Unesco exibe em Paris mostra com imersão nas famílias linguísticas dos povos originários do Brasil
Cerca de 50 profissionais indígenas participam do projeto
Patrícia Moribe, em Paris (RFI) - Concebida pelo Museu da Língua Portuguesa, de São Paulo, “Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação” chega agora em forma itinerante à sede da Unesco, em Paris. A mostra propõe uma imersão na floresta de famílias linguísticas às quais pertencem as línguas faladas hoje pelos povos indígenas no Brasil.
O título da exposição, explica o site do Museu da Língua Portuguesa, vem da língua Guarani Mbya: "nhe’ẽ" significa espírito, sopro, vida, palavra, fala; e "porã" quer dizer belo, bom. Juntos, os dois vocábulos significam “belas palavras”, “boas palavras” – ou seja, palavras sagradas que dão vida à experiência humana na terra.
“Nós estamos trazendo uma pequena amostra dessa primeira exposição do Museu da Língua Portuguesa sobre Línguas Indígenas, que faz parte da Década Internacional das Línguas Indígenas, lançada pela Unesco”, explica a curadora e artista Daiara Tukano.
Cerca de 50 profissionais indígenas participam do projeto. “É uma exposição que mostra a diversidade das línguas indígenas do Brasil, mas também a resistência de nossos povos, de nossas culturas”, acrescenta a ativista.
As obras ocupam o saguão principal da Unesco e trazem uma instalação de pássaros e seus cantos, misturados às silhuetas das florestas – que representam as famílias linguísticas.
“Quando eu era criança, ouvia falar dos troncos linguísticos e para mim, tronco era uma árvore. Então a gente desenhou cada família linguística na silhueta de árvores. E no meio dessas árvores estão pássaros importantes para muitos de nossos povos, que são pássaros sagrados e que são os pássaros que nos ensinam a falar e a cantar", conta Daiara. "Nosso conhecimento, nossa linguagem, vem da própria natureza. E dessa floresta nasce um rio, que vai atravessando toda a exposição, trazendo uma linha do tempo e das histórias de contato e resistência e construção das mensagens dos povos indígenas para a conquista de nossos direitos constitucionais, a luta do reconhecimento dos nossos territórios até a contemporaneidade.”
“Não somos lenda”
“Hoje nós temos 275 línguas vivas faladas no Brasil, de vários troncos linguísticos, como tronco Jê, o macro Jê, o tupi, tupi guarani, entre outros”, explica Thaline Karajá, que se apresentou na abertura da exposição na Unesco.
“É de extrema importância que haja espaço para cantores e artistas indígenas estarem mostrando um pouco da sua arte, da sua ancestralidade, da sua língua, da sua cultura”, acrescenta. “Fora do Brasil, esse reconhecimento também é de extrema importância para que todos saibam que nós, povos indígenas, estamos resistindo e ainda existimos. Não somos lendas”, enfatiza a artista.
“É fundamental nós termos nossos espaços de representabilidade”, disse Daiara Tukano a respeito do Ministério dos Povos Indígenas, da ministra Sonia Guajajara, que esteve na Unesco para prestigiar o evento. “Não podemos aceitar nada mais dito sobre nós sem nós. Então, é importante sempre trazer à frente o protagonismo das pessoas indígenas para poder explicar melhor sobre nossas realidades. E a gente precisa desconstruir muito das narrativas que foram feitas sobre nós, as narrativas da colonização, aqueles que entendem que não houve um descobrimento, que houve, na verdade, uma invasã”, alerta Tukano.
”Essa invasão continua existindo. Ainda hoje nós temos muitos povos que lutam pelo reconhecimento do seu território, que enfrentam graves violências. E isso não é uma coisa que ficou no passado. Reafirmar o contexto da nossa realidade também é reafirmar a nossa luta e o mundo no qual nós acreditamos”, insiste a ativista.
A mostra “Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação” fica em exposição em Paris até 26 de março.
“Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação” também pode ser visitada de maneira interativa.
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