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    Desmonte do BNDES precariza infraestrutura e pode ampliar desigualdades

    Para o ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho, a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) agravou acrise no setor de financiamento de longo prazo para os projetos de infraestrutura, acarretando em atraso no desenvolvimento de municípios e do Estado que podem aumentar a desigualdade social; "Parece inacreditável, mas o ministro Paulo Guedes e sua equipe ignoram que as transformações do capitalismo contemporâneo, dominado pelo grande capital financeiro, conduzem ao aprofundamento da desigualdade social e da exclusão", afirma

    Desmonte do BNDES precariza infraestrutura e pode ampliar desigualdades (Foto: REUTERS/Nacho Doce)

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    Juca Guimarães, Brasil de FatoCom a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) a crise no setor de financiamento de longo prazo para os projetos de infraestrutura do Brasil foi agravada, acarretando em atraso no desenvolvimento de municípios e do Estado que podem aumentar a desigualdade social.

    A avaliação é de Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento). O banco estatal é o principal agente financiador, direta e indiretamente, de rodovias, hospitais públicos, metrôs, ferrovias, portos, pontes, obras de saneamento etc. Segundo Coutinho, o volume de operações está caindo e a política do atual governo é a de desmonte do órgão.

    "A crença — ultraliberal — de que o mercado financeiro proverá todas a soluções de financiamento e que o BNDES deve ser radicalmente reduzido acarretará um imenso retrocesso para o desenvolvimento do Brasil. Parece inacreditável, mas o ministro Paulo Guedes e sua equipe ignoram que as transformações do capitalismo contemporâneo, dominado pelo grande capital financeiro, conduzem ao aprofundamento da desigualdade social e da exclusão", aponta o economista, que esteve à frente do banco entre maio de 2007 a maio de 2016.

    Em 2008, quando o mundo passava por uma profunda crise econômica e enfrentava uma redução drástica dos financiamentos, a ação do BNDES em fomentar grandes projetos para garantir a atividade econômica com geração de emprego e consumo foi fundamental para o Brasil manter os níveis de crescimento, analisa.

    No entanto, atualmente, os investimentos do BNDES são precariamente baixos — inferior a 1% do PIB — e, por isso, não é capaz sequer de repor a depreciação do Estado. O país deveria investir pelo menos 4,5% do PIB ao ano, o que significaria alcançar a cifra de R$ 340 bilhões a cada ano.

    "Mesmo que o mercado de capitais receba incentivos para investir no longo prazo, sem a contribuição do BNDES não será viável financiar esses volumes. Note-se que estamos nos referindo a financiamentos de longo prazo. Por isso, o encolhimento do BNDES significará um grave desserviço ao nosso desenvolvimento", disse Coutinho.

    Ele explica que uma parte importante dos investimentos em infraestrutura, cuja taxa de retorno não é atraente para o setor privado, precisa ser empreendida diretamente pelo governo – e boa parte pelos Estados e municípios.

    "Por isso a situação de colapso das finanças públicas, especialmente de vários Estados importantes, reclama soluções estruturais. Será necessário reorganizar, refinanciar e priorizar. A postura da atual equipe tem sido de negligenciar esta questão, apostando na ilusão de que o mercado resolverá tudo", disse Coutinho.

    No primeiro trimestre de governo de Bolsonaro, as consultas por empréstimos no BNDES somaram o total de R$ 8,3 bilhões. No mesmo período do ano passado, o total foi de R$ 14 bilhões. Houve uma queda de 40,7%.

    O vice-presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, Arthur Koblitz, acredita que o desmonte do banco começou com a alteração nas taxas de juros de longo prazo feita durante o governo Michel Temer e mantida pela equipe econômica de Jair Bolsonaro, enquanto o país passa por uma grave crise de falta de investimento em infraestrutura.

    "A taxa do BNDES está mais cara. Isso é resultado da Medida Provisória 777 [de abril de 2017] que acabou com a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). O governo tinha o poder de decidir onde ficaria essa taxa de longo prazo. Agora é uma taxa de mercado e está alta. O BNDES tem os recursos e o país precisa pensar em soluções. Como é que a gente injeta esse dinheiro na economia? Não tem nenhum plano articulado para isso. O banco atua dentro de um arcabouço institucional. Ele pode, por exemplo, ampliar os limites para Estados e municípios, mas nada disso está sendo feito", disse Koblitz.

    Para Coutinho, o cenário de aprofundamento da crise não deve mudar por conta do perfil do governo e a linha ortodoxa da economia.

    "O governo Bolsonaro é notoriamente carente de um projeto de desenvolvimento para o país. Não se trata apenas da incapacidade de formulação e articulação de seu núcleo político, concentrado em gerar polêmicas e em destilar preconceitos pelas redes sociais. O fato é que Bolsonaro fez um pacto liberal-conservador com a grande elite, delegando toda a política econômica a um ministro de perfil ultraliberal, cuja visão de mundo é retrógrada e datada", comentou.

    Em 2012, o BNDES emprestou R$ 52 bilhões para obras de infraestrutura. No ano passado foram R$ 30 bilhões. O volume médio de investimento em infraestrutura fica abaixo da taxa de depreciação, 1,7% contra 2,8% do PIB (Produto Interno Bruto), ou seja, o Brasil não consegue investir o suficiente para manter a infraestrutura que já existe e está encolhendo, assim como o próprio BNDES.

    Outro ponto que foi destacado por Koblitz é que o governo, além de não incentivar os empréstimos do BNDES, está usando os recursos do banco para pagar a dívida bruta, que é o total das dívidas mais as previsões de pagamentos, com efeito mínimo na amortização.

    Segundo o Tesouro Nacional, em 2019, a dívida bruta deve chegar a 78,2% do PIB.

    O Brasil de Fato questionou o BNDES sobre a falta de projetos diante da crise de infraestrutura, sobre a política de taxas e do uso do dinheiro do banco para cobrir a dívida bruta, porém, não obteve qualquer resposta até o fechamento desta reportagem.

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