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    PF aperta o cerco contra financiadores do garimpo ilegal em território ianomâmi

    Invasão por garimpeiros ao território indígena causou a morte de quase 600 crianças e deflagrou a maior crise humanitária e sanitária que se tem notícia no País

    Garimpos ilegais começam a ser removidos (Foto: Reprodução)

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    Leanderson Lima, Amazônia Real -  Uma apreensão de 4 milhões de reais ocorrido há 4 anos resultou, só agora, em mais uma operação para combater o comércio ilegal de ouro na Terra Indígena Yanomami (TIY). Nesta terça-feira (14), a Polícia Federal (PF) cumpriu 13 mandados de busca e apreensão como parte da operação Avis Aurea. Pelas investigações, uma organização criminosa com ramificações em três Estados (Roraima, São Paulo e Goiás) realizou movimentações financeiras de 420 milhões de reais em cinco anos.

    Em abril de 2019, já sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), a PF fez a apreensão dos 4 milhões de reais, em espécie, em um carro que trafegava no município mato-grossense de Cáceres (cidade a 217 quilômetros de Cuiabá). No curso das investigações, a PF descobriu que o dinheiro usado para a compra de ouro saía das regiões Sudeste e Centro-Oeste, por via terrestre, em viagens que duravam até mais de uma semana. Depois do pagamento, a organização criminosa tratava de retirar o ouro ilegal de Roraima por via aérea e, para isso, contava até mesmo com o apoio de um funcionário de uma companhia aérea.

    Uma das empresas suspeitas de participar do esquema de financiadores do garimpo já havia sido arrolada em outra ação da PF, que apreendeu nada menos do que 111 quilos de ouro dentro de um avião, na capital Goiânia. Nessa mesma cidade goiana, está um dos alvos da operação Avis Aurea. A RJR Minas Export, fundada em 2016, pertence a Bruno Cezar Cecchini, presidente da Confederação Nacional de Mineração (CNMI).  O empresário foi indiciado junto a mais 14 pessoas físicas e jurídicas, pela PF de Goiás, em abril do ano passado, por suspeita de chefiar uma organização criminosa responsável por exportar ouro ilegal do Brasil para a Europa, conforme noticiou a Agência Pública.

    Outras empresas investigadas são ADV dos Santos, Pacheco FH Ltda, Da Silva e Cia Ltda, Akyllas (A. J. Almeida Souza Eirelli), Goyaz Gold Comércio e Exportação de Minério, Pereira Comercial, Pellegrini da Silva e Soares Silva Ltda, João Maciel Duarte Vieira, João Felipe da Costa Filho e ESN Arquitetura Ltda. A operação desta terça-feira mirou também em empresários, advogados e até um servidor público.

    Entre os alvos dos mandados de busca e apreensão estavam Robson Barradas de Souza, Anderson Galego da Luz, Ronaldo Alcoforado dos Santos, Lucan Pereira de Lima, Carlos Alberto Diegues, Marcus Paulo Moura Fortuna, Cleuvio Esdras Castro Queiroz, Cezar Chamma, Felipe Mendes Barbosa, Vilkson Cristian Moraes de Almeida, Arlan Douglas Vieira dos Santos, João de Deus Pereira Barros, Ana Paula Gibim de Freitas e Ammar Alshikh Mohamad. As ordens foram expedidas pela 4ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal em Roraima.

    A Amazônia Real tenta contato com os envolvidos desde que seus nomes foram divulgados pela PF e já se coloca à disposição para suas devidas manifestações.

    Quem é quem?

    O empresário Robson Barradas de Souza é sócio da Joalheria Paulista, que funciona em São Paulo, na Praça da Sé. A empresa começou a funcionar em 19 de março de 1996, e é uma das mais tradicionais da capital paulista. Já Ronaldo Alcoforado dos Santos é servidor público e sócio na ITR – Indústria de Transformadores de Roraima Ltda. A empresa está ativa desde 22 de julho de 2011.

    Quem também é investigado pela PF é Carlos Alberto Diegues, o Carlinhos Português, considerado um dos maiores receptadores do Brasil. Ele chegou a ser preso, em maio de 2017, durante a quarta etapa da operação Condominus, comandada por policiais da Delegacia de Repressão a Roubos e Furtos (DRF), do Distrito Federal.

