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    Portugueses vão às urnas neste domingo para escolher presidente

    Candidato à reeleição, Marcelo Rebelo de Sousa continua sendo favorito para vencer no 1º turno, com 59,4% das intenções de voto, de acordo com pesquisa. A socialista Ana Gomes, com candidatura independente, subiu para 15,4%, decolando em relação a André Ventura, líder do partido Chega, que aparece com 9,7%

    (Foto: Reuters/Pedro Nunes)
    Guilherme Levorato avatar
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    Sputnik - Milhões de portugueses vão às urnas neste domingo (24) para escolher o presidente do país. Não apenas eles: milhares de brasileiros que têm direito ao voto em Portugal também participarão da eleição. A Sputnik Brasil conversou com alguns deles para conhecer as expectativas e diferenças entre os pleitos nos dois países.

    Candidato à reeleição, Marcelo Rebelo de Sousa (apoiado por PSD e CDS-PP) continua sendo favorito para vencer logo no 1º turno, com 59,4% das intenções de voto, de acordo com pesquisa da Aximage para TSF/DN/JN, divulgada na sexta-feira (22), último dia de campanha. A socialista Ana Gomes, com candidatura independente apoiada pelos partidos Livre e PAN, subiu para 15,4%, decolando em relação a André Ventura, líder do partido Chega, que aparece com 9,7%. 

    O comunista João Ferreira (PCP e PEV), com 5%, ultrapassou Marisa Matias (Bloco de Esquerda), agora com 4,3%, mesmo com a hashtag #VermelhoemBelém que viralizou nas redes sociais. Na sequência, surgem o liberal Tiago Mayan Gonçalves (IL), com 3,3%, e Vitorino Silva (RIR), com 1,5%. Como o voto não é obrigatório em Portugal e, em decorrência da pandemia de COVID-19, a sondagem da Aximage estima uma abstenção recorde, de 58%, superior aos 53,48% em 2011, quando Cavaco Silva foi reeleito. 

    E é justamente esse cenário que preocupa Marcelo Rebelo de Sousa, pois a abstenção alta pode levar a um eventual 2º turno. Carlos Jalali, professor de Ciência Política da Universidade de Aveiro, estima uma abstenção histórica, perto de 75%, levando em consideração não apenas a pandemia, mas também o recenseamento automático de portugueses morando no estrangeiro, muitos dos quais não votarão. 

    O próprio presidente da República levantou a hipótese nesta semana, durante encontro com alunos na Escola Secundária Pedro Nunes, em Lisboa, onde também estudou. O professor Rebelo de Sousa evocou seus 50 anos como analista político e fez um apelo à participação nas eleições, respeitando as medidas sanitárias, em nome da democracia.

    "Basta que a abstenção atinja 70% para tornar quase inevitável uma segunda volta [2º turno], porque a abstenção pune em função da intenção de voto dos vários candidatos, atinge mais os que têm mais intenção de voto. Em teoria, se a abstenção do território nacional – à parte a emigração –, for de 70% ou 75%, quem vai à frente nas intenções de voto perde, em teoria, uma parte considerável desses 15% ou 20% que não votam. Isso pode significar ficar com menos de 50%, e, portanto, haver uma segunda volta", explicou Marcelo Rebelo de Sousa na ocasião. 

    Alheios à abstenção recorde que se avista e acostumados com o voto obrigatório, muitos brasileiros - seja por terem dupla nacionalidade ou por recorrem ao Acordo de Porto Seguro - querem exercer seus direitos eleitorais em Portugal, alguns deles pela primeira vez, como relata o correspondente da Sputnik Brasil em Lisboa. Mas as diferenças não se restringem à obrigatoriedade do voto. 

    A véspera da eleição, por exemplo, é conhecida como o "dia de reflexão". Na prática, significa que os candidatos estão proibidos de fazer propaganda e se manifestar sobre suas ideias e propostas. Não apenas eles. TVs, rádios, jornais e sites também não podem noticiar nada sobre as candidaturas neste dia. É assim há 45 anos, desde as primeiras eleições democráticas realizadas depois da Revolução de 25 de Abril de 1974, que derrubou a ditadura. 

