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    Aldo Fornazieri

    Professor da Fundação Escola de Sociologia e Política e autor de "Liderança e Poder"

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    Vitórias e limites das esquerdas

    A vitória do Partido Trabalhista na Inglaterra e do Nova Frente Popular na França representam, antes de tudo, um alívio e uma descompressão política

    Eleitores celebram vitória da esquerda na França (Foto: Reuters)

    A vitória do Partido Trabalhista na Inglaterra e do Nova Frente Popular nas eleições legislativas da França representam, antes de tudo, um alívio e uma descompressão política em face do crescimento e das ameças de vitória de partidos de de extrema-direta pelo mundo afora. Essas vitórias, contudo, precisam ser bem dimensionadas para que não se criem falsas ilusões. 

    A rigor, três componentes principais determiaram os resultados: exaustão com os partidos no poder, clivagens ideológicas profundas acerca de valores e programas de governo e incapacidades dos governos (de qualquer tendência ideológica) de promover mudanças significativas nas condições de vida da amplos setores sociais menos abastados. O Partido Social-Democrata, no poder na Alemanha, por exemplo, vem tendo um desempenho sofrível, assim como Macron vem tendo na França. Já os Conservadores na Inglaterra foram desastrosos.

    O modelo político-partidário inglês não se presta muito, por ora, à formação de alianças e frentes eleitorais. Na tradição tratava-se de um modelo bipartidário – Conservadores e Trabalhistas –, mas com o crescimento do Partido Liberal Democrata e do Partido Reformista (extrema-direita) a necessidade de formação de alinças pode se torar uma constante no futuro. Não agora, pois o Partido Trabalhista, com 412 cadeiras dos 650 assentos, tem enorme folga para governar sozinho. 

    O primeiro-ministro Keir Staimer, contudo, conduziu o partido para posições mais moderadas e centristas. Conter a pobreza crescente, melhorar a saúde pública e investir em habitação são os principais pontos do programa trabalhista. Afianl de contas, com o Brexit e com políticas antissociais, os conservadores deixaram um saldo social deplorável. Keir avisou que as mudanças serão lentas, pois além do fardo social, existem também outros problemas como inflação, necessidade de reaproximação com a União Europeia e de garantir a responsabilidade fiscal.

    O Partido Conservador ficou com apenas 131 cadeiras. Foi a maior derrota da sua história. Os liberais saltaram de 15 para 61 cadeiras e os extremistas de 1 para 15 cadiras. Já o Partido Nacional Escocês caiu de 43 para 10 cadeiras. No total, no primeiro turno foram eleitos 76 e, no segundo, 501deputados.

    No caso da França, as eleições também tiveram uma marca claramente mudancista. No primeiro turno e nas eleições para o Palamento Europeu, a extrema direita da Reunião Nacional crescu significativamente. No segundo turno, a Nova Frente Popular, de centro-esquerda, saiu vitoriosa. 

    O presidente Macron foi o grande derrotado das eleições, tanto política, quanto eleitoralmente. A sua aliança de centro (Juntos) caiu de 250 cadeuras para 168. Sua derrota só não foi maior porque os partidos de esquerda retiraram vários candidatos no segundo turno para apoiar os centristas, tendo em vista que se formou a Frente Repúblicana, reunindo a centro-direita e a esquerda, para impedir a vitória da extrema-direita. 

    A Nova Frente Popular foi a surpeendete vencedora final, conquistando 182 cadeiras, obtento um crescimento em relação ao quadro anterior. Ela não existia antes das eleições. É composta pelo Partido Socialista, Partido Comunista, Partido Verde e França Insumissa, partido mais à esquerda, liderado por Jean-Luc Mélanchon, França Insumissa e Partido Socialista ficaram com um número de cadeiras maios ou menos iguais. 

    A Reunificação Nacional saiu politicamente derrotada por conta da grande expectativa de vitória que se criou no primeiro para o segundo turno. Mesmo assim, teve um crescimento significativo, saltando de 88 para 143 cadeiras. Outros partidos menores conquistaram 73 cadeiras. 

    Em síntese: olhando os três principais campos políticos, os franceses optaram pela mudança, tanto para a esquerda, quanto para a direita. O governo centrista foi derrotado. Aparentemente, o que impediu a vitória da extrema-direita foi a formação da Frente Republina entre a esquerda e o centro, com a retirada de candidatos um em favor do outro e a troca de apoios mútuos.

    Tudo indica que o novo governo será formado com um primeiro-ministro da Nova Frente Popular que poderá ou não se compor com os centristas de Macron. A NFP não tem maioria absoluta. Seja pela sua composição interna, seja pela necessidade de ober apoio do centro para aprovar medidas e iniciativas de governo, a tendência é a de que se constituirá um governo moderado de centro-esquerda. 

    Se a França Insubmissa tensionar à esquerda, poderá ser um governo bastante instável. Do equilibrio relativo entre os três campos políticos só podem resultar duas tendências: ou negociação entre a esquerda e o centro para garantir a estabilidade e a moderação ou a instabilidade política conflitos e tensões, o que poderá favorecer o crescimento da extrema-direita. 

    A Nova Frente Popular tem um programa bastante progressista. Mas os limites inerentes à ausência de maioria absoluta, deverá moderar o programa. Os partidos e frentes de centro-esquerda que se formam hoje têm uma capacidade menor de realizar mudanças e ampliar direitos em relação às conquistas dos partidos social-democradas europeus do pós Guerra. 

    Três razões principais explicam esta situação. a) no pós-Guerra a extrema-direita estava derrotada; b) sindicatos fortes constiuiam a base de apoio da social-democracia e forçavam negociações favoráveis; c) a existência da URSS de do Leste comuninsta pressionava a centro-direita para posições moderadas e de consenso programático com a social-democracia.

    Com o advento da globalização e da revolução digital ocorreu um enfraquecimento dos sindicatos e redução de suas bases. Esse processo foi acompanhado por uma forte perda de direitos e pelo triunfo de políticas ultraliberais, assim como pelo ressurgimento da extrema-direita. Esses fenômenos conjugados eumpurraram os partidos de centro-esquerda para posições mais de centro e moderaram as posições das esquerdas. 

    Com a queda da força organizada dos sindicatos e com a perda de capacidade de mobilização e de organização dos partidos de esquerda e centro-esquerda criou-se um ambiente de dificuldades e de moderação que dificulta novas conquistas de direitos, de bem estar e de justiça social. 

    O Estado social e distributivista debilitou-se e o desafio central do nosso tempo, a crise climática, sequer é enfrentado de forma satisfatória. A quebra da capacidade de produzir consensos, a ausência de forças capazes de exercer hegemonias estabilizadoras e os novos quadros de tensões políticas internas e de disputas geopolíticas apontam para o agravamento dos conflitos e para a possibilidade de eclosão de novas guerras.

    Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política e autor de Liderança e Poder.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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