Brasília conspira contra ajuste fiscal de Levy
Ministro da Fazenda apresentou nesta quarta-feira 11 ao Congresso seu Plano Anual de Financiamento de 2015; é o ajuste fiscal, cuja aprovação "é crucial para manter as conquistas sociais obtidas até aqui"; crescem as dúvidas, porém, sobre se Joaquim Levy terá sucesso na missão de aprová-lo; cortes de despesas são mal recebidos por demais ministros; Câmara dos Deputados aprova obrigação de Tesouro bancar emendas parlamentares de R$ 9 bilhões; ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, está retraído; no BC, Alexandre Tombini acena com novos aumentos de juros; como Levy irá conseguir fazer o que se espera dele?
247 – O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, apresentou nesta quarta-feira 11 ao Congresso o Plano Anual de Financiamento de 2015. É, em detalhes, o ajuste fiscal que ele se comprometeu a fazer. Para Levy, a aprovação do plano "é crucial para manter as conquistas sociais obtidas até aqui". Já se sabe, no entanto, que cumprir esta missão está cada vez mais difícil.
Na véspera de entregar o ajuste ao Congresso, Levy recebeu da Câmara dos Deputados uma dura notícia contra suas intenções. Entre aplausos da Mesa, os parlamentares aprovaram a obrigatoriedade, pelo governo, de usar recursos do Tesouro para bancar todas as emendas ao Orçamento que eles conseguirem aprovar. A conta, somente este ano, já é estimada em cerca de R$ 9 bilhões.
Questionado sobre o fato de a ordem de despesas trombar com a iniciativa da Fazenda de economizar para equilibrar as contas públicas, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, foi bastante claro ao dizer que, na cabeça dos parlamentares, a ideia de ajuste é bem diferente da defendida por Levy:
- Não posso dizer que o ajuste tem de sair nesse formato e deste tamanho, respondeu Cunha. "Essas contas são de que fez as propostas", completou, deixando claro que as suas próprias contas são outras.
Do Senado, enquanto isso, dirigentes das centrais sindicais se reuniram com o presidente Renan Calheiros para manifestarem sua oposição aos cortes anunciados em benefícios trabalhistas. Na matemática de Levy, desse setor poderia vir uma economia de mais de R$ 20 bilhões este ano, mas é difícil que sua proposta prevaleça. "O trabalhador não pode pagar pelo ajuste fiscal", aquiesceu Renan aos sindicalistas.
Antes, a própria presidente Dilma Rousseff desautorizou publicamente o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, em seu anúncio de revisão de cálculo para o reajuste do salário mínimo. Barbosa retrocedeu e procurou não mais falar em público, deixando Levy sem um aliado para enfrentar o debate com a opinião pública.
No Banco Central, o presidente Alexandre Tombini e seus diretores têm deixado claro, em diferentes manifestações ao mercado, que não abrirão mão de cumprir o papel de controlar a inflação. Todos os interlocutores da autoridade monetária estão entendendo que, com essa sinalização, o ciclo de alta de juros vai continuar. Para o ajuste que Levy se propõe a fazer, essa é mais uma projeção ruim, uma vez que significa desestímulo para a atividade econômica e, neste sentido, implicaria numa menor arrecadação de impostos.
Na economia, os efeitos da operação Lava Jato sobre as grandes empreiteiras ainda não estão de todo calculados. É certo, porém, que todas as grandes empresas envolvidas estão em dificuldades, o que já se traduz na paralisação de canteiros de obras e demissão de trabalhadores. A baiana OAS, por exemplo, corre neste momento atrás de R$ 500 milhões para evitar uma entrada abrupta no regime de recuperação judicial. Na prática, uma concordata. Como ela, outras grandes empregadoras estão em situação similar, o que indica problemas na economia real enquanto Brasília conspira contra o ajuste pensado por Levy. Para ele, o cenário que já era difícil está ficando pior.
Abaixo, notícia do portal Infomoney a respeito:
Primeiras leituras: o tiroteio contra as medidas de ajuste fiscal
Os presidentes da Câmara e do Senado querem mudar as medidas provisórias com alterações em alguns benefícios trabalhistas e previdenciários. O PT solta nota defendendo que os direitos dos trabalhadores sejam preservados.
Estão se ampliando as dificuldades da presidente Dilma Rousseff para sustentar o ajuste fiscal no modelo pensado – e já em adoção, em parte – pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy e companheiros no Ministério do Planejamento e no Banco Central - de austeridade nos gastos públicos.
Três fatos ocorridos ontem e registrados nos jornais de hoje apontam para o recrudescimento das resistências ao pacote de Levy.
A Executiva nacional do PT cobrou da presidente, em documento elaborado após reunião na semana passada em Belo Horizonte, o cumprimento da promessa de campanha de "impedir" que o ajuste fiscal prejudique os direitos trabalhistas conquistados.
O PT afirma ainda que o governo federal deve dar "continuidade" ao diálogo com o movimento sindical e popular, "no sentido de impedir que medidas necessárias de ajuste incidam sobre direitos conquistados – tal como a presidente Dilma assegurou na campanha e em seu mais recente pronunciamento".
A MPs 664 e 665, com as mudanças em alguns benefícios trabalhistas e previdenciários, ponto central, no momento, da discórdia entre sindicalistas e aliados governistas e o Palácio do Planalto, são citadas nominalmente.
Como forma adicional de fazer receita para garantir o ajuste fiscal o PT defende no documento a taxação das grandes fortunas. É o PT tentando se aproximar das ruas, dos sindicatos e dos movimentos sociais, conforme aconselhado por Lula.
