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    Emir Sader

    Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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    Turbulências do neoliberalismo

    "A era neoliberal é uma era de turbulências, porque é marcada pela hegemonia do capital financeiro na sua modalidade especulativa. Somente retomando a capacidade de investimento do Estado, resgatando a democracia e retomando políticas de distribuição de renda nos permitirão defender-nos das instabilidades", escreve Emir Sader

    Militares repetem Dilma e enterram Guedes na curva do neoliberalismo (Foto: PR | Reuters)

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    O mundo passou por transformações regressivas nas últimas décadas do século passado, que tiveram como uma de suas consequências, a passagem à época neoliberal do capitalismo mundial.      

     De um mundo bipolar, marcado pela presença de dois blocos que se dividiam o mundo em esferas de influência, passamos a um mundo unipolar, sob hegemonia imperial norteamericana. Uma mudança radical no panorama político e ideológico mundial. O fim do campo socialista gerou, com ele, a ideologia do Consenso de Washington e do pensamento único, promovendo a ideia do fim do socialismo, da divisão entre direita e esquerda, a predominância  da democracia liberal e da economia de mercado.

    Por outro lado, se passou do ciclo longo de caráter expansivo – do final da segunda guerra mundial até os anos 1970 -, o de maior expansão econômica da história do capitalismo, se passou a um ciclo longo de caráter recessivo, em que o capitalismo ainda está, sem horizonte de superação.
    Por sua vez, a predominância de governos que aplicam políticas de bem estar social foi superada por governos que promovem a concorrência entre todos no mercado, retirando direitos da população. Foram três fenômenos regressivos, que concentraram mais a renda, aumentaram os conflitos bélicos e aumentaram a miséria, a fome e a exclusão social.

    No período neoliberal a hegemonia deixou de estar com os grandes conglomerados monopolistas industriais, para estar no capital financeiro. Um capital financeiro de caráter especulativo, que oscila conforme os distúrbios do mercado, que se vale da liquidez para circular de uma bolsa de valores a outra, de um país a outro, promovendo a incerteza e a turbulência.
    A era neoliberal é era de turbulências, porque as economias agem conforme as oscilações das bolsas de valores, das transferência rápidas de capital, das operações de manada, que desestabilizam economias. Desde que se instaurou, houve crises na América Latina, na Ásia, na Europa, na África, com efeitos prolongados e retrocessos como seus efeitos.

    A era da produção e da geração de empregos ficou para trás, substituída pela era da taxa de juros, da especulação financeira, da precarização do trabalho, da concentração de renda. A economia brasileira cresceu desde os anos 1930 até a crise neoliberal da dívida, no final dos anos 1970. Votou a crescer, na contramão do neoliberalismo, entre os anos 2003 e 2012, com políticas de promoção da expansão dos setores produtivos da economia e de distribuição de renda, mediante a geração de milhões de empregos com carteira assinada e políticas sociais. 

    A ruptura da democracia, em 2016,  reintroduziu o modelo neoliberal e a promoção privilegiada dos interesses dos bancos privados. A instabilidade econômica voltou com força, assim como a exclusão social e a miséria. Da mesma forma que nas outras regiões do mundo que mantiveram sempre o modelo neoliberal.

    Em escala mundial se passou de um ciclo com relativa estabilidade econômica a um ciclo marcado por contínuas turbulências econômicas, provocadas pelas instabilidades típicas dos mecanismos financeiros. Se reproduziram crises no México, no Brasil, na Argentina, na Coreia do Sul, na Rússia, assim como se generalizaram a partir de 2008, colocando a economia global em recessão. 

    As políticas neoliberais, escancarando os mercados internos para os impactos da economia global, desindustrializando as economias dos países e promovendo a centralidade do capital financeiro, enfraquecendo a capacidade de regulação estatal e a força das empresas públicas, provocam fragilidades enormes nas economias de cada país diante das instabilidades internacionais.

    É o que acontece no momento atual. Diante da iminência de uma nova recessão internacional, ao invés de buscar proteger nossa economia, o governo tenta se valer da situação para impulsionar mais ainda seus projetos, que golpeiam mais ainda o Estado, intensificando as privatizações e enfraquecendo sua capacidade de ação. Os efeitos da situação internacional sobre o Brasil puderam ser resistidos em 2008, porque se fortaleceram os créditos dos bancos públicos, se resistiu aos embates externos, ao invés de multiplicá-los, como se faz agora, abrindo ainda mais nossa economia.

    A era neoliberal é uma era de turbulências, porque é marcada pela hegemonia do capital financeiro na sua modalidade especulativa. Somente retomando a capacidade de investimento do Estado, resgatando a democracia e retomando políticas de distribuição de renda, que permitem a economia crescer aqui dentro, nos permitirão defender-nos das instabilidades externas e voltar a fortalecer a economia brasileira e os direitos de todos.  
     

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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