    Mas o "dia de reflexão" está longe de ter consenso. Democraticamente, veículos da imprensa como o Expresso manifestaram descontentamento com a medida. A experiente jornalista São José Almeida, que trabalha no Público desde a fundação do diário, escreveu um artigo sobre "As obsoletas regras eleitorais portuguesas", questionando principalmente o fato de a mídia não poder falar sobre as eleições na véspera, algo impensável no Brasil. Estrategicamente, o artigo foi publicado às 23h58 de sexta (22).

    "Há anos que questiono esta proibição. E faço-o, sobretudo, desde que o jornalismo on-line existe. É absurdo que um jornal on-line não possa ter, com visibilidade imediata, no seu site, notícias sobre a campanha eleitoral. Considero mesmo que se trata de uma forma de censura. Espero que, este ano, haja órgãos de comunicação social que boicotem esta regra. Talvez ajude a chamar a atenção dos legisladores para o quanto estas regras são obsoletas", escreveu São José Almeida.

    Paulistana vai votar pela 1ª vez em Portugal

    A paulistana Giulia Trecco, de 27 anos, refletiu bastante antes de ir às urnas pela primeira vez, neste domingo (24). Com nacionalidade portuguesa desde 2016 e morando em Lisboa desde 2017, ela poderia ter votado nas eleições para a Assembleia da República e para o Parlamento Europeu, ambas em 2019, mas ainda não se sentia confortável. Agora, está animada para as presidenciais.

    "Para mim, foi um processo natural votar nessas eleições. Como já vivo cá há quase quatro anos, sinto que compreendo melhor o sistema político, e é óbvio que quero ter um papel ativo na tomada de decisão de algo que interfere no futuro do país que escolhi como meu", diz Giulia, em entrevista à Sputnik Brasil.

    Neste domingo (24), ela vai sair de casa excepcionalmente, por um bom motivo. Desde o dia 15, o país está em lockdown, mas a circulação será liberada ao longo do dia para que as pessoas possam ir aos locais de votação. Depois de assistir a debates presidenciais, ler e pesquisar muito, Giulia conta que mudou de voto na última semana, de Marisa Matias para Ana Gomes.

    "Desde o começo, estava indecisa entre as duas. Na última semana, tive a certeza do meu voto para Ana Gomes por sentir uma firmeza e a coragem de lutar pela nação muito mais do que por objetivos pessoais. O fato de ela, mesmo filiada ao PS, concorrer sem partido, e a sua postura forte, sem deixar de ser empática, me fazem ver o tipo de presidente que gostaria de ter em Portugal", explica.

    Mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de Lisboa, a brasileira destaca a importância de escolher uma mulher para comandar o país. Ela cita o exemplo da primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, considerada uma referência no controle da pandemia de COVID-19 em seu país. E também conta a favor de Ana Gomes a possibilidade de passar para um eventual 2º turno, afastando a chance de André Ventura, candidato de extrema-direita do qual a paulistana não gosta.

    "Como mulher, acredito que é necessário que cargos de poder sejam cada vez mais ocupados por mulheres. Já vimos o mundo ser comandado há séculos por homens e já passa da hora de termos uma mudança. Não quero que um André Ventura da vida ganhe. Não conseguiria viver num país com um presidente como o Ventura. Não estou nem no Brasil para aguentar o Bolsonaro, então não ia conseguir aguentar uma versão luso-bolsonarista, compara Giulia.

    O carioca Frederico Homobono, de 38 anos, também vai estrear seu voto em eleições portuguesas. Mas vai fazê-lo do outro lado do oceano Atlântico, no Consulado Geral de Portugal no Rio de Janeiro. Filho e neto de portuguesas, o engenheiro eletrônico tem dupla nacionalidade desde 2015, mas só passou a se interessar pela política lusitana mais recentemente.

    "Vou votar, primeiramente, para exercer minha cidadania como português. Em segundo lugar, em memória da minha família. Minha mãe votou uma vez, e minha avó, algumas vezes", conta Homobono à Sputnik Brasil. 

    Questionado sobre em quem será seu voto, ele diz que está mais propenso a optar por Rebelo de Sousa, mas que avaliará a possibilidade de escolher Ana Gomes até a hora da votação. No Brasil, o horário do pleito se estende das 8h às 17h. Assim como em Portugal, quem tiver direito a voto precisa levar o cartão de cidadão. Os locais de votação podem ser consultados no site de recenseamento, preenchendo o número de identificação e a data de nascimento.

