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    Declínio dos sindicatos explica o aumento da desigualdade

    Dezenas de estudos comprovam que a queda da representação sindical é uma das principais causas do aumento brutal das desigualdades nos Estados Unidos. Um projeto que vem de longe

    (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

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    Tradução da Rede Brasil Atual a partir de Politikon Este é um gráfico que nunca chama a atenção o suficiente: a porcentagem de trabalhadores em empresas privadas nos Estados Unidos que pertencem a um sindicato.

    sindicato-eua

    A evolução do sindicalismo e do movimento operário nos Estados Unidos é uma daquelas histórias nascidas em parte ao acaso e que tiveram um enorme impacto na estrutura econômica do país nos últimos 80 anos. Vamos ver por que.

    A era Wagner

    Neste gráfico, temos três eras diferentes, cada uma marcada por uma mudança legal. A primeira, de 1935 a 1947, são os anos do  National Labor Relations Act  de 1935 (o Wagner Act), uma das peças-chave do New Deal. A NLRA foi pensada explicitamente para facilitar e favorecer a criação de sindicatos, buscando igualar o poder de barganha entre trabalhadores e empresas. A lei criou um mecanismo para permitir a fundação de sindicatos e de um órgão federal, o Conselho Nacional de Relações do Trabalho, dedicado a supervisionar o processo.

    A lei oficializou o princípio norteador básico das relações sindicais  e empresariais, o contrato, produto final de uma negociação entre os dois agentes que produz um documento de pleno valor jurídico. Ela também formalizou algo que seria um componente constante do movimento trabalhista americano e que se tornaria seu calcanhar de Aquiles: os contratos são válidos para empresas ou cobrem determinada categoria profissional dentro de uma empresa. Eles não são setoriais.

    Durante os anos em que a legislação esteve em vigor, porém, esse detalhe não foi muito importante. A massiva mobilização da Segunda Guerra Mundial deu aos trabalhadores um tremendo poder de barganha. Isso, combinado com uma administração claramente do lado dos empregados, contribuiu para uma expansão massiva do sindicalismo no país.

    Em 1945 e 1946, isso também causou uma grande onda de greves e distúrbios trabalhistas. Quando os republicanos reconquistaram o Congresso em 1946, decidiram que as coisas estavam saindo do controle e que o comunismo era iminente, então empurraram a Lei Taft-Harley para perfurar aquele balão.

    Taft-Harley: Combatentes Comunistas

    Taft-Harley é uma daquelas leis que aparentemente não são muito agressivas, mas que sua implementação e desenvolvimento jurídico acabam tornando-as cruciais. Em princípio, tudo o que TH faz é proibir várias “práticas sindicais injustas”, como greves de solidariedade, greves selvagens (uma das minhas expressões favoritas) e piquetes em massa. Ele também baniu os chamados closed shops, contratos sindicais que tornavam obrigatória a sindicalização para trabalhar em uma empresa.

    As duas mudanças mais significativas, no entanto, foram mais sutis: proibição de doações diretas para campanhas políticas federais e permissão aos estados para que aprovassem leis de “direito ao trabalho”. A primeira parte é significativa porque elimina a possibilidade de os sindicatos se articularem com candidatos em algo como um partido trabalhista. Embora tenham continuado (e continuem) a intervir na política, têm de fazê-lo com comitês de ação política independentes, não endossando candidatos oficialmente.

    A segunda parte concentra-se em um detalhe importante. Até 1947, os sindicatos podiam negociar contratos que incluíam uma cláusula que exigia que todos os empregados incluídos no contrato pagassem uma taxa sindical, independentemente de serem ou não membros. A Taft-Harley permite que os estados possam banir esse tipo de cláusula, permitindo que os funcionários optem por não pagar, mas ainda assim receber os benefícios da negociação coletiva. Isso cria situações em que um sindicato em teoria pode tentar representar os trabalhadores, mas não tem recursos para cobrir os custos de uma negociação que os empregadores inevitavelmente tentam fazer que seja a mais cara possível, fragilizando seu poder de barganha.

    As leis de direito ao trabalho se espalharam rapidamente, especialmente nos estados do Sul. A ideia de que trabalhadores negros e brancos pudessem compartilhar um sindicato era algo que parecia tão repreensível para muitos que preferiam acabar com o sindicalismo antes de misturar raças.

