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    MPF recomenda que empresa de NFTs interrompa atividades em terra indígena da Amazônia

    A terra indígena Baixo Seruini/Baixo Tumiã, em Pauini (AM), é considerada o "berço" dos indígenas Apurinã e fica em uma das porções mais ambientalmente preservadas da Amazônia

    Família Apurinã navega pelo rio Seruiní (Foto: Acervo Pessoal (no Brasil de Fato))

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    Murilo Pajolla, Brasil de Fato | Lábrea (AM) - O Ministério Público Federal (MPF) do Amazonas recomendou na última segunda-feira (19) que a empresa Nemus, que comercializa NFTs (sigla em inglês para Tokens Não Fungíveis), interrompa a venda, negociação ou qualquer outra forma de comercialização de títulos incidentes sobre a terra indígena Baixo Seruini/Baixo Tumiã, no município de Pauini (AM). 

    A empresa foi orientada a não efetuar "contato e/ou cooptação de lideranças indígenas ou tradicionais sem o regular procedimento da Convenção nº 169 da OIT, nem qualquer outro ato que impacte diretamente no território", conforme a recomendação assinada pelo procurador da República no Amazonas, Fernando Merloto Soave.

    Uma investigação exclusiva do Brasil de Fato revelou em agosto deste ano que a produção e a venda de ativos digitais pela Nemus é feita sem consentimento coletivo dos Apurinã e viola o direito à consulta livre, prévia e informada, nos moldes previstos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e referendados pela legislação brasileira. 

    Os NFTs vendidos pela empresa são títulos de propriedade digitais lastreados em porções reais do território indígena e supostamente atrelados a projetos de conservação ambiental. No site oficial, a Nemus anuncia uma "experiência NFT colecionável projetada para conservar e proteger a Floresta Amazônica".

    A região correspondente aos NFTs produzidos pela Nemus é considerada o "berço" dos indígenas Apurinã e está situada em uma das porções mais ambientalmente preservadas da Amazônia. Embora seja um território ancestralmente ocupado, o processo de regularização na Funai está paralisado desde 2018. 

    O MPF estipulou prazo de dez dias para que a Nemus informe quais providências foram tomadas para acatar a recomendação. Caso contrário, "medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis" poderão ser tomadas.

    O pedido de posicionamento enviado pelo Brasil de Fato à assessoria de imprensa da Nemus foi respondido pelo fundador da empresa, Flávio de Meira Penna. "Estamos totalmente alinhados em fazer um trabalho para melhorar a situação das comunidades ribeirinhas e comunidades indígenas. Somos uma Fundação, então precisamos que as comunidades locais definam o que elas querem e precisam", afirmou.    

    Consulta prévia não está condicionada à demarcação, diz MPF

    Na recomendação emitida nesta segunda-feira (9), o MPF afirmou que o cumprimento dos direitos dos indígenas não está condicionado à conclusão do processo de demarcação. A empresa já havia informado ao MPF que não pretendia efetuar consulta prévia aos Apurinã, por eles não habitarem uma Terra Indígena regularizada. 

    "A despeito de a empresa NEMUS alegar em sua manifestação que a área territorial que se diz proprietária não está inserida na área de uma terra indígena devidamente demarcada pelo Governo Federal e que por isso entende desnecessária a consulta prevista na Convenção 169 da OIT, o território de uso tradicional por povos indígenas é dotado de garantia constitucional", diz o MPF. 

    Recomendação atinge Funai 

    As terras Apurinã das quais a Nemus se diz proprietária pertenciam à Madeireira Nacional SA, a Manasa, cuja entrada no território foi franqueada pela Funai da ditadura militar na década de 70. Hoje, terras pertencentes à Manasa na região estão sob embargo judicial e incluídas em processos que apuram desmatamento ilegal e grilagem de terras, conforme escreveu o MPF na recomendação. 

    A recomendação também sugere à Funai que não autorize o ingresso ou passagem de não indígenas no território, caso não haja consentimento dos Apurinã. 

    Em agosto, o Brasil de Fato mostrou que a Funai autorizou a entrada de funcionários da Nemus no território, descumprindo o protocolo de saúde vigente durante a pandemia de covid-19.

    "Se a gente aceitar esse pessoal [da Nemus], a demarcação será parada, e nós não temos outra chance. Se a gente não aceitar [a Nemus], o processo de demarcação continua. E a demarcação dessa terra é o que nós queremos", afirmou Melquisedeque Lopes Soares Apurinã, morador da terra indígena, em entrevista concedida em agosto deste ano.

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