STF forma maioria e confirma que Moro foi parcial e suspeito na perseguição contra Lula
Ministro Ricardo Lewandowski votou a favor da decisão que declarou o ex-juiz Sergio Moro suspeito, seguido de Dias Toffoli e Cármen Lúcia, deixando o placar em 6 x 2 pelo entendimento da Segunda Turma
247 - O Supremo Tribunal Federal (STF) decide nesta quinta-feira (22) se 14 recursos da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não precisam mais ser julgados. Um desses recursos foi julgado na Segunda Turma, que decidiu por 4 a 1 que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial ao condenar o ex-presidente no caso do triplex.
O relator da matéria, ministro Edson Fachin defendeu que os 14 recursos "perderam o objeto" e votou por "negar provimento ao agravo regimental" de Lula.
Já o ministro Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma, votou a favor do recurso da defesa de Lula, contra a posição de Fachin. "Se não zelamos por nossa biografia, zelemos pela biografia do tribunal", afirmou o ministro.
Os ministros Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski acompanharam o voto de Gilmar Mendes na divergência de Fachin.
O ministro Luís Roberto Barroso acompanhou Fachin, votando contra a decisão que declarou Moro suspeito.
Antes, o plenário já decidiu que os processos contra Lula na 13ª Vara Federal de Curitiba devem tramitar na Justiça Federal de Brasília.
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O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá nesta quinta-feira (22) se mantém ou anula o julgamento da 2ª Turma que considerou o ex-juiz Sergio Moro parcial ao condenar Lula (PT) sem provas no caso "triplex do Guarujá".
A decisão da Turma sobre a suspeição do ex-juiz e ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, no último dia 23, atendeu a um pedido da defesa do ex-presidente, por meio do habeas corpus (HC) 164.493.
Por 3 votos a 2, os ministros interpretaram que a parcialidade do então juiz foi demonstrada em diferentes etapas da instrução processual da ação penal do triplex, de autoria dos procuradores da operação Lava Jato. A condução coercitiva desnecessária de Lula, o levantamento do sigilo da delação do ex-ministro Antônio Palocci em plena disputa eleitoral de 2018 e a interceptação ilegal de telefonemas do ex-presidente, seus familiares e advogados foram alguns exemplos citados.
O Brasil de Fato reuniu quatro dúvidas comuns sobre o caso para explicar o que está em jogo esta semana.
Já não estava decidido?
O julgamento da 2ª Turma não pode ser revertido no plenário. Ou seja, não haverá uma nova votação sobre a parcialidade de Moro.
O que será analisado é um desdobramento do HC 193.726, decidido pelo ministro Edson Fachin no dia 8 de março, que devolveu ao ex-presidente Lula (PT) seus direitos políticos.
Além de reconhecer a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, anulando quatro processos contra Lula e remetendo os processos a outra vara, Fachin extinguiu o HC que tratava da suspeição de Moro e outras 23 ações relacionadas.
O argumento de Fachin é que, como a Vara de Curitiba nunca foi competente para julgar aqueles processos, todas as ações decisórias que dizem respeito a eles também perdem validade.
Como o plenário deve votar?
A decisão monocrática de Fachin foi analisada pelo plenário no último dia 15.
Por 8 votos a 3, os ministros do STF mantiveram a anulação das quatro ações penais contra Lula, mantendo o ex-presidente elegível. Porém, a extensão dessa decisão não foi votada.
A defesa de Lula pede que a suspeição de Moro seja mantida, dada sua gravidade e seu impacto político e jurídico.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, veiculada no último dia 18, o ministro Gilmar Mendes disse que o plenário não deve anular a suspeição de Moro.
“Essa questão está resolvida, porque nós já julgamos o habeas corpus [da suspeição de Moro na 2ª Turma]. Temos que ser rigorosos com as regras processuais. Não podemos fazer casuísmo com o processo, por se tratar de A ou de B”, afirmou.
Os votos de Mendes e de Fachin, que divergem entre si, são os únicos que vieram a público até o mesmo.
O que vem antes: suspeição ou incompetência?
Na decisão do dia 8, que seria reafirmada pelo plenário, Fachin reconheceu que não havia conexão entre os supostos crimes que o Ministério Público Federal (MPF) atribuía a Lula e a investigação de corrupção na Petrobras. O único elo – "capenga", segundo o próprio procurador Deltan Dallagnol – era que a construtora OAS, envolvida nas investigações do triplex, pertencia a um cartel de empreiteiras que atuava de forma ilícita em contratações celebradas com a petroleira.
Não há "relação de causa e efeito entre sua atuação [de Lula] como Presidente da República e determinada contratação realizada pelo Grupo OAS com a Petrobras S/A, em decorrência da qual se tenha acertado o pagamento da vantagem indevida", decidiu Fachin.
Com a incompetência da Vara de Curitiba demonstrada, a polêmica da vez é a extensão dessa decisão.