    O impacto Taft-Harley, no entanto, não foi imediato. Durante a década de 1950, o ápice do poder imperial americano, a taxa de desemprego era tão minúscula que os trabalhadores ainda tinham considerável poder de barganha. Em um mundo onde o poderio industrial da América era inquestionável, as empresas podiam se dar ao luxo de ser paternalistas. Além disso, os reguladores ainda eram novos negociadores  , de modo que o NLRB continuou a não ser muito hostil. Houve alguma queda no número de membros, especialmente no Sul, mas o poder do movimento sindical permaneceu.

    Nixon, de novo

    A mudança veio, como em tantas outras coisas, devido a um velho conhecido: Richard Milhous Nixon. A crise do petróleo interrompeu a sequência ininterrupta de décadas de pleno emprego nos Estados Unidos, exatamente quando a indústria nacional começava a ter que competir com alemães e japoneses. Devido ao acidente histórico do seguro saúde empresarial de que falamos uma vez, os custos do trabalho por trabalhador, especialmente em empresas com sindicatos fortes, eram mais elevados do que em países com Estados de bem-estar social. O ativismo social da década de 1960 também tornou os sindicatos mais militantes, expandindo suas bases para incluir mulheres, latinos e negros.

    Nixon não mudou uma vírgula na Taft-Harley. O que fez foi nomear cinco reacionários para o NLRB, permitindo que as empresas agissem de forma muito mais agressiva  contra qualquer tentativa de formar um sindicato.

    Por exemplo, uma das provisões de TH permite que os empregadores montem campanhas de propaganda anti-sindical quando alguém está tentando organizar uma na empresa. Nas semanas que antecedem a votação pela sindicalização, um empregador pode forçar os trabalhadores a comparecerem a briefings sobre os horrores do sindicalismo e como, se votarem mal, podem ter que fechar a fábrica e ir para a China. Mudanças na jurisprudência de facto eliminaram o método tradicional de coleta de assinaturas (cheque de cartão) para sindicalizar, obrigando a votação com urnas, onde o empregador pode pressionar muito mais.

    Mais significativamente, o governo federal simplesmente parou de penalizar as empresas que violavam os direitos sindicais. Em teoria, é totalmente ilegal demitir um trabalhador que está tentando formar um sindicato, o que regulamenta o tipo de “educação anti-sindical” que empresas podem promover. Na prática, o governo federal aprovou tudo e, quando agiu, as penalidades por violação desses direitos foram e são ridículas. A NLRA era, originalmente, uma agência que tinha que defender os direitos dos trabalhadores em disputas trabalhistas, quando uma empresa fazia algo atroz, era a NLRA que representava o trabalhador. Nixon primeiro, e Reagan depois, simplesmente atrofiou a agência ao ponto de ficar inoperante.

    As empresas foram rápidas em perceber essas mudanças. Como mostra este ótimo artigo do EPI,  do qual obtive muito do que você está lendo, nos Estados Unidos existe uma indústria de consultores, advogados e MBAs que ganham a vida ajudando empresas a reprimir qualquer tentativa de sindicalização. Eles são pessoas que conhecem as táticas, estratégias e limites legais em detalhes e os aplicam com energia. Se você quiser vê-los em ação, o fantástico documentário  American Factory  (Netflix) tem um exemplo perfeito de uma dessas batalhas jurídicas.

    Oportunidade e desigualdade

    Aqui estamos hoje, em um país onde os trabalhadores do setor privado têm pouca ou nenhuma capacidade de negociar qualquer coisa com as empresas em pé de igualdade. Sabemos (porque existem dezenas de estudos que o comprovam) que a queda da representação sindical  é uma das principais causas do aumento brutal das desigualdades nos Estados Unidos. Essa mudança regulatória da era Nixon e sua continuação sob Reagan era virtualmente invisível e não exigia nenhuma lei no Congresso. Seus efeitos, entretanto, foram enormes.

    Vale ressaltar, como nota final, quão acidental  tem sido a evolução do movimento sindical americano. A tradição europeia de negociação e acordos setoriais não existe nos Estados Unidos não por uma decisão política, mas por uma decisão judicial. O National Industrial Recovery Act  de 1933 , o antecessor do NLRA, incluiu algo semelhante a essa estrutura, mas o Supremo declarou-a inconstitucional em 1935 e Roosevelt mudou de curso.

    Uma parte significativa das enormes desigualdades econômicas nos Estados Unidos, portanto, é o resultado de uma decisão judicial sobre um assunto adjacente à representação sindical e cinco reguladores nomeados por Richard Nixon. Para que depois digam que a política não importa.

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