Para ombudsman, jornais erraram no caso Erenice
Suzana Singer argumenta que não se deu o devido destaque ao arquivamento das acusações contra a ex-ministra da Casa Civil
247 – Em 2010, as acusações contra a ex-ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, ajudaram a levar a eleição presidencial para o segundo turno – o que dito pela própria Folha, em texto da semana passada, sobre o arquivamento das denúncias contra ela. No entanto, o jornal manteve o tom acusatório e não deu o devido destaque à decisão judicial. Leia, abaixo, a crítica deste domingo da ombudsman Suzana Singer à postura da Folha e de outros jornais:
Justiça seja feita
O arquivamento da investigação contra a ex-ministra Erenice Guerra não prova que ela foi vítima da imprensa, mas faltou clareza e destaque à notícia
NA QUARTA-FEIRA passada, a Folha noticiou que a Justiça Federal em Brasília arquivou o inquérito contra a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. Alguns leitores e blogueiros aproveitaram a deixa para criticar o "denuncismo" da mídia.
O ex-presidente Lula já tinha declarado em junho, antes da decisão da Justiça, que Erenice foi "execrada, acusada de tudo quanto é coisa" e que a "imprensa, que a massacrou, não teve coragem sequer de pedir desculpas".
A "execração", na definição de Lula, aconteceu em plena campanha presidencial de 2010 e é apontada como um dos motivos que levaram ao segundo turno presidencial entre Serra e Dilma.
A "Veja" iniciou o escândalo com uma reportagem em que um empresário dizia que Israel Guerra, filho da ex-ministra, fazia lobby para viabilizar negócios com o governo – segundo a revista, a mãe garantia o sucesso da intermediação.
A denúncia tomou toda a imprensa e foi manchete da Folha por nove dias. Em 16 de setembro de 2010, o jornal trouxe o seu "furo": uma entrevista com Rubnei Quícoli, autodenominado "consultor de empresas", acusando Israel de cobrar uma taxa para conseguir liberar empréstimo do BNDES.
A ministra caiu no mesmo dia, mas a Folha foi bastante criticada, porque Quícoli não era exatamente um exemplo de probidade. Com duas condenações na Justiça, já tinha passado dez meses na cadeia. Segundo o "Globo", ele tinha tentado chantagear o governo, ameaçando fazer denúncias à imprensa.
Só que o fio do novelo já tinha sido puxado. Novas denúncias surgiram contra Israel Guerra, outros parentes e o marido da titular da Casa Civil, que teria buscado benefícios junto à Anatel para a empresa de telefonia que dirigia.
O inquérito, aberto em 2010 pela Polícia Federal, só teve desfecho agora, no último dia 20, com o pedido de arquivamento pelo Ministério Público Federal, que não encontrou provas que pudessem embasar uma denúncia criminal, o que foi acatado pela Justiça.
Isso significa que Erenice é mais uma vítima do "assassinato de reputações promovido pela imprensa"? Não é bem assim.
Mesmo que não tenha cometido um crime, a ex-ministra pode ter falhado eticamente ao permitir que se instalasse um balcão de vendas de influência na Casa Civil.
Em março do ano passado, a Controladoria-Geral da União apontou "irregularidades graves" em três dos nove fatos investigados durante a gestão de Erenice.
O erro da imprensa está na forma como a decisão da Justiça foi noticiada. A Folha pelo menos deu uma menção na "Primeira Página" – o que não aconteceu com o "Estado" nem o "Globo".
Só que a reportagem era bem confusa e, na quinta-feira, o jornal insistia no tom acusatório ao relatar que uma nova investigação terá como alvo uma suspeita de sonegação fiscal da empresa de Israel Guerra.
Para fazer o devido contrapeso às fortes denúncias do passado, era necessário divulgar, com destaque e clareza, a conclusão da Justiça de que não há provas contra a ex-braço direito de Dilma.
Às vésperas do julgamento do mensalão, é fundamental não alimentar os que veem uma desmedida sanha acusatória da mídia.
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