Por: Luis Pellegrini
Há cerca de 2300 anos, na China, foi desenvolvida a Teoria dos Cinco Elementos (água, fogo, madeira, metal e terra). Esse sistema de ideias até hoje constitui a base da sabedoria manifestada em todas as áreas do conhecimento na civilização chinesa, seja no plano da ciência e da filosofia, quanto das artes e da religiões. Sistema animista por excelência – de animismo, ação cultural/espiritual que atribui uma alma a todas as coisas – ele fala da relação íntima e vital do ser humano com todas as formas e seres – animados ou inanimados – criados pela natureza, e da relação transcendental da alma humana com a alma das coisas.
Dessa visão integrada do homem com o mundo natural desmembrou-se a ideia da potência das réplicas em miniatura. Ao recriar uma montanha, por exemplo, em escala reduzida, uma pessoa poderia se concentrar em suas propriedades mágicas e espirituais e ter acesso a elas. Quanto mais a reprodução miniaturizada fosse fiel à ideia e às proporções do original, o mais magicamente potente ela era suscetível de ser.
Um mundo no qual tudo se relaciona e interage
As árvores, nessa visão de um universo uno, no qual todas as coisas existem de modo integrado e interagem ativamente umas com as outras, logo adquiriram singular importância. Entre vários outros atributos, com suas raízes que se afundam na terra, um tronco poderoso, e uma copa de folhagem que parece querer chegar ao céu, elas passaram a representar um axis mundi (eixo do mundo), um símbolo perfeito da jornada do ser humano em sua eterna busca pelas suas origens e pelas suas finalidades últimas.
Os primeiros bonsai, na forma como hoje são conhecidos, foram cultivados no século 6 depois de Cristo, por povos nômades de origem mongol que dominavam a China: faziam crescer plantas medicinais em vasos para que pudessem ser transportados nas migrações.
A prática da miniaturização de árvores, no entanto, é provavelmente bem mais antiga, remontando a mais de 2 mil anos, talvez mais. O cultivo do bonsai como arte sagrada foi desenvolvido ao redor do ano 700 de nossa era, por monges budistas chineses que aplicavam às mini-árvores os princípios da sua filosofia: o homem sábio não necessita conhecer o mundo inteiro, e ser dono dele, se aprender a reduzir sua capacidade de visão àquilo que o circunda, miniaturizando não apenas a árvore mas também a paisagem na qual a árvore cresce. Ou seja, ser capaz, a partir de uma amostra miniaturizada (um micromundo), de desenvolver uma visão ampla da totalidade do mundo (um macromundo). Vários outros significados simbólicos foram sendo acrescentados ao bonsai, entre eles a de se ver, nos troncos retorcidos e nascidos sobre uma pedra o próprio surgimento da vida apesar de todos as adversidades. Além disso, na arte do bonsai, troncos e galhos podem ser dobrados e conduzidos na direção desejada pelo artista, como a mostrar o poder que o ser humano possui de, pelos menos em parte, moldar a própria natureza.
No século 8 o bonsai chega ao Japão
Surgidos portanto na China do período dinástico Han, os bonsai chegaram ao Japão, provavelmente levados por monges budistas, no período Heian (794 -1185 d. C.). Foi no País do Sol Levante que ganharam o nome de bonsai. No início do século 19, surgiram no Japão as primeiras escolas formais de “arte bonsai”, que codificaram estilos, regras, medidas e proporções. Os primeiros exemplares de bonsai chegaram à Europa no final do século 19, apresentados como curiosidades exóticas em exposições universais como as que aconteceram em Paris em 1878 e em 1900.
O termo japonês bonsai deriva do chinês pun sai, que significa planta cultivada sozinha em um vaso, fora do seu contexto natural. A técnica do bonsai prevê a miniaturização da árvore, a partir de podas progressivas dos brotos e a constrição do conjunto de suas raízes em um receptáculo de dimensões muito reduzidas. Fios de cobre, de arame metálico e cordões também são utilizados para forçar os ramos a assumir formas retorcidas.
Bonsai e meditação
Embora a produção de bonsais seja hoje bastante grande nos países ocidentais, e eles sejam muito apreciados como obras de arte, a percepção e o conhecimento dos significados profundos dessa escola de arte ainda são muito escassos no Ocidente. Muitos conheçam o bonsai como planta miniaturizada, mas pouquíssimos sabem que ele é uma obra de arte sagrada com funções importantes e precisas em técnicas como, por exemplo, a da meditação.
Hoje, o cultivo do bonsai é preconizado também como terapia por vários médicos e psicoterapeutas, sobretudo nos casos de grande estresse e depressões, pois essa arte é capaz de levar o paciente de volta ao mundo natural, mesmo que ele esteja confinado no interior de um apartamento situado no meio mais urbano.
Assim sendo, mesmo que você não se transforme num artista do bonsai, é muito bom tomar consciência dos princípios espirituais e estéticos que o animam. Inspirado pela filosofia do bonsai, da próxima vez que você podar um galho, aramá-lo ou transplantar uma árvore, reflita que o que você está fazendo é dar continuidade a uma tradição milenar. Da sua própria maneira, você está explorando e compondo uma versão em miniatura de seu universo.
Galeria de bonsais:
Vídeo: Passeio no jardim de bonsais de Kimura (Japão) – Uma viagem, Nas Asas do Vento, a um jardim situado no outro lado do mundo, no Japão, que reúne uma grande coleção de bonsais belíssimos. Como diria um filósofo do bonsai, você não precisa ir ao grande jardim para sentir a vibração do seu significado. Basta “viajar” na miniatura desse jardim, contida neste vídeo… É o que lhe propomos Nas Asas do Vento . Boa viagem.