua girando em torno do Sol. Foi assim na Inquisição, entre os séculos XII e XVIII, no fascismo que deu poder a Franco e causou a Guerra Civil Espanhola na década de 30, na Ditadura Militar no Brasil entre 1964 e 1985, bem como em vários países e momentos históricos diferentes. A sociedade continua dividida em classes e os conservadores têm seus representantes políticos para mantê-la assim, reproduzindo os discursos hegemônicos.
Novamente, as ciências e os movimentos dos subalternos por direitos estão sob um forte ataque do fascismo ou "neofascismo" no Brasil nos últimos anos. Essa ascensão fascista atende as exigências do capitalismo de acumulação flexível, precarizando o trabalho e retirando direitos sociais ou dificultando o acesso dos mais pobres a esses direitos. Exemplo disso, a reforma da previdência de Bolsonaro que foi aprovada pela deputada e por toda a direita.
Vale ressaltar que alguns dos aspectos dessa onda fascista são o olavismo, o desprezo pelo conhecimento científico, o culto à ignorância, o ataque às ciências humanas e aos movimentos sociais, contra as universidades onde, entre outras correntes, marxistas, feministas, inclusive feministas negras, os negros e indígenas, produzem ciência e fazem pesquisas sobre classe, raça e gênero. Algumas dessas pesquisas e movimentos são feitos considerando fundamentais as análises de Marx e Engels sobre o modo de produção capitalista. Estudos e movimentos aos quais a deputada Tabata Amaral menospreza em suas falas datando-os de forma pejorativa e equivocada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRANDÃO, Helena Hathsue Naganime. Introdução à análise do discurso. Campinas:
Editora da UNICAMP, 2004.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1999.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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