Renan e Cunha contra
No Congresso o clima ficou mais delicado também.
Depois de receber as centrais sindicais, o presidente do Senado, Renan Calheiros, passou a defender mudanças nas duas MPs. Disse que o "trabalhador não pode pagar pelo ajuste fiscal" e que o Congresso vai encontrar alternativas para que ele não seja "duramente sacrificado".
Dilma conta com ações de Renan para conter os ímpetos menos governistas do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Pelo visto, nesse caso não deve contar.
Apenas com palavras mais brandas, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse praticamente o mesmo que Renan. Cunha só está mais cauteloso em suas declarações, quando fala de questões legislativas de interesse do governo, para não alimentar mais a animosidade entre ele e a presidente.
É o estilo: morde no essencial, assopra no desimportante. Para o presidente da Câmara, os direitos trabalhistas devem ser preservados, forma indireta de dizer que como estão as MPs não passam, pois as centrais sindicais dizem exatamente que tais direitos estão atingidos por elas.
"Não posso dizer que [o ajuste] tem de sair neste formato e ser deste tamanho. Essas contas são de quem fez as propostas" - afirmou.
O terceiro sinal das dificuldades de Dilma veio do PMDB, o aliado de Dilma mais insatisfeito com as escolhas da presidente para o novo ministério.
Sem romper formalmente - até porque o PMDB não é dado a arroubos "oposicionistas" a não ser em condições especiais, para ganhar peças no tabuleiro de xadrez da política – o partido decidiu que terá uma agenda autônoma e independente do governo no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff.
Segundo informa o jornal "O Estado de S. Paulo", além das críticas à falta de diálogo com a petista, os líderes do PMDB agem motivados pelo sentimento de que o Palácio do Planalto tem colocado em prática uma estratégia para "destruir" o partido. Em contrapartida, buscam uma independência informal do governo.
Orçamento impositivo passa
E ontem mesmo o deputado Eduardo Cunha, que está surgindo como o líder da uma parcela significativa do PMDB e da Câmara, deu a primeira demonstração concreta de que, ao contrário de outros presidentes da Casa nos últimos anos, não rezará necessariamente sempre pela cartilha do Palácio do Planalto.
Em menos de duas semanas na direção da Câmara, ele botou na pauta e depois comandou a aprovação da Emenda Constitucional que passa a obrigar o governo e pagar (liberar as verbas) as emendas dos parlamentares, sem mais poder mais ignorá-las.
O governo fez tudo para evitar que o dispositivo fosse votado. Ele tramita há mais de um ano no Congresso, num jogo de vai e vem entre Câmara e no Senado. Ontem ele foi aprovado em última instância. Vai agora ser promulgado pelo Congresso e pronto.
A derrota do governo foi acachapante: 452 a 18 na votação do texto básico e 427 a 44 na de um destaque. Nem o PT ficou inteiro com a presidente.
Com o Orçamento impositivo, fica mais complicado o corte no Orçamento. As emendas parlamentares são sempre as primeiras a serem sacrificadas na hora dos ajustes fiscais.
Há, porém, um lado positivo. Acaba a vergonhosa barganha entre governo e parlamentares toda vez que há algo importante a ser votado no parlamento. O governo condicionando a liberação das verbas ao voto do deputado ou senador e ele condicionando seu voto ao pagamento da emenda.
Por segurança, o ministro Joaquim Levy, conforme o "Primeiras Leituras" registrou na segunda-feira, prepara medidas adicionais para assegurar o cumprimento da meta de superávit fiscal de 1,2% do PIB caso o pacote trabalhista e previdenciário sofra muitas avarias no choque com os aliados.
De acordo com o "Estadão", que deu a notícia desse segundo pacote em gestação no Ministério da Fazenda no fim de semana, Levy pretende com as novas medidas, entre aumento de receitas e cortes de subsídios, conseguir entre R$ 15 bilhões e R$ 20 bilhões para turbinar o esforço fiscal de 2015.
Contudo, algumas medidas em estudo para o novo pacote, caso das mudanças no Reintegra e no PSI, já foram condenadas publicamente pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro Neto. E certamente abrirão outra zona de sombra com os empresários.
Núcleo duro rachado?
Para complicar, diante de todo esse ambiente, principalmente no Congresso, pouco favorável ao governo, a coordenação política do governo – com os seis ministros do "núcleo duro" – está capengando.
Prova inicial foi a forma desastrada como se conduziu a eleição para a presidência da Câmara.
Segundo informa o repórter Raymundo Costa, no "Valor Econômico", a troupe, formada por Aloizio Mercadante, Miguel Rosseto, Pepe Vargas, Ricardo Berzoini, Jaques Wagner e José Eduardo Cardozo, já rachou. Diz a reportagem que, pelo andar da carruagem, dificilmente, por exemplo, Mercadante e Wagner terminam o governo mesmo lugar.
Dilma ontem saiu do casulo e recebeu o presidente da CUT, Wagner Freitas. Ela, porém, ao contrário do que querem os líderes sindicais, indicou que não mudará o pacote trabalhistaprevidenciário.
Lula, petistas e aliados defendem que Dilma assuma pessoalmente o comando das conversas para quebrar as resistências à política de austeridade em geral e em particular a alguns de seus pontos.
Entendem que ela é que deve negociar com o Congresso e os partidos, com os sindicalistas e agora com os empresários. Está tudo nas mãos de auxiliares, nem sempre muito hábeis e quase sempre sem autonomia para fazer acordos em nome da chefe. Não foram poucas as vezes que Dilma desautorizou seus negociadores e emissários.
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