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J. Carlos de Assis

Economista, doutor em Engenharia de Produção pela UFRJ, professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba e autor de mais de 20 livros sobre economia política.

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Uma hipótese conspiratória

Há, pois, razões externas e internas para que se vejam nessa guerra sinais de uma dupla conspiração

Ataque israelense na Faixa de Gaza (Foto: Reprodução/TV Globo)

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Detesto teorias conspiratórias. Em geral, desviam o foco das pessoas de questões e de eventos reais. Entretanto, ou Israel explica de forma absolutamente convincente por que suas Forças Internas de Defesa, supostamente as mais eficientes do mundo, deixaram centenas de palestinos arrombarem suas fronteiras sem aviso prévio, provocando uma matança sem precedentes em seu território, ou começo a acreditar que isso resulta de uma conspiração orquestrada pelo próprio Israel. 

Não inventei essa tese. Ela está circulando na internet a partir do depoimento de uma ex-integrante do Exército israelense, inconformada com os últimos acontecimentos na região de Gaza. Segundo ela, a fronteira é uma área impenetrável. Nem um pássaro ou uma barata passam por ela sem serem detectadas. A espionagem judaica, pela propaganda que se faz dela, e por muitas de suas ações internas e internacionais,  é a mais eficaz no planeta. Dessa forma, a invasão é inexplicável. 

Diante disso, é necessário buscar a alternativa de uma conspiração orquestrada por gente interessada no desequilíbrio do mundo. Os primeiros da lista são os maiores aliados de Israel, os Estados Unidos, que estão à beira da perda da hegemonia que exerceram na maior parte do planeta desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Logo que o conflito teve início, eles se mostraram preparados para entrar imediatamente em ação, ajudando no cerco de Gaza, com uma poderosa esquadra no Mediterrâneo.  

Quem ganha com guerras são os ricos e os bilionários. São principalmente americanos e ingleses. A oligarquia dos Soros e de outros senhores da Terra, que se acham no direito de ordenar o mundo segundo seus interesses. Soros, por exemplo, esteve por trás da crise ucraniana, desde o fim da Guerra Fria. E, colaborando com o Departamento de Estado americano, foi o mais destacado financiador privado do golpe contra o governo legítimo da Ucrânia, que levou à intervenção russa na Criméia. 

Entretanto, os maiores interessados em criar um clima de anarquia no mundo são as forças políticas e econômicas ocidentais que temem a emersão da China e da Rússia como polos alternativos de hegemonia mundial. Nesta altura do século, vê-se na desorganização interna do próprio governo americano o reflexo dos desafios nos campos econômico, tecnológico, político e militar para os quais o país não encontrou uma saída. Diante disso, não seria surpresa uma reação ditada pelo desespero. 

A monstruosa operação executada pelo Hamas em Gaza revela-se, assim, um instrumento para “resolver” definitivamente o conflito israelense-palestino em favor de Israel. Com isso, um dos principais focos de crises no mundo seria equacionado sob supervisão norte-americana, restabelecendo sua posição hegemônica ameaçada. Claro, há imensas perdas humanas e materiais. Mas que maior perda existe que o controle mundial de um império que teima em subsistir, apesar de enfraquecido?

Internamente, aos extremistas de direita israelenses interessa que se criem pretextos para a “solução final” do conflito com os palestinos, entre os quais se destacam os vários assentamentos na Cisjordânia, numa provocação apoiada pelo governo. Eles estão bem representados pelo Likud e pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, este último acusado diretamente pelo mais importante jornal do país, o Haaretz, de principal responsável pelo “desastre que se abateu sobre Israel”.

O jornal sustenta que Netanyahu “foi um completo fracasso na identificação dos perigos a que estava conscientemente conduzindo Israel ao estabelecer um governo de anexação e expropriação”, e “ao nomear Bezalel Smotrich e Itamar Ben-Gvir, extremistas que são colonos ilegais na Cisjordânia, para cargos essenciais”, adotando, ao mesmo tempo, “uma política externa que ignorava abertamente a existência e os direitos dos palestinos”. 

Ben-Gvir, o ministro da Segurança Nacional, é tão extremista que foi condenado em um tribunal israelense por apoiar o terrorismo e incitar o racismo contra os palestinos, diz o jornal. Antes de entrar para o governo, ele protestou com cartazes que diziam “Fora árabes”, “Ou nós ou eles” e “Há uma solução: expulsar o inimigo árabe”.  Portanto, não há surpresa na terrível reação do Hamas, pelo único caminho que o governo de Netanyahu lhe deixa: “a violência extrema”. 

Entretanto, para exterminar de vez o povo palestino que habita em Gaza e na Cisjordânia, os extremistas israelenses levados ao governo pelo líder do Likud precisavam de um álibi convincente perante o mundo. Não há nenhum melhor que o massacre perpetrado agora. Com isso, a guerra declarada por Netanyahu não precisa ter limites, sequer os assinalados pelas convenções internacionais de proteção aos direitos humanos, para as quais os países ocidentais fecham os olhos. 

Esse álibi está funcionando bem, se não em todo o planeta, mas pelo menos no Brasil. A grande imprensa do país ataca veementemente o Hamas e usa todos os expedientes para expor a crueldade da guerra na televisão, despertando a emoção popular contra os que invadiram Israel. Silenciam-se, porém, a respeito dos crimes anteriores e atuais praticados pelo próprio governo israelense contra os palestinos. É uma injustiça terrível, que só desperta mais ódio pela parte discriminada. 

Há, pois, razões externas e internas para que se vejam nessa guerra sinais de uma dupla conspiração. De um lado, a tentativa desesperada dos ocidentais para protegerem a hegemonia do império decadente. De outro, a busca de uma suposta e definitiva segurança de Israel através do massacre de seus vizinhos árabes. Quanto a isso, não é absurdo supor que, nessa conspiração, o Hamas tenha tido cooperação para atacar por parte de instigadores de dentro do próprio governo de Netanyahu.    

 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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