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    Ricardo Queiroz Pinheiro

    Bibliotecário e pesquisador, militante do livro e leitura, doutorando em Ciências Humanas e Sociais (UFABC)

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    Voltar para as bases

    "Se fosse tão simples, bastava abrir um chamado no SAC e solicitar reinstalação da esquerda nas bases. Tempo de espera: de 30 a 50 anos"

    (Foto: Ricardo Stuckert)

    Todo mundo já ouviu essa frase na esquerda: “precisamos voltar para as bases”. Mas o que isso significa, exatamente? As bases mudaram, o mundo do trabalho se esfarelou, os espaços de organização não são mais os mesmos. A extrema-direita já está onde a gente acha que precisa estar. Igrejas, grupos de WhatsApp, botecos, clubes de várzea, redes de proteção comunitária, até os aplicativos de entrega viraram campo de disputa. Não tem vazio esperando ocupação – tem território ocupado, com disputa real acontecendo.

    Tem também o dilema de sempre: teoria demais, prática de menos; prática demais, teoria nenhuma. A esquerda adora um conceito bem amarrado, um diagnóstico preciso sobre a crise do trabalho, o esgotamento neoliberal e a nova subjetividade precária. Mas e a organização? Fica ali, esperando um momento que nunca chega. Do outro lado, tem quem ache que basta estar presente, sem método, sem projeto, sem escuta estruturada. A extrema-direita não tem essa dúvida: escuta, mobiliza, organiza e entrega respostas, mesmo que sejam falsas e criminosas.

    E aí vem outra frase batida: “temos que ouvir mais e falar menos”. Mas ouvir o quê? Como? O que fazer com o que foi ouvido? Escutar sem método é só um jeito de registrar angústias sem organizá-las. A direita escuta, sim, mas já chega com um roteiro pronto pra transformar medo e frustração em discurso político. Enganando deliberadamente, mas com método e, claro, com ajuda do capital. A esquerda, muitas vezes, escuta e só anota, como quem faz pesquisa de campo sem hipótese. Escuta e não interfere, escuta e não propõe. No fim, só testemunha o senso comum sendo moldado contra ela mesma ou, pior, escuta só o quer ouvir.

    A verdade é que já estivemos lá, mas era outro mundo. Outro trabalho, outro bairro, outra estrutura. A filosofia da violência, da prosperidade e a competição grassando.Voltar, como? Se fosse tão simples, bastava abrir um chamado no SAC e solicitar reinstalação da esquerda nas bases. Tempo de espera: de 30 a 50 anos.

    Estamos sem base pra voltar pras bases.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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