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Suposto efeito de remédio não exime Bolsonaro da culpa por postagem golpista, dizem juristas

Investigado como mentor intelectual do terrorismo de 8 de janeiro, Bolsonaro disse à PF ter feito post atacando as urnas eletrônicas por estar sob efeito de morfina

Jair Bolsonaro (Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)

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247 - Investigado como possível mentor intelectual dos atentados terroristas de 8 de janeiro, Jair Bolsonaro (PL) prestou depoimento à Polícia Federal nesta semana para explicar a postagem que fez no dia 10 atacando as urnas eletrônicas. Investigadores acreditam que a publicação o vincula aos atos golpistas, uma vez que o post foi considerado um sinal de que ele poderia ter encorajado a invasão dos prédios dos Três Poderes da República. 

Para justificar a postagem, Bolsonaro afirmou ter passado por uma cirurgia dias antes e disse que estava sob efeito de morfina quando ‘equivocadamente’ jogou o material em sua página no Facebook. No entanto, o artigo 28 do Código Penal diz que não "excluem a imputabilidade penal a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos." Para cinco especialistas ouvidos por Malu Gaspar, do jornal O Globo, o artigo em questão é um conceito básico do Direito Penal. Sendo assim, certamente o argumento de Bolsonaro será contestado pela Polícia Federal.

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"Eu trabalho na área criminal há 24 anos e esse me parece um argumento até pueril. Alegar embriaguez ou uso de drogas não é suficiente para afastar a responsabilidade criminal", diz a criminalista Helena Lobo Costa, professora de Direito Penal na Universidade de São Paulo.

"Se você tem uma confusão mental em decorrência de alguma substância ou remédio que tomou eventualmente, sem conhecimento de seus efeitos, pode-se até recorrer a esse argumento. Mas quando se está tomando uma substância que sabidamente altera o estado mental ou capacidade de autocontrole, não pode alegar inimputabilidade", explica o criminalista Pierpaolo Bottini.

A posição da defesa de Bolsonaro evidencia que a estratégia é usar o argumento da confusão mental para afastar o dolo - quando fica provado que a pessoa teve a intenção de cometer um crime -, explica Bottini. "O que parece é que eles sabem que não podem alegar que o ex-presidente perdeu o autocontrole por causa da morfina, ou que não sabia do que se tratava quando postou aquele conteúdo. O argumento deve ser o que de Bolsonaro se equivocou e postou no lugar errado, ou seja, sem a intenção de disseminar o conteúdo golpista”.

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Para Helena Lobo, ainda sim a tese não se sustenta. "É verdade que o equívoco afasta a responsabilidade em várias situações. Apagar o post poderia indicar que houve equívoco, mas não estamos falando de um fato corriqueiro. O que houve em 8 de janeiro foi um ataque aos poderes, uma depredação generalizada, e o autor do post é ex-presidente da República. Se fosse mesmo um equívoco, uma postagem com a qual ele não concordasse, teria que ter gerado uma retratação ou um outro post se manifestando contra os ataques de forma contundente."

"Não vejo como prosperar a alegação de inimputabilidade. Do ponto de vista jurídico sequer há uma prova a sustentar essa alegação e, ainda que haja um medicamento envolvido, o quadro não se altera. A alegação parece até pueril", avalia o advogado criminalista Celso Vilardi, professor da FGV São Paulo.

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A advogada criminalista Raquel Scalcon, também professora da FGV São Paulo, diz ser necessário confirmar se Bolsonaro estava mesmo medicado com morfina e verificar o quanto o medicamento poderia afetar sua lucidez. "Por tudo isso, a tese é pouco verossímil, especialmente porque será muito difícil confirmar que houve afetação de sua compreensão a tal ponto de haver isenção de sua responsabilidade penal".

Para o advogado criminalista Thiago Turbay, há ainda outro problema na tese dos advogados de Bolsonaro: "não há provas de que ele teve dificuldade de acesso à plataforma de envio de mensagens, de que apresentou dificuldades de escrita ou alteração substancial de percepção quanto à apreensão da realidade”.

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