    Na época, ele foi preso em sua casa, no Guarujá, onde a polícia encontrou 133.506 reais, 10.049 dólares e aproximadamente 100 mil dólares em jóias roubadas – informação à época dada pelo próprio Carlinhos, no momento da prisão. O empresário Arlan Douglas Vieira dos Santos, sócio da empresa Ronaldo Camarão, em Boa Vista, também é investigado pela PF.

     A Goyaz Gold Comércio e Exportação de Minério também é alvo da investigação. A empresa já foi “baixada”, mas tinha como um dos sócios Andre Felipe Picone Rosa, que é investigado no âmbito da operação “Terra Arrasada”, operação deflagrada pela PF, em 2021, para investigar a retirada ilegal de ouro do território indígena Kayapó, no sul do Pará.

     Cerco à cadeia ilegal

    A nova operação ocorreu quatro dias depois de a PF deflagrar a Operação BAL, que teve como um dos alvos a irmã do governador Antonio Denarium (PP), Vanda Garcia de Almeida. A operação BAL investiga lavagem de dinheiro, um esquema que teria movimentado 64 milhões de reais, nos últimos dois anos. O dinheiro também seria fruto do comércio do garimpo ilegal na TIY.

    Além da irmã de Denarium, outro membro de sua família foi alvo da PF. Na sexta (10), a casa de Fabrício de Souza Almeida, sobrinho do governador que faz parte da tropa de choque pró-garimpo, foi alvo da operação BAL. Na casa dele os agentes federais encontraram dez armas, entre fuzis, rifles e pistoladas de uso restrito. O armamento não foi apreendido porque Almeida é um CAC, isto é, ele possui um certificado de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador. Segundo a PF, os parentes do governador podem estar envolvidos em um esquema de lavagem de dinheiro no comércio da cassiterita, minério de estanho usado nas indústrias de eletroeletrônicos, informática e embalagens para alimentos.

    Terra saqueada 

    A TIY tem 9,4 milhões de hectares, entre os estados do Amazonas e Roraima, com limites na fronteira com a Venezuela. Segundo a Hutukara Associação Yanomami (HAY), presidida por Davi Kopenawa, no território vivem 33 mil indígenas. O garimpo de ouro e cassiterita (estanho) degradou, conforme estudo da plataforma Mapbiomas, 1.556 hectares de florestas e rios no território Yanomami, em 2021. A Hutukara estima que a destruição atingiu um total de 3.272 hectares no mesmo ano.

    Em 2019, com o incentivo dos governos de Bolsonaro (PL) e Denarium à mineração, garimpeiros ilegais voltaram a fazer uma nova corrida do ouro. O cenário de degradação e ameaças aos povos Yanomami foram mostrados pela série Ouro do Sangue Yanomami produzida pela Amazônia Real. Durante as eleições de 2022, Luiz Inácio Lula da Silva prometeu retirar os invasores e demarcar todos os territórios do país. 

    Eleito, Lula iniciou o combate à invasão da TIY a partir do dia 21 de janeiro. Antes, ele decretou emergência em saúde pública no território e instituiu o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária, que prevê ações de saúde e envio de alimentação aos indígenas, em um prazo de 45 dias. A invasão por garimpeiros ao território indígena causou a morte de quase 600 crianças e deflagrou a maior crise humanitária e sanitária que se tem notícia no País. 

    O líder Davi Kopenawa Yanomami pediu a retirada dos garimpeiros do território e denunciou que 99 crianças morreram de desnutrição extrema e malária, em 2022. Ele responsabilizou o ex-presidente Bolsonaro pela calamidade no território. Em Nova York, onde esteve este mês para denunciar a situação crise humanitária na sede da Organização das Nações Unidas, o grande líder afirmou que “o povo Yanomami não pode sofrer. São seres humanos. Eles sabem falar, sabem lutar, sabem cuidar do seu lugar, sabem defender os seus direitos, sabem defender a sua língua, seus costumes, então é por isso que é muito importante vocês ficarem de olho no meu povo, que está protegendo a Amazônia”.

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