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    Jeferson Tenório: podemos até falar de literatura negra, mas não como algo menor

    Vencedor do Jabuti 2021 como melhor romance, escritor refletiu sobre o racismo na literatura e defendeu políticas de incentivo à leitura

    Jeferson Tenório (Foto: Carlos Macedo/Divulgação)
    Guilherme Levorato avatar
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    Opera Mundi - No programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta sexta-feira (25/02), o jornalista Breno Altman entrevistou o autor de Avesso da Pele (Companhia das Letras), obra vencedora do Prêmio Jabuti 2021 de Melhor Romance, Jeferson Tenório.

    Seu romance aborda, a partir das relações humanas, o tema do racismo, mesmo este não sendo o fio condutor da narrativa, o que faz com que seja enquadrado por muitos no que é considerado literatura negra. Tenório confessou não gostar muito do termo.

    “Você pode falar em literatura branca no Brasil? Quando a gente faz a pergunta sobre a existência de uma literatura negra ou indígena, a gente coloca no centro uma literatura produzida por pessoas brancas em que tudo o que difere parece outra coisa. A gente até pode falar em literatura negra, mas não como algo menor, ou recente, ou sem as mesmas qualidades, ainda que essa seja a comparação que se faz”, argumentou.

    Além disso, essa classificação, utilizada apenas recentemente, faz parecer que o racismo é um tema novo na literatura, alertou o autor que, "por mais que nos últimos anos tenha tido mais visibilidade”, é uma “temática que sempre esteve presente nos autores negros”, citando como exemplos Lima Barreto, Machado de Assis e Carolina de Jesus.

    “A diferença é que antes essas produções, às vezes ligadas a denúncias sociais como o caso de Carolina de Jesus, não eram vistas como literatura. Com o passar do tempo perceberam que ela estava sim fazendo literatura. Então falar de literatura negra depende do contexto. Se eu estou num ambiente racista, hostil, vou ressaltá-la como literatura negra sim. Em outros contextos em que a situação já está posta, de segurança, não é necessário ressaltar esse aspecto”, ponderou.

    Para ele, isso acontece porque, diferentemente do que ocorreu em países como os Estados Unidos em que houve uma luta pela construção de uma cultura negra em geral, no Brasil reinava o mito da democracia racial.

    “Primeiro que o pós-escravidão nos EUA levou a uma restituição financeira da população caminhando para uma organização mais consistente do que teve no Brasil. Segundo, a questão do racismo nos EUA opera de uma forma muito mais aberta, há uma segregação formal e institucionalizada que leva a uma luta. Aqui não, aqui há uma negação do racismo e quando você não tem as coisas clara, a possibilidade de organização é mais difícil, você desestimula a literatura negra e ficamos sem entender os mecanismos do racismo. É uma democracia racial que continua operando”, explicou.

    Incentivo à leitura

    Tenório foi professor durante muito tempo da rede pública e, posteriormente, da rede privada. Ele refletiu sobre políticas públicas para incentivar o hábito da leitura nas pessoas desde a juventude.

    “Estive muitos anos na escola pública e vi muita coisa triste. Claro que a gente tem que pensar na questão cultural e é um erro achar que quando as coisas apertam o primeiro a tirar é a cultura, mas, para ter uma população mais leitora, primeiro é necessário resolver os problemas básicos: dar emprego, moradia e comida para que a pessoa possa olhar em volta e achar um livro algo legal. Acho tão cruel chegar na comunidade e dizer que as pessoas têm que ler Machado de Assis que vai mudar a vida delas. Essas pessoas estão preocupadas com outras coisas, com o que vão comer, com o que vão vestir”, defendeu.

    Atendidas as questões básicas, ele detalhou a necessidade de uma ação política conjunta dos governos municipais, estaduais e federal de incentivo à leitura a partir da implementação de bibliotecas comunitárias, criação de diferentes tipos de eventos por parte das livrarias para diferentes públicos e incentivos para baratear o preço dos livros “embora eu não ache que o livro seja caro, nós é que perdemos o poder aquisitivo de comprar livros”.

    O escritor ainda enfatizou o incentivo a produções consideradas marginais, como os slams e o rap, que podem servir como portas de entrada para a literatura e políticas unificadas entre as escolas, pois “há iniciativas individuais que são muito bem executadas, mas isso não é suficiente”.

    Já no que diz respeito à formação de novos escritores, ele destacou as redes sociais como sendo importantes ferramentas: “Já tem uma abertura maior e já conseguimos ver novos autores emergindo. As plataformas digitais ajudaram bastante. Você pode escrever um parágrafo e se viralizar, todo o mundo vai saber quem você é. A publicação também está mais fácil, mas a dificuldade ainda é de passar na peneira da legitimação. Tem muita gente produzindo, mas falta isso chegar na mídia, ser conhecido”.

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