“Ele [Fachin] reconheceu a extensão das nulidades com fundamento no artigo 21, inciso 9, do regimento interno do STF”, explicou Sérgio Graziano, doutor em Ciências Criminais e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), em entrevista recente ao Brasil de Fato.
Graziano acrescenta que “a incompetência diz respeito ao juízo [Vara], e a suspeição, ao juiz [Moro].”
Perguntado sobre qual a jurisprudência nesses casos, o especialista ressaltou o ineditismo dos processos que envolvem Lula na Lava Jato. “Eu, particularmente, não conheço uma outra situação em que houve incompetência e suspeição ao mesmo tempo”, disse.
Doutor em Direito Constitucional, ouvido na mesma reportagem, Marcelo Uchôa afirmou que o HC em que Moro foi julgado parcial não deve ser anulado.
“O fato da suspeição, processualmente, precede o da incompetência. Não se pode fazer de conta que não houve suspeição se outro processo já demonstra isso de forma cabal”, afirmou.
Conforme artigo 92 do Código de Processo Penal, "a exceção de suspeição precederá qualquer outra, salvo motivo superveniente."
"Isso significa dizer que a incompetência do juízo é uma exceção de nulidade. A suspeição do juiz é outra. Todas elas anulam as ações em curso, com consequências distintas. Mas, o que se analisa primeiro, sobre todas as outras, é a suspeição. É um erro muito grande dizer que uma decisão em um debate de incompetência vai anular o debate da suspeição", explica Tânia Maria de Oliveira, da coordenação executiva da ABJD.
Se for considerada a anterioridade de pauta, também não há razões para anulação da decisão sobre a parcialidade de Moro. Afinal, a defesa de Lula ajuizou o HC de suspeição em novembro de 2018, quando Moro aceitou assumir o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro. Houve um pedido de vistas de Gilmar Mendes, em dezembro daquele ano, e Fachin só devolveu a pauta ao Supremo um ano e meio depois.
"Ou seja, o habeas corpus de suspeição já estava sendo discutido. É uma aberração regimental extinguir esse processo, que já estava sendo julgada", acrescenta Oliveira. "Sem contar o absurdo que é uma decisão de plenário anular a decisão proferida por uma das turmas."
Isso impacta na elegibilidade de Lula?
Mesmo que a suspeição de Moro seja anulada, Lula continua elegível. A única possibilidade de impedir sua candidatura à Presidência em 2022 seria a tramitação de uma ação penal em tempo recorde fora de Curitiba – considerada improvável.
Conforme a Lei da Ficha Limpa, sancionada pelo próprio Lula em junho de 2010, políticos condenados em decisões colegiadas de segunda instância não podem se candidatar. Foi o que aconteceu com o petista, em 2018, após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmar condenação no caso triplex.
O reconhecimento da parcialidade de Moro é relevante, no entanto, por ao menos dois motivos. O primeiro é que, mantida a suspeição, o magistrado que assumir cada ação contra Lula terá dificuldade ao aproveitar qualquer ato processual de Moro, mesmo que na fase inicial, de instrução. Ou seja, os processos precisarão começar do zero.
A segunda razão diz respeito à responsabilização dos agentes da Lava Jato pela perseguição ao ex-presidente. A decisão do STF pode ser usada em processos contra Moro e Dallagnol, por exemplo, e impacta na forma como a história da operação será contada nos próximos anos.
O jurista Pedro Serrano, doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), enfatiza a importância dessa decisão.
“A única decisão capaz de ‘reumanizar’ Lula integralmente é estender a decisão da 2ª Turma [suspeição] aos demais processos em que Moro atuou, para que ele seja definitivamente considerado um juiz parcial em relação a Lula”, avaliou o jurista, em entrevista ao Brasil de Fato.
“O que a decisão de Fachin tem de bom é que ele volta a ser elegível, mas isso é insuficiente. Precisamos resgatar a humanidade de Lula. Não por ele, mas porque, se isso acontece com ele, pode acontecer com cada um de nós”, acrescentou.
A meta número 1 de Fachin, segundo a análise de Serrano, é evitar a candidatura de Lula em 2022.
“A segunda finalidade dele, caso não consiga a primeira, é pelo menos salvar a narrativa da Lava Jato. Ou seja, não haver o reconhecimento do sistema de justiça de que o que houve com o ex-presidente foi uma fraude, e não um processo penal”, interpreta o jurista.
Como a suspeição diz respeito a um juiz e um réu, especificamente, a manutenção da decisão da 2ª Turma não significa que outros condenados no âmbito da Lava Jato serão inocentados.
Outro desdobramento da decisão do dia 8 que está pendente é o destino das quatro ações contra o ex-presidente. Fachin remeteu os processos para serem sorteados em duas varas no Distrito Federal, mas esse encaminhamento não é unânime no plenário. Ao menos um ministro, Alexandre de Moraes, expressou discordância, abrindo possibilidade para transferir as ações a São Paulo. A decisão deve ser confirmada pelo STF nas próximas semanas.
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