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    Pedro Maciel

    Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

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    Tempos de ignorância valorizada

    Precisamos falar sobre isso e nunca desistir do Brasil, da democracia e da Política enquanto instrumento de transformação. #BoraElegerDemocratas

    Pablo Marçal no debate da Band (Foto: Reprodução Band)

    “(...)

    Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

    Toda a gente que eu conheço e que fala comigoNunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...Quem me dera ouvir de alguém a voz humana(...)Arre, estou farto de semideuses!Onde é que há gente no mundo?

    Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

    (...)

    Fragmento do “Poema em linha reta” de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

    Caminho solitário, mesmo quando estou cercado de muita gente, pois, assim como Fernando Pessoa, sinto que não tenho lugar nesse mundo de Deus.

    No sábado passado fui cortar o cabelo; minha barbeira é a Shimenne Viana, mãe do Pietro e do Enzo e esposa do “Amor” (é assim que ela se refere ao marido); a barbearia dela é na Rua Vieira Bueno, ao lado da livraria Candeeiro, é pertinho da Cultura Inglesa, onde meus filhos também estudaram, da casa da minha mãe e da minha sogra.

    Bem, antes de ir à barbearia fui com o meu amigo Jammal tomar um café na loja de conveniência do posto de gasolina da avenida Júlio de Mesquita; lá encontrei e cumprimentei o Luizinho, um conhecido sempre muito cordial e para quem já prestei algum serviço no passado.

    Numa das mesas estavam três homens, os quais conheço de vista - aliás, no Cambuí todo mundo se conhece de vista -; eles comentavam sobre o debate da BAND entre os candidatos de São Paulo; como o tema me interessa prestei bastante atenção.

    Fiquei assustado com a idiotia, pois, para os “diletos” vizinhos de mesa, o candidato Pablo Marçal teria se destacado positivamente no debate. Me arrependi de ter ido àquela loja de conveniência, afinal eu sei que ela está sempre cheia de idiosubjetivados. Pensei: “será que eles não sabem que Marçal foi condenado por furto qualificado?”.

    Fato é que o candidato, uma espécie de Bolsonaro 2.0, tem conduta no mínimo suspeita. Recentemente ele se encontrou com o irmão de um líder do PCC (isso mesmo, Marçal esteve com Valquito Soares da Silva, irmão de Francisco Antônio Cesário Soares, o Piauí, apontado pela Polícia Civil como líder da facção criminosa na favela de Paraisópolis, na capital), e mais, Marçal está filiado a um partido cujo presidente tem relações confessas com o PCC. Como é possivel alguém, com mínimo de inteligência, considerar algo positivo num desqualificado?

    O meu amigo Jammal percebeu o meu incômodo e, sem que eu percebesse, foi ao caixa, pagou o que consumimos e disse “vamos, já deu...”.

    Pablo Marçal tem apenas 37 ou 38 anos, ou seja, eu já serei esquecimento e esse desqualificado estará a ocupar posições na república; pessoas como ele, Nikolas Xupetinha, Dudu Bananinha, Zambelli, Girão, dentre outros detritos do naipe, são jovens e tem visão de mundo criminosa; eles não têm projeto de nação, desprezam a constituição, ignoram as demandas urgentes e importantes da sociedade, são espantalhos da lógica liberal e do neopentecostalismo. 

    Fiquei bem triste e concluí que os meus representantes falharam na formação de quadros para o nosso campo (me refiro ao PT, PSB, PSOL, PcdoB, PCB, PCO, REDE, PV, PDT). 

    Falharam, pois, passaram a se preocupar apenas com eleições (e não com o processo político e com o válido e necessário envolvimento da população); a esquerda parece não ter quadros capazes de enfrentar no voto os citados detritos; tanto é verdade que a extrema-direita dá como certo seu controle do Senado a partir de 2027, ou seja, o senado do Brasil será controlado por bolsonaristas e suas pautas canalhas irão determinar o Brasil no qual minhas netas viverão.

    Os “homens do posto”, assim como os citados políticos de extrema-direita e todos que os apoiam, são idiotas no sentido que Rubens Casara deu ao termo no seu livro “A construção do idiota: o processo de idiossubjetivação”.

    No livro Casara demonstra que o atual estágio do capitalismo reorganizou a personalidade do indivíduo, alterando sua relação com o conhecimento, com o tempo, com a identidade, com a cultura e com o projeto da modernidade. Vivemos um período histórico notável pela valorização social da ignorância. 

    A ignorância é obstáculo aos negócios e ao exercício do poder, pois, o pensamento reflexivo é agora demonizado e a simplificação do ato de pensar passa a ser imperativo, funcional que é à reprodução ilimitada do modo de vida neoliberal. 

    Pablo Marçal e seus iguais, são resultado de quarenta anos de ideologia liberal (o liberalismo não é apenas uma teoria econômica) e da incompetência de todos os partidos de esquerda, todos tão cheios de certezas e cada vez mais distantes da realidade e, como profetizou Mano Brown em 2018: “Se em algum momento a comunicação do pessoal daqui falhou, vai pagar o preço”. “Se não conseguir falar a língua do povo, vai perder mesmo”.

    Sob a hegemonia neoliberal se acentua a idiotia; o que se busca é apenas o lucro e a obtenção de vantagens pessoais; as ideias válidas passaram a ser apenas aquelas fundadas na razão objetiva; valores como: justiça, igualdade, democracia e felicidade, por exemplo, sucumbem diante do horizonte delimitado por quem detém o poder econômico e o egoísmo se torna vetor interpretativo e mandamento nuclear por excelência. 

    Os efeitos desse processo são notáveis: sentimento anti-intelectual, desprezo à educação (vejam o que os idiotas fazem com a memória de Paulo Freire), desorientação generalizada, simplificação da linguagem, perda de capacidade de imaginação, narcisismo, delírio; em resumo, assistimos à derrota do pensamento e, o pior: a meu juízo, a esquerda ainda não chegou no “fundo do poço”, mas chegará, pois, Lula não é eterno, além de estarmos nos afogando em pautas identitárias e certezas que nos dividem.

    Os idiotas do posto e os “pablo marçal” (são muitos), que reduzem a compreensão da liberdade, àquela que se realiza unicamente no ato de consumir mercadorias, tem a sua vida facilitada pela incompetência dos líderes da esquerda que não conseguem falar a língua do povo.

    O livro de Casara busca compreender como ocorre a formatação de sujeitos idiossubjetivados, a um tempo incapazes e impotentes.

    Mas o que fazer? 

    Precisamos falar sobre isso e nunca desistir do Brasil, da democracia e da Política enquanto instrumento de transformação. #BoraElegerDemocratas

    Essas são as reflexões.

    Pedro Benedito Maciel Neto, 60, advogado, pontepretano, pai e avô; sócio da www.macielneto.adv.brpedromaciel@macielneto.adv.br , autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, ed. Komedi; “Tensão entre Poderes”, ed. Apparte.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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