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    Terra Livre: indígenas articulam agenda com Lula para esta semana, apontam avanços e seguem cobrando demarcações

    Lideranças ligadas ao Acampamento Terra Livre (ATL) 2024 deram a largada da 20ª edição do evento nesta segunda (22) em meio a um clima de cobranças

    (Foto: Marcelo Camargo Agência Brasil)

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    Brasil de Fato - Lideranças ligadas ao Acampamento Terra Livre (ATL) 2024 deram a largada da 20ª edição do evento nesta segunda (22) em meio a um clima de cobranças em relação ao governo federal. Maior evento de congregação e articulação política do segmento no país, o ATL foi preparado para receber este ano um público de 6 mil a 8 mil participantes e virou palco para um novo capítulo de pressão para que a gestão Lula acelere o processo de reconhecimento e demarcação de terras.

    Entre as tarefas do evento, os organizadores buscam uma agenda com o presidente da República para esta semana para tratar da pauta do ATL. A ideia é que uma comitiva de indígenas seja recebida pelo petista no Palácio do Planalto, em vez de se promover um encontro com a ida de Lula ao acampamento, como ocorreu em 2022 e 2023. O Brasil de Fato apurou que a Apib mudou a estratégia este ano por entender que seria politicamente mais vantajoso pressionar o presidente diretamente no Palácio e, de preferência, na presença de ministros que escutem os pleitos das lideranças em uma mesa de negociação. Nos bastidores, a avaliação é de que um novo convite para a ida do petista ao encontro das delegações exigiria uma grande operação de segurança que acabaria por inviabilizar parte da programação do evento e teria menor potencial de trazer avanços políticos.

    Interlocutores de Lula tentam costurar um encontro para quinta-feira (24), mas ainda sem confirmação. Outras agendas paralelas também estão em fase de articulação, principalmente com nomes da Esplanada dos Ministérios. Na segunda (22), uma comitiva de lideranças do ATL foi recebida nos Ministérios do Meio Ambiente (MMA) e do Desenvolvimento Social (MDS). Outras pastas devem recebê-los ao longo da semana, mas, enquanto esses encontros não chegam, as lideranças e delegações seguem se mobilizando in loco no espaço do acampamento.

    A indígena Rosineide Saripun Kaxuyana, do território Wayamu, no norte do Pará, ergueu uma faixa logo no início da área do ATL para chamar a atenção para o caso da comunidade, que enviou quase 50 representantes a Brasília (DF) esta semana para engrossarem o coro dos protestos pró-demarcações. “Faz anos que a gente está lutando, mas até agora o nosso território ainda não é demarcado. Espero que saia mais rápido porque a gente precisa que o nosso território seja demarcado porque os invasores estão lá, de olho no nosso território. Isso é um perigo pra gente. É triste pra gente.”

    Um dos casos mais emblemáticos que figuram entre os discursos políticos no ATL é o da Terra Indígena (TI) Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, uma das quatro que estavam previstas para serem homologadas pelo presidente Lula (PT) na última quinta-feira (18), mas que tiveram o despacho adiado porque, segundo o presidente, governadores dos estados onde se localizam essas áreas pediram mais tempo para negociação.

    A postura aborreceu os moradores. Segundo a cacica Cal Potiguara, quase 9 mil pessoas de cinco aldeias da TI aguardam “com muita expectativa” pela assinatura do petista para que o terreno seja finalmente formalizado como pertencente às comunidades. A área estava entre as 14 que o governo havia prometido que demarcaria no primeiro ano de gestão – apenas oito foram de fato oficializadas ano passado, apesar disso.

     “Foi frustrante a gente, mais uma vez, ser retirado de pauta, mas a gente vai cobrar para que não caia no esquecimento e a gente espere mais um ano. Qualifico o governo como se ainda faltasse força de vontade para concluir as demarcações dos territórios porque o grande problema de todos os governos é iniciar e não concluir os processos de demarcação. Acho que o governo ainda deixa muito a desejar. Pode ser que as pessoas pensem que a gente está muito bem assistido por conta do Ministério dos Povos Indígenas [MPI] e outras instituições que estamos ocupando, mas até que ponto estamos ganhando mesmo com isso?”, questiona.

