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"Mulheres crescem entendendo que é sempre 'o outro' quem irá defendê-las", diz empreendedora que ensina autodefesa feminina

Para Amanda Lemes, esse é um fenômeno social de mutilação de mecanismos de proteção e é preciso transformar a defesa pessoal feminina numa política pública

Amanda Lemes é fundadora da Empodere-se, que ensina crianças e mulheres a se defenderem em situações de violência e abuso (Foto: Divulgação )

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Beatriz Bevilaqua, 247 - A cada 2 minutos, uma menina ou mulher é estuprada no Brasil, uma média de 822 mil casos a cada ano. Desse total, apenas 8,5% casos chegam ao conhecimento da polícia e 4,2% são identificados pelo sistema de saúde, segundo relatório do Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Em meio a discussão sobre o Projeto de Lei 1904/2024, o qual deseja equiparar o aborto após 22 semanas ao crime de homicídio e uma pena de até 20 anos, trouxemos um debate com uma grande especialista em defesa pessoal feminina no programa “Empreender Brasil”, na TV 247. Amanda Lemes é fundadora da Empodere-se, que ensina crianças e mulheres a se defenderem em situações de violência e abuso. Ela é advogada, mestre em políticas públicas, feminista, ex-investigadora da polícia civil e praticante de artes marciais.

“As mulheres crescem entendendo que é sempre “o outro” quem irá defendê-las, seja o pai, o vizinho ou o namorado. A nossa segurança está terceirizada no nosso imaginário simbólico para o homem e crescemos sem qualquer noção básica de defesa pessoal”, disse Amanda.

Ideação do Negócio a partir da necessidade de ajudar mulheres

Quando trabalhava como investigadora da polícia, tinham casos que eram complexos e os boletins de ocorrência e medidas protetivas não eram suficientes para a segurança das mulheres. Em certo momento, quando não suportou mais ver aquela situação, Amanda ensinou uma vítima de violência doméstica a se defender de um parceiro que agredia todos os dias a esposa.

Usando as técnicas ensinadas, a vítima conseguiu sair de um estrangulamento pela frente e fez o marido pedir o divorcio. Depois desse episódio, a ex-investigadora da polícia decidiu que precisava impulsionar outras mulheres a fazerem o mesmo e criou a Empodere-se. 

“Empreender era muito mais complexo do que eu imaginava. O mais importante em todo esse processo, foi dialogar com outras empreendedoras. As grandes ideias e soluções surgiram dessa troca de vivências com elas”, enfatizou. 

Prevenção contra a violência da mulher 

A empreendedora questiona que hoje, ainda no Brasil, não existe uma única política pública para combater a violência contra a mulher. É depois que a violência já aconteceu que surge alguma ação efetiva, como a Lei Maria da Penha, que ainda assim é questionada por conservadores.

“Qual a política pública que temos de prevenção contra a violência? Nenhuma polícia do mundo chega a tempo do episódio de violência que dura em média de 10 segundos a 1 minuto. Você certamente precisará de ferramentas individuais para agir em relação à violência”, alertou Amanda.

Segundo a especialista, a maioria das mulheres paralisa diante de uma agressão. As mulheres são os únicos bichos na natureza que não se defendem, porque esse é um fenômeno social de mutilação de nossos mecanismos de defesa e a ferramenta para combatermos isso é transformar a defesa pessoal feminina numa política pública, inclusive dentro das escolas desde muito cedo, que passa por um letramento de compreensão da violência contra a mulher.

“Para criar os workshops, estudamos 2 mil boletins de ocorrência, entendendo os principais modus operandi das violências contra a mulher, a partir deste estudo construímos um laboratório de várias linhas de luta - krav maga, jiu jitsu, karate, judo e nos juntamos com psicólogos e outros especialistas, para aprimorar técnicas físicas e emocionais”, explicou. 

As artes marciais são voltadas mais para o esporte e às vezes levam cinco etapas para fazer uma saída e era preciso que os golpes fossem em apenas duas saídas para que as mulheres aprendessem de maneira fácil e no menor tempo possível. 

Mercado e Empoderamento Feminino

A maioria das mulheres não se sente capaz de se defender. Não existia um mercado para o que Amanda estava propondo.“Primeiramente vendia os cursos para pessoas físicas, mas não havia uma conscientização coletiva, então procurei empresas que tinham interesse em oferecer o ensino de defesa pessoal para suas funcionárias e agora o próprio governo se interessou em democratizar o acesso à outras mulheres”, disse.

Mais de 350 empresas já contrataram o serviço da Empodere-se e também prefeituras, estados e governo federal têm mostrado interesse. “Acabamos de fazer um trabalho no município de Campinas com a prefeitura. Foram 10 workshops para servidoras públicas e comunidades em geral. Temos conversado com outros municípios e também com o ministério das mulheres”, disse.

O sonho de Amanda é que em 12 anos haja um mercado mais constituído da defesa pessoal feminina e que se torne uma política pública massificada no Brasil. “Estamos numa guerra ideológica, contra os nossos corpos. A quais corpos é permitida a legítima defesa? Temos nossos mecanismos de defesas mutilados desde criança e não é por acaso, pois se trata de um projeto para nos manter nesse lugar de vulnerabilidade. Por outro lado, nosso processo de empoderamento está crescendo. Estamos num embate permanente”, avaliou. 

Durante a entrevista ela traz algumas dicas e técnicas básicas de autodefesa e reforça que todos os corpos têm suas fragilidades e suas forças, o mais importante é saber como utilizar essas potencialidades em situações de emergência.

O programa "Empreender Brasil" traz a cada semana um brasileiro ou brasileira de alguma parte do país para compartilhar a sua jornada empreendedora, desafios, superações e impacto. O programa é conduzido pela jornalista Beatriz Bevilaqua, que também apresenta o “Brasil Sustentável” e o “Sociedade do Amanhã” todos os sábados às 11h30 e 17h respectivamente, onde discute semanalmente as principais transformações da sociedade nas últimas décadas e uma perspectiva sobre o nosso futuro.

Assista  à entrevista na íntegra:

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