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    Supremo tem 4 votos a 1 pela validade da atuação policialesca das guardas municipais

    STF analisa os limites da atuação das guardas municipais

    Guardas municipais (Foto: Reprodução)

    Por Tiago Angelo (Conjur) - O Plenário do Supremo Tribunal Federal voltou a discutir nesta quinta-feira (12/12) os limites da atuação legislativa para disciplinar as atribuições das guardas municipais. O caso tem repercussão geral (Tema 656).

    O tema começou a ser analisado em outubro e foi retomado nesta quinta. Há duas correntes formadas: a do ministro Luiz Fux, relator da matéria, votou no sentido de que é constitucional atribuir às guardas o “exercício do policiamento preventivo e comunitário diante de condutas potencialmente lesivas a bens, serviços e instalações do município”.

    Na prática, o voto de Fux permite, por exemplo, buscas pessoais, atividade ostensiva cumprida por policiais militares. E também permite a validação de provas obtidas em atuações desse tipo. O relator foi seguido pelos ministros Dias Toffoli, Flávio Dino e André Mendonça.

    A outra corrente foi inaugurada pelo ministro Cristiano Zanin. Para ele, as guardas não têm atribuições ostensivas, nem investigativas.

    Voto do relator

    Segundo Fux, se a Constituição não prevê uma escolha categórica para a forma de atuação das guardas municipais, estabelecendo apenas “balizas norteadoras”, não cabe ao Judiciário decidir o tema de forma muito restritiva.

    “Descabe a conclusão pela existência de uma decisão constitucional apriorística pela qual o município deverá necessariamente ordenar a proteção de seu patrimônio”, afirmou o relator.

    Para ele, a possibilidade “de atribuição de policiamento preventivo comunitário às guardas municipais deve ser vista como um importante instrumento federativo à disposição dos municípios no combate à insegurança”.

    Ele propôs a fixação da seguinte tese de repercussão geral:

    É constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício das atribuições do policiamento preventivo e comunitário diante de condutas potencialmente lesivas aos bens serviços e instalação dos entes municipais, em cooperação com os demais órgãos de segurança pública no âmbito de suas respectivas competências.

    Ao acompanhar Fux nesta quinta, Dino afirmou que o Supremo já reconheceu que as guardas têm poder de polícia. “O que é patrulhamento? Manifestação, externalização do poder de polícia. O Supremo já disse que as guardas têm poder de polícia.”

    Para ele, as guardas não têm atribuições investigativas. No entanto, é “necessário e desejável” que façam segurança ostensiva. “Não adianta dizermos que uma viatura da guarda municipal que está em uma praça não pode fazer uma prisão em flagrante. Claro que pode. É o exercício de um poder dever.”

    Divergência

    Zanin divergiu. Para ele, embora o STF tenha reconhecido que as guardas integram o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), isso não significa igualar sua atuação à das Polícias Civil e Militar. De acordo com o ministro, no caso das guardas, só há atuação ostensiva quanto à proteção de bens, serviços e instalações, e não no que diz respeito ao combate à criminalidade em geral.

    “Não podemos eximir a PM, que tem o papel do policiamento ostensivo, de fazer essa diligência. Se há um problema de falta de efetivo, temos de resolver dentro do que a Constituição prevê, e não dando aos guardas uma atribuição que a Constituição não dá.”

    Segundo Zanin, guardas podem atuar em casos de flagrante, efetuando prisões, desde que preenchidos os requisitos legais. No entanto, não podem fazer buscas pessoais ou atuar de forma investigativa com base em denúncias anônimas, por exemplo, em casos como denúncias de tráfico ou demais crimes. Para o ministro, as guardas municipais têm papel de polícia sui generis, que deve ficar limitado à proteção de bens, serviços ou instalações dos municípios, na forma prevista no artigo 144, §8º, da Constituição Federal.

    “A atribuição constitucional e legal das guardas não abrange atividades investigativas e repressivas de persecução penal próprias das polícias judiciárias como a Polícia Civil e a Polícia Federal.”

    Para ele, só há atribuição preventiva das guardas no que se refere a bens, serviços e instalações dos municípios, “o que abrange busca pessoal em caso de crime contra o patrimônio, mas não para investigar ou identificar se há o porte de uma substância entorpecente”.

    O ministro já havia votado nesse sentido em julgamento da 1ª Turma do Supremo. Na ocasião, ele afirmou que guardas municipais não têm o “poder irrestrito” de policiamento ostensivo e investigativo, mas o de salvaguardar o patrimônio público.

