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    Carlos Hortmann

    Professor, filósofo, historiador e músico.

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    Thiago Anastácio – o soberano falacioso capacitista!

    Antes de qualquer coisa é importante ressaltar que os atos de ontem em todo o Brasil e no exterior foram maiores do que os organizadores esperavam e sinaliza/aponta para o nível de insatisfação das pessoas que não visualizam soluções concretas e imediatas via a institucionalidade liberal-capitalista. Ou seja, compreendendo que a luta efetiva por vacina no braço e comida no prato com auxílio emergencial de 600 reais não virá do congresso (um dos mais reacionários da história), de lives ou de tweets lacradores – sem a pressão das ruas e dos movimentos sociais. Temos de continuar mobilizados e organizados a fim de sentir o pulso da correlação de força e também compreendermos quais as táticas mais certeiras para derrubar o quanto antes esse governo que tem um projeto político de morte.  

    Dito isso caro/a leitor/a vamos ao título dessa coluna.  

    Abaixo está ipsis litteris o que escreveu o senhor advogado e comentarista (supostamente de “esquerda”) da CNN Brasil, Thiago Anastácio:

    “A esquerda vive uma imbecilidade estrutural.

    No debate político n existe o ´mas o que eu fiz é diferente´.

    Acabaram de FODER a CPI ao aglomerar e acabaram de FODER a chance de lockdown quando necessário.

    ‘Se é seguro estar de máscara, para que fechar?’, dirão.  

    Parabéns.”

    Vamos por partes para demonstrar as falácias dos argumentos. Ele acusa a esquerda de uma “imbecilidade estrutural”, vejamos, o sentido ou ato de ser imbecil refere-se a uma psicopatologia com um “atraso mental equivalente a uma idade mental entre os três e os sete anos, caracterizado por um quociente de inteligência entre 30 e 50.” Primeiramente: recorre a um argumento capacitista para legitimar a sua opinião, portanto, ofende e agride as milhares de famílias que têm um/a ente querido/a com alguma lesão cognitiva ou cerebral. Avante. Ele acusa a esquerda em geral de seremos “atrasados mentais” com o agravante de ser algo estrutural, ou seja, a forma como pensamos a política e as táticas de enfrentamento são alicerçadas numa estrutura mental “atrasada”. Qual é a lógica por trás desse tipo de argumento: vocês são uns “imbecis e atrasados mentais”, logo, eu sou contra a vossa linha/tática política e não sou “imbecil e nem atrasado metal”. Conclusão: minha opinião é a correta e certa porque não vivo uma “imbecilidade coletiva”. Pelos vistos o senhor advogado fugiu das aulas de lógica básica, pois além de ser um argumento falacioso é discriminatório e capacitista.   

    A segunda frase: “No debate político n existe o ´mas o que eu fiz é diferente.” Caro senhor, comentarista da CNN, o primeiro erro é considerar o debate político e público como se fosse estático e ignorar os efeitos da conjuntura. Outro equívoco é recorrer ao fantasma de que fenómenos sociais com aparências similares são iguais na substância, portanto, está a escamotear a essência e os propósitos antagónicos de tais movimentos. Pergunto-lhe: acha mesmo que os protestos do dia 29 de Maio não são diferentes dos promovidos pelos fascistas que estão no poder? Ou para o senhor Thiago os/as trabalhadores/as brasileiros/as são burros ao ponto de não perceberem as diferenças substanciais entre os muitos atos promovidos pelo bolsonarismo e os de ontem? Uns a lutar pela vida e outros pela morte? Quem decidiu ir as ruas ontem foi porque depois de um ano e dois meses da pandemia não vê outra forma de parar o genocídio no Brasil sem também ir para luta – como último recurso, pois o governo protofascista é mais mortal do que o vírus. Não negamos a ciência. Não banalizamos a morte e nem os protestos de rua. O que fizemos ontem foi diferente sim!  

