Cotado para STF já decidiu contra terra indígena e a favor dos agrotóxicos
Decisões de Kassio Nunes Marques no ano de 2019 vão ao encontro das pautas defendidas pelo governo federal. Ele defendeu o uso de agrotóxicos e negou a retirada de não-indígenas de reserva
Brasil de Fato - O desembargador piauiense Kassio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), é o mais recente nome cotado para ocupar a vaga do ministro Celso de Mello no Supremo Tribunal Federa (STFl), que deverá deixar a corte – em aposentadoria antecipada – no dia 13 de outubro. Órgãos da imprensa nacional publicaram nesta quarta-feira (30) que Jair Bolsonaro teria dito a ministros da Suprema Corte que tem a intenção de indicar Nunes Marques para o cargo.
O desembargador – sempre há a possibilidade de se tratar de mais um balão de ensaio lançado pelo presidente da República – está sendo considerado mais moderado do que os demais juristas cotados para a função até agora. O histórico de suas decisões recentes e mais emblemáticas, entretanto, é a favor de uma série de bandeiras, práticas e valores empunhados pelo bolsonarismo.
Veja, abaixo, uma amostra de como pensa e decide o desembargador Kassio Nunes Marques em temas sensíveis ao presidente da República, como territórios indígenas, combate à corrupção e privilégios, privatizações, meio ambiente e agronegócio.
Liberação do uso de agrotóxico
No início de setembro de 2018, Kássio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), derrubou a liminar (decisão provisória) que suspendeu o registro de produtos à base das substâncias glifosato, tiram e abamectina no país. Conhecido comercialmente como Roundup, o glifosato é um herbicida usado contra ervas daninhas indesejadas em produções agrícolas.
Para decidir em favor dos agrotóxicos, Nunes Marques fez uso de um argumento econômico e de mercado, ponderou que a suspensão dos registros dos produtos causaria lesão à ordem pública, por tirar as substâncias do mercado de maneira “abrupta, sem a análise dos graves impactos que tal medida trará à economia do país e à população em geral”.
No dia 23 de setembro, latifundiário da soja e então ministro da Agricultura, Blairo Maggi, chegou a comemorar em sua conta no Twitter a derrubada da liminar, mas se desculpou em seguida, pois a decisão ainda não havia sido proferida, o que só veio a acontecer sete dias depois, 30 de setembro. Nem o fazendeiro outrora ministro, nem o desembargador jamais explicaram como o primeiro soube com uma semana de antecedência da decisão do segundo.
Para Alan Tygel, da coordenação nacional da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, a decisão representou um risco para a população:
“A gente tem aí desde 2015, que a Organização Mundial da Saúde, através da sua agência de estudos oncológicos, classifica o Glifosato como um agrotóxico provavelmente cancerígeno, o que indica que já existem pesquisas sólidas o suficiente para associar o Glifosato ao câncer.”
Liberação de ocupação de terras indígenas por não-indígenas
Kássio Nunes Marques suspendeu, no dia 24 de setembro do ano passado, liminar que obrigava a desocupação de 2,5 mil moradores – não indígenas – da comunidade em terra protegida de Jarudore, no município de Poxoréu (MT), a 240 quilômetros da capital, Cuiabá.
No Plenário da Câmara Federal, o deputado federal José Antonio Medeiros (Pode-MT), que é agente policial rodoviário e um dos maiores defensores do governo Bolsonaro, comemorou a decisão:
“Uma grande vitória, nos esforçamos muito. Temos que parabenizar a bancada toda e a cada morador de Jarudore. Eu diria que é uma vitória substancial na busca pela reafirmação da verdade que se impõe.”
No dia 20 de agosto de 2019, os moradores que ocupam áreas de 1.930 hectares do território indígena deveriam ter se retirado da área em 45 dias, conforme a determinação judicial relativa à ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF), para a reintegração de posse de terra pelos povos indígenas Bororo. O Distrito de Jarudore foi reconhecido como terra Indígena em 1912, mas, atualmente, mais de 90% da área é ocupada por pessoas não índias.
Lagosta no STF e fila especial para advogados no INSS
No dia 7 de maio de 2019, Kássio Nunes Marques atendeu pedido da Advocacia Geral da União (AGU) e liberou a licitação do Supremo Tribunal Federal (STF) para a compra de vinhos e refeições, incluindo lagosta e vinhos premiados internacionalmente. O TRF-1 estava decidindo sobre a matéria porque se tratava de um contrato feito com empresa fornecedora com sede em sua jurisdição.
Na decisão, Nunes Marques afirmou que os produtos de alto custo eram justificáveis porque seriam utilizados em "refeições institucionais oferecidas às mais graduadas autoridades nacionais e estrangeiras", conforme se lê no trecho abaixo:
Não se trata de mero fornecimento ordinário de alimentação aos Magistrados daquela Corte, tampouco se destina, a contratação, a todo e qualquer evento. Bem diferente disso, o contrato a que se refere o Pregão Eletrônico 27/2019/STF se destina a qualificar o STF a oferecer refeições institucionais às mais graduadas autoridades nacionais e estrangeiras, em compromissos oficiais nos quais a própria dignidade da Instituição, obviamente
Em outra decisão recente, de novembro de 2017, durante o governo Michel Temer, o TRF-1 manteve o atendimento prioritário dos advogados nas agências do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
O desembargador Kassio Nunes Marques, rejeitou efeito suspensivo apresentado pela agência. Desde 30 de outubro daquele ano, valia uma liminar concedida pela Justiça Federal no DF, que determinou a garantia de atendimento diferenciado a advogados nas agências do INSS, sem agendamento prévio, em local próprio e independente de distribuição de senhas, durante o horário de expediente.
Privatização de subsidiária da Petrobras
No dia 27 de junho de 2016, a Justiça suspendeu liminar que impedia a venda pela Petrobras de 49% de sua subsidiária de gás Gaspetro à japonesa Mitsui. A estatal, então vivendo uma crise de caixa incensada pela Operação Lava Jato, tentava colocar em prática um bilionário plano de venda de ativos.
O negócio, de R$ 1,9 bilhão de reais, havia sido impedido integralmente pelo Juízo da Subseção Judiciária de Paulo Afonso, na Bahia, mas a decisão foi derrubada pelo desembargador Kassio Nunes Marques.
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