Historiadora Lilia Schwarcz: capa da Folha é um "truque nocivo" que ignora o momento histórico
A acadêmica criticou a foto 'mentirosa' do jornal paulistano
247 - A historiadora Lilia Schwarcz criticou a capa da edição impressa da Folha de S. Paulo desta quinta-feira (19), cuja foto principal é uma montagem do presidente Lula e uma vidraça perfurada por, aparentemente, um tiro na altura do coração do petista. A matéria ilustrada pela imagem leva o título de 'No foco de Lula, presença militar no Planalto é recorde'.
A múltipla exposição, creditada à fotojornalista Gabriela Biló, gerou polêmica nas redes sociais, levando a profissional a se dizer vítima do ódio e ironizar. "SE CONTINUAREM RECLAMANDO BOTO A FOTO NA CAPA NO LIVRO. brincadeira, fechei as fotos já ☆ SORTE DE VOCES SE NAO ERA CAPA. Brincadeira ♡", disse ela, em sua conta no Twitter.
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Essa técnica consiste em sobrepor várias imagens em um único quadro, e é facilmente criada usando uma câmera analógica.
No Instagram, Schwarcz qualificou a montagem de Biló como um "truque nocivo" que ignora o momento histórico, que exige "responsabilidade e ajudar na luta pelo fortalecimento da democracia, contra o golpismo".
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Veja abaixo:
"Para variar a Folha de S. Paulo pretende fazer notícia com uma imagem: ser assim a notícia, não a informação.
Na reportagem de hoje, com a República brasileira arrumando a casa, voltando à normalidade depois do acesso de vandalismo golpista do dia 8 de janeiro, o jornal resolveu dar na capa uma foto de Gabriela Biló que estampa Lula arrumando sua gravata, com rosto levemente reclinado, sorriso tímido, e em destaque sua mão esquerda. Em um dos dedos aparece uma aliança. Chama atenção, porém, a falta de um dedo; resultado de um acidente quando Lula trabalhava como metalúrgico, e que já se colou à imagem do presidente; manipulada como forma de exaltação por alguns, e por vezes como ironia preconceituosa. Lula aparece em meio à uma vidraça estilhaçada, revelando fragilidade. Há um tiro na altura do coração do presidente ressoando o suicídio de GV.
A imagem é uma fotomontagem; técnica presente na fotografia desde seu nascimento em meados do século XIX, quando levava o nome de 'trucagem'.
O conceito é correto. Esses são 'truques' feitos pelos profissionais, desde o início da técnica, para conseguirem efeitos visuais, em geral, pouco verdadeiros.
A técnica da multi-exposição logra um efeito ampliado e artificialmente criado. Uma manipulação não um instantâneo. Não tenho dúvidas da qualidade da foto. Mas tenho muitas dúvidas sobre a ética dela.
Não é a primeira vez que a Folha usa desse expediente para vender jornal. Para que serve esse tipo de 'brincadeira' leviana? Mostrar a fragilidade do governo Lula? Que o coração da república foi atingido? Semiótica fácil!
A Folha se posicionou várias vezes sobre Lula — famosa é a expressão equivocada 'PEC da gastança' e a foto que estampou no primeiro turno (como se Lula tivesse perdido a eleição, não o oposto). São 'truques nocivos', num contexto que precisamos ter responsabilidade e ajudar na luta pelo fortalecimento da democracia, contra o golpismo.
Imagens assim resultam em prêmios, e chamam atenção. Porém, omitem a mentira que nelas carregam; são perigosas e nada inocentes. Susan Sontag disse que a fotografia nasceu para mentir. Foi isso que fez o jornal. Cedeu lugar para o jogo de efeito, não para a sua verdade".
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