    O descalabro anastaciano continua: “Acabaram de FODER a CPI ao aglomerar e acabaram de FODER a chance de lockdown quando necessário.” Antes de qualquer coisa é preciso pontuar algo: o afeto que impera na nossa sociedade é o medo. A título de exemplo: os ganhos (a maioria já perdidos) que classe trabalhadora teve na Europa com Welfare-State não foi porque o liberal-capitalismo é “bonzinho”, mas porque os capitalistas europeus tinham medo de que os efeitos da Revolução Russa (Outubro) de luta dos/as trabalhadores/as chegasse ao continente dos impérios coloniais, portanto, entregaram alguns anéis para não perderem os dedos. Voltemos aos argumentos do rapaz que nos acusa de atrasados mentais.  

    Nós não acabamos de “foder a CPI” da Covid-19, mas justamente o contrário, foi um sonoro recado aos senadores de que o povo não vai ficar mais passivo (com razão, de medo de ser contaminado) diante de um projeto político de morte que o Bolsonaro-militares-burguesia monopolista colocaram em marchar no Brasil. Ou eles tiram consequências políticas e judiciais dos crimes cometidos por esse projeto político ou vamos para cima deles. Eles precisam ter medo! Caro advogado, penso que sua experiência subjetiva de pertencente aos segmentos médios da sociedade não lhe permite ver ou viver o que a grande maioria dos/as trabalhadores/as experimentam em trabalhos informais ou intermitentes (mais de 50%), ao usar ónibus lotados todos os dias, submetendo-se a aglomerações nos metros e afins. Perdoa-me, mas tem que ser em caixa alta: NO BRASIL NUNCA TEVE LOCKDOWN! Não foi garantida condições objetivas como um auxílio emergencial de 1000 reias para todas as pessoas até o final da pandemia ou moradias em que elas tivessem no mínimo água para poder lavar as mãos e manter o distanciamento social. O seu argumento sobre aglomeração só demonstra o quanto desconhece por completo a realidade da grande maioria dos/as brasileiros/as. No Brasil não haverá lockdown sem medo as ruas, pois para o Bolsonaro, militares e a classe dominante não faz a menor diferença se morrer 500 mil ou 1 milhão de brasileiros/as, desde que eles estejam protegidos. Talvez você ache que o ódioe a luta de classe sejam coisas do passado, mas lhe garanto que eles continuam a ser o motor da história.  

    Tomei a decisão de tirar um tempo do meu domingo para responder ao seu tweet e observar outros. Não é para atacar você enquanto pessoa ou indivíduo, mas para demostrar a forma como os seus argumentos estão colonizados pela ideologia liberal-capitalista e que sua postura arrogante e discriminatória de classificar quem decidiu ir para a rua de atrasados mentais te coloca mais perto do bolsonarismo do que de nós. Para que fique claro o que estou a dizer, recorro as suas palavras senhor comentarista da CNN de Junho de 2020: “É absolutamente lindo ver os policiais americanos, diante de manifestações pacíficas, fazendo parte dos protestos e pedindo o fim das desigualdades raciais.”

    Por que lá nos Estados Unidos da América eles podem protestar e os/as brasileiros/as não podem? Está a ver como você consegue diferenciar aparências similares que têm propósitos antagónicos? Ou só as vidas negras americanas importam? Os negros que morrem todos os dias no Brasil de fome, pela violência policial ou por não terem condições mínimas para se protegerem do vírus não importam? Lembra quem foi a primeira vítima mortal da Covid-19 no Brasil? Uma empregada doméstica negra moradora da favela que apanhou o vírus pela patroa branca que estava a fazer turismo na Itália.  

    Por fim. Gostaria de dizer algo ao senhor Anastácio: não é possível defender os direitos humanos, regozijar-se com a luta antirracista, se dizer ou ocupar um espaço público de “esquerda” e defender o liberal-capitalismo. Como dirá Malcom X: “não há capitalismo sem racismo”. Finalizo um trecho da poesia de Mauro Iasi:  

    Porque são tempos de decidir,

    Dissidiar, dissuadir,

    Tempos de dizer

    Que não são tempos de esperar

    Tempos de dizer:

    Não mais em nosso nome!

    Se não pode se vestir com nossos sonhos

    Não fale em nosso nome.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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