    Segurança pública

    O caso chegou à corte em 2010, após a Câmara Municipal de São Paulo ajuizar recurso contra decisão do Tribunal de Justiça paulista que declarou inconstitucional o artigo 1º, inciso I, da Lei 13.866/04. O dispositivo atribuía à Guarda Civil Metropolitana o dever de fazer “policiamento preventivo e comunitário”.

    O trecho havia sido impugnado em uma ação direta de inconstitucionalidade. Ela foi apresentada com a alegação de que a Câmara atribuiu funções de polícia à guarda e, portanto, extrapolou o artigo 147 da Constituição paulista.

    O dispositivo espelha o artigo 144, parágrafo 8º, da Constituição Federal, segundo o qual “os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”.

    Para o Legislativo paulistano, no entanto, o trecho impugnado era constitucional, uma vez que trataria de atribuição relativa à proteção de bens, serviços e instalações municipais, e não à segurança pública.

    “A existência de conflitos entre cidadãos em logradouros e prédios públicos poderia ocasionar danos ao patrimônio do município, justificando a intervenção da guarda correspondente”, argumentou a Câmara no recurso.

    O ministro aposentado Eros Grau havia negado seguimento ao recurso, mas o ministro Luiz Fux, que assumiu a relatoria do caso em 2011, reconsiderou a questão. Ele entendeu ser necessário que o STF “defina parâmetros objetivos e seguros que possam nortear o legislador local quando da edição das competências de suas guardas municipais”.

    Atribuições em pauta

    As atribuições das guardas municipais têm se tornado tema recorrente de julgados no STF e também no Superior Tribunal de Justiça, em especial nos casos que tratam da validade de provas obtidas por esses agentes em casos de tráfico de drogas. O fenômeno se insere em um contexto de expansão das guardas ante o encolhimento das polícias.

    Desde 2022, o STJ vinha estabelecendo uma série de limites à atuação das guardas. No entanto, conforme mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a corte passou a revisar sua jurisprudência em função de uma tendência do STF de validar ações de policiamento ostensivo pelos guardas municipais.

    Em outubro, a 1ª Turma do Supremo considerou, por maioria, válidas as provas obtidas por guardas municipais em uma busca domiciliar. No caso concreto, o acusado teria dispensado entorpecentes embalados ao avistar os agentes municipais, que, posteriormente, foram à residência do suspeito e encontraram o material ilícito.

    Ainda na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou para cassar um acórdão da 5ª Turma do STJ que absolvia o suspeito. Para ele, a guarda atuou legalmente ao efetuar a prisão em flagrante, uma vez que o tráfico de entorpecentes é crime permanente e, portanto, aquele que o comete continua em estado de flagrância.

    Em junho de 2022, no entanto, também em decisão da 1ª Turma, o STF optara por restabelecer acórdão do TJ-SP que absolveu um suspeito de tráfico. Ele havia sido preso em flagrante por guardas municipais.

    Na ocasião, a guarda o abordou por causa de uma denúncia anônima, mas não encontrou nada ilícito em busca pessoal. Em seguida, os agentes foram a um terreno baldio que o suspeito teria ocupado, onde acharam drogas atribuídas a ele.

    Também relator do caso, Alexandre entendeu à época que o flagrante foi legal. Já o ministro Luís Roberto Barroso, que proferiu o voto-vista vencedor, julgou que a prisão ultrapassou o limite do flagrante delito, que autorizaria a atuação de qualquer pessoa, e exigiu diligências investigativas, o que foge da competência constitucional dos agentes.

    Jurisprudência do STF

    No período entre as duas decisões divergentes, em 2023, o Plenário do STF decidiu, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 995, que as guardas municipais integram o Sistema de Segurança Pública.

    Porém, para o ministro Edson Fachin, o reconhecimento das guardas como integrantes do Susp não as autoriza a exceder sua competência, em consonância com o entendimento de especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

    Já em decisão monocrática mais recente, o ministro Flávio Dino entendeu ter sido legal a busca pessoal feita pela guarda contra um suspeito de roubo, por haver fundadas razões para isso.

    Na ocasião, o magistrado cassou acórdão da 6ª Turma do STJ que absolveu o suspeito ao ver ilegalidade na busca. “Fica evidente a incongruência do ato reclamado com a ADPF 995, pois teríamos um órgão de segurança pública de mãos atadas para atender aos cidadãos na justa concretização do direito fundamental à segurança”, disse Dino.

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