    A lista das 14 áreas prometidas inclui territórios que não tinham mais impedimento jurídico para serem homologados nem ficam comprometidos pelo avanço da tese do marco temporal, que acabou sendo aprovada pelo Congresso Nacional no último ano e criou embaraços para a agenda do segmento. Ao olhar para o cenário da relação atual com o governo Lula, Dinaman Tuxá, da coordenação-executiva da Articulação Nacional dos Povos Indígenas (Apib), diz que a entidade se vê diante de múltiplas sensações.

    “É um mix de sentimentos. Em alguns momentos traz felicidade, em outros traz frustrações e em outros traz decepções. É uma grande mistura de sentimentos.” O dirigente diz que há um contexto de “revolta” diante do fato de já terem se passado “mais de 470 dias” sem que a gestão cumprisse a meta das 14 áreas prometidas para 2023. “É isso que traz um descontentamento, pois são áreas que foram apontadas ainda no governo de transição pela Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas] como locais que estavam aptos a terem a documentação assinada, então, a questão é só de dificuldade política. Problema jurídico não há mais”, acrescenta.

    Empecilhos

    Tuxá assinala que há um conjunto de fatores que concorrem para embarreirar o processo de demarcação das mais de 200 áreas que aguardam esse reconhecimento no país. Além da força da bancada ruralista, histórica opositora do movimento indígena, e da pressão ostensiva dos governadores na disputa por algumas áreas locais, a diversificada composição da frente ampla que dá sustentação ao governo federal tem se mostrado um empecilho de peso à agenda política.

    “A questão da governabilidade é um problema. É um governo de composição, de coalização. Sabemos que os direitos dos povos indígenas colidem com os interesses de muitos estados, governadores, tendo em vista que são terras que vão sair [do alcance] do mercado porque serão entregues a quem é de direito, mas são terras de direitos originários”, argumenta. O dirigente considera que, para além da homologação final, outros trâmites mais simples também têm ocorrido com lentidão no governo.

    “Independentemente da assinatura final, tem atos administrativos que podem ser acelerados nas instâncias do poder administrativo – Funai, MPI e Ministério da Justiça. Há também uma morosidade em outras políticas que nós achávamos que seriam mais céleres, principalmente de proteção territorial, que vão trazer segurança pros povos indígenas. Temos visto, em alguns casos, alguns avanços, mas eles ainda ficam a desejar em relação ao que a gente esperava.”

    Tuxá diz ainda que o segmento reconhece a existência de dificuldades estruturais na efetivação de políticas para a população indígena. “O Brasil passou por um processo de desmonte, e isso nós colocamos na mesa [de negociação]. Nós sabemos que o desmonte trazido pelo governo Bolsonaro requer tempo [para a reconstrução do país], mas esse tempo também não pode ser eterno. O governo é de quatro anos, então, o que for possível fazer avançar nesses quatro anos a gente quer que aconteça. Vamos cobrar pra que ele avance não só nas demarcações, mas no fortalecimento do MPI, da Funai, da Sesai [Secretaria de Saúde Indígena] e de todas as políticas voltadas para os nossos povos.”

    Pontos positivos

    A Apib avalia que este primeiro capítulo de um ano e quatro meses de governo também teve avanços. A abertura de diálogo é apontada como o principal deles. “O tratamento hoje é diferente. O governo Lula enxerga a gente como sujeitos de direitos, enquanto o Bolsonaro não enxergava os indígenas nem como gente. Então, bem ou mal, sabemos que o governo atual tem um trato diferente com os nossos assuntos, mas, como é um governo de coalizão, ele acaba cedendo em algumas situações que afetam diretamente a nossa vida”, diz Tuxá.

    Segundo ele, a entidade avalia que houve melhora também na gestão da crise humanitária que atinge a população Yanomami, em Roraima, desde o período do governo Bolsonaro. “Teve uma certa dificuldade do próprio governo, que inicialmente não estava se entendendo internamente, especialmente com as Forças Armadas. Acredito que eles estejam agora no caminho certo, mas vamos continuar monitorando e cobrando. Para aquilo que estiver funcionando, continuaremos apoiando. Para aquilo que não estiver, continuaremos cobrando”.

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