    Eleitores devem levar a própria caneta para voto impresso

    Em Portugal, é obrigatório o uso de máscara nas seções eleitorais e é pedido que os eleitores levem sua própria caneta, medida profilática contra a COVID-19, já que o voto é manual e impresso. Essa, aliás, é uma diferença importante em relação ao pleito brasileiro, que adotou a urna eletrônica a partir de 1996. Em terras lusitanas, o voto eletrônico é testado desde 1997, mas nunca saiu do papel. Literalmente. O próprio presidente criticou a demora na mudança, esta semana, referindo-se ao voto impresso como "uma coisa verdadeiramente do arco-da-velha". 

    Em entrevista à Sputnik Brasil, também nesta semana, a candidata Ana Gomes elogiou o sistema eletrônico brasileiro como um bom exemplo que Portugal deveria ter seguido há muito tempo. No último teste-piloto, nas eleições europeias de 2019, eleitores de Évora puderam experimentar as novidades tecnológicas. O projeto custou €1,45 milhão (R$ 9,66 milhões). 

    A introdução do voto eletrônico exige uma maioria de dois terços dos deputados para alterar a lei eleitoral e a Constituição, mas o relatório de avaliação do teste não saiu sequer da gaveta da Comissão de Assuntos Constitucionais de Direitos e Garantias. Sputnik Brasil entrou em contato com o gabinete do deputado Luís Marques Guedes (PSD), presidente da comissão, mas ele não respondeu até o fechamento desta reportagem.

    Formado em Ciências da Computação, o carioca Rodrigo Motta, de 35 anos, mora em Lisboa há sete e já possuía nacionalidade quando chegou à cidade. Essa será sua segunda eleição presidencial. Assim como na primeira, votará em Rebelo de Sousa. Mesmo nunca tendo votado manualmente no Brasil, ele acredita que o voto impresso tem um quê de nostalgia e charme.

    "Minha primeira vez com voto impresso foi aqui em Portugal. A primeira eleição em que votei no Brasil já era com a urna eletrônica. É diferente, mas, ao mesmo tempo, é um jeito tradicional de votar. A folha de votação é enorme e tem instruções de como dobrar o voto. Foi uma experiência interessante votar aqui! Uma das coisas boas de ser um país pequeno é que tem pouco voto para contar. Normalmente, de madrugada já temos o resultado", detalha Motta.

    Ele explica que, há cinco anos, quando votou pela primeira vez nas presidenciais, teve que pesquisar mais sobre os candidatos, pois, diferentemente do Brasil, em Portugal, eles não contam necessariamente com o apoio de um partido. O próprio Rebelo de Sousa, que foi um dos fundadores do Partido Popular Democrático (PPD), convertido posteriormente no Partido Social Democrata (PSD), do qual foi também líder, recebeu um apoio partidário discreto. Apenas na última sexta, o PSD divulgou um comunicado dizendo que ele é o candidato que melhor representa "o ideário social-democrata".

    "Como eu tinha chegado há pouco tempo, conhecia pouquíssimo dos políticos portugueses. Votei nele e vou votar de novo. Ele já foi o líder do PSD, que é o partido em que costumo votar, e fez um mandato muito bom", avalia Motta.

    No último domingo (17), dos 246.880 eleitores inscritos para o voto antecipado, 197.903, cerca de 80%, compareceram às urnas, de acordo com dados do Ministério da Administração Interna (MAI). Como as seções eleitorais estavam concentradas em poucos lugares, houve longas filas. Quem estava inscrito e não compareceu à votação antecipada terá uma nova oportunidade neste domingo (24).

    A carioca Michelle Aisenberg optou pelo voto antecipado justamente para evitar aglomerações, pois acredita que as filas sejam maiores agora. Segundo ela, que votou em Cascais, a fila estava bem organizada e rápida, com todas as medidas de segurança asseguradas. Morando há quatro anos em Portugal, ela já tinha dupla nacionalidade quando chegou, e votou para eurodeputado em 2019. Mas esta foi a primeira vez que votou para escolher o presidente do país, também em Rebelo de Sousa. 

    "Não levei nem uma hora. A fila era grande em parte pela distância de dois metros entre as pessoas. Eu já queria garantir meu voto e não correr nenhum risco de não poder garantir esse meu direito. Não votar no 'menos pior' por falta de opção já é muito bom. Sei que há problemas em qualquer lugar, mas me sinto parte de algo que eu realmente posso fazer a diferença com meu voto", acredita Michelle.

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