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    Luiz Eça

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    Vale tudo na guerra da Síria

    Obama não deixou de pedir a cabeça de Assad, mas John Kerry passou a falar em negociações de paz, enquanto, nos EUA, vozes de parlamentares e jornalistas diziam que ajudar gente ligada à al Qaeda era dose

    O presidente Obama já não é mais categórico.

    Depois de passar meses (acho que, talvez, anos) afirmando que Assad perdera legitimidade, que tinha e ia sair de qualquer jeito, que só assim haveria paz na Síria, agora ficou flexível.

    Já admite outras saídas.

    Ele aprendeu que nem tudo é preto ou branco.

    Em geral, costuma ser cinza.

    Considerar os rebeldes combatentes da democracia e da liberdade capazes de, com algum empurrão externo, derrubarem o regime Assad era uma análise distante da realidade.

    Até que o Exército de Libertação da Síria estava cheio de gente de ideias democratas, seus chefes bem vistos pelo Ocidente.

    Mas, nas hostes dos rebeldes, não havia só good guys.

    Boa parte dos seus integrantes era formada por milícias islâmicas, que afluíam em número cada vez maior. Muito eficientes na luta contra as forças do governo Assad.

    Não eram nada confiáveis, entre elas havia movimentos ligados à al Qaeda, como o Nussra. Eles logo se destacaram promovendo diversos atentados, inclusive suicidas, matando tanto líderes do governo como inocentes civis.

    Bem, era necessário separar o joio do trigo e, ainda nos tempos de Hillary Clinton na secretaria de Estado, a Casa Branca pôs o Nussra no seu índex dos movimentos terroristas.

    Esperava-se que, com isso, eles fossem postos no ostracismo.

    Que nada!

    80 milícias lançaram um manifesto defendendo seus irmãos de armas e condenado os americanos que em vez de mandar armas, vinham com críticas a quem lutava nas primeiras linhas.

    A partir daí, Obama começou a engolir em seco.

    Não deixou de pedir a cabeça de Assad, mas John Kerry, sucessor da sra. Clinton, passou a falar em negociações de paz, enquanto, nos EUA, vozes de parlamentares e jornalistas diziam que ajudar gente ligada à al Qaeda era dose.

    Vai ver já estão usando nossas armas contra nós!

    Kerry procurou os russos, amigos de Assad, para juntos convencerem os adversários a se reunirem sem pré-condições.

    Claro, os EUA continuavam dizendo que, depois do acordo final, o ditador não poderia continuar mandando.

    A estas alturas, já se sabia que o bem comportado Exército de Libertação da Síria, apoiado pelo Ocidente, não era obedecido pelos grupos islâmicos.

    E pior: em diversas regiões do país, milícias, especialmente as dos bad guys da al Qaeda, travavam combates com as forças moderadas.

    Em novembro, os grupos islâmicos se uniram na chamada Frente Islâmica, cujo efetivo total é de entre 45 mil e 60 mil guerreiros.

    No início de dezembro, as coisas ficaram ainda mais pretas.

    A nova Frente Islâmica estreou assaltando um grande armazém do exército rebelde oficial, roubando suprimentos fornecidos pelos EUA consistentes em alimentos, armas leves e ainda mísseis anti-tanques e anti-aéreos.

    Grande indignação em Washington!

    Obama mandou cortar toda e qualquer ajuda aos rebeldes. O Reino Unido, sempre dócil como uma sombra, o acompanhou (há depoimentos de que, sem os recursos americanos e britânicos, soldados rebeldes tem que se virar para poder comer).

    Mas as coisas seguem, digamos, evoluindo.

    A agência Reuters noticia que emissários do exército americano vão encontrar líderes da Frente Islâmica para tratar do apoio dos EUA a suas forças.

    Justificando , informa Marle Hart, porta voz do departamento de Estado: "Nós podemos nos aproximar da Frente Islâmica, certamente, porque eles não são classificados como terroristas."

    É verdade, no entanto, entre os integrantes dessa força estão gente da al Qaeda e sua filial o Estado Islâmico do Iraque.

    Sendo jihadistas, todas as milícias da Frente Islâmica são anti-americanas, muitas delas profundamente, e nem de longe pretendem tornar a Síria um país democrata.

    Sua posição ficou muito clara no seu manifesto de fundação.

    Tem como objetivo estabelecer na Síria uma teocracia sunita, rejeitando a idéia de um regime laico como contrária ao Islã.

    Renegam um governo representativo porque, segundo suas crenças, somente "Deus é soberano" e o poder deriva dele, não do povo.

    Duro de engolir, para Washington.

    O assessor de um parlamentar americano declarou que os rebeldes se reduziram a um grupo de exilados e os jihadistas tomaram conta das operações bélicas.

    Segundo uma liderança oposicionista síria, os EUA estão procurando convencer a Frente Islâmica a se unir ao Exército de Libertação da Síria.

    Não seria exatamente buscar uma virada no jogo – hoje favorável às tropas de Assad – mas uma posição mais forte nas reuniões de paz que acontecerão 22 de janeiro, em Genebra.

    De acordo com informações de líderes oposicionistas, os EUA estariam dispostos a fazer as mais amplas concessões.

    Tudo para evitar a possibilidade de que um governo com participação da al Qaeda possa assumir o poder.

    Os rebeldes teriam sido avisados de que uma administração provisória, resultante de eventual acordo de paz, teria de incluir uma maioria de elementos pró-Assad.

    E mais: Assad poderia até continuar presidente, com "poderes reduzidos".

    A mesma fonte informou que caso os rebeldes não aceitassem, "perderão a maior parte do Ocidente".

    Esta mudança de 360 graus, caso se confirme, significa que Obama e o Ocidente desistiram de enfraquecer o Irã, através da derrubada do seu aliado Assad.

    Talvez porque o novo Irã, de Rouhani, não está mais sendo visto como inimigo. Mas como um saboroso mercado, com ânsia reprimida de consumir produtos do Ocidente.

    Portanto, desaparecem as principais razões de uma guerra, cujos desdobramentos podem ser muito graves, além de dispendiosa e mal vista pelos povos do Ocidente.

    Obama, particularmente, quer evitar novas situações do tipo da ameaça frustrada de bombardeio de Damasco, prejudiciais à sua imagem. Ainda mais tendo em vista as eleições parlamentares de 2014.

    O bom é que, os EUA querendo paz a todo custo, a Arábia Saudita fica sozinha no delenda Assad.

    Mas não é pouco.

    Diversas figuras sauditas exponenciais já avisaram que seu país não aceita as concessões americanas na Síria e no Irã e vai continuar agindo na defesa dos seus interesses na região.

    No que tange à situação síria, vão continuar jorrando dólares e armas para os rebeldes.

    Está na hora das grandes potências falarem grosso com a monarquia petrolífera.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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