Álcool e imunologia. Como as bebidas alcoólicas afetam o nosso sistema de defesa imunológica
Claro, não estamos falando do hoje célebre álcool 70, aquele que usamos para desinfetar as mãos. Nos referimos às bebidas alcoólicas: todas elas. O álcool, infelizmente, afeta muitos órgãos do organismo, e um dos mais afetados é justamente o nosso sistema imunológico. Até mesmo quando ingerido em pequenas quantidades, o álcool influencia a capacidade que nosso corpo tem de se defender dos micróbios agressores.
Por: Equipe Oásis
Durante a quarentena da COVID-19, em todo o mundo as vendas de bebidas alcoólicas aumentaram. Conclusão óbvio: o consumo delas também aumentou. Com tantas horas trancadas em casa, não podendo ir trabalhar, acossadas pelo tédio e as tensões provocadas pelo distanciamento social, as pessoas estão bebendo bem mais do que o habitual. E a maioria não sabe como isso afeta o seu sistema imunológico.
Sim: o álcool altera e enfraquece esse sistema. Embora beber ocasionalmente possa nos ajudar a relaxar e tornar o contato social mais agradável, o álcool também pode causar desidratação, esgotar vitaminas e nutrientes, piorar o sono, causar inflamação e desequilibrar a flora intestinal, e tudo isso pode enfraquecer a capacidade de imunidade do nosso corpo.
O abuso de álcool suprime vários braços da resposta imune, aumentando o risco de infecções. O curso e a resolução de infecções bacterianas e virais são severamente afetados em pacientes que abusam de álcool, resultando em maior morbi/mortalidade do paciente.
O metabolismo é priorizado
Seu corpo não pode armazenar álcool. Ele sabe perfeitamente que se trata de uma substância tóxica e, por isso, quando ingerimos álcool, o corpo deixa de fazer tudo o que está fazendo e considera que a eliminação do álcool é a prioridade número um do metabolismo. Isso significa que o processamento do álcool passa a ter prioridade sobre proteínas, carboidratos e gorduras.
O álcool basicamente é levado para o fígado, órgão que tem a função de destrui-lo e de eliminar os seus resíduos através da urina, das fezes e da transpiração. À medida que o álcool é processado, água e nutrientes são usados para removê-lo, deixando seu corpo empobrecido e desidratado.
A inflamação é o maior efeito geral que o álcool tem sobre o seu corpo. Inflamação é a resposta protetora do seu corpo a ameaças. Em resposta ao álcool, seu corpo gera endotoxinas que desencadeiam inflamações. Se você bebe com frequência, seu corpo nunca será capaz de manter suas defesas em alto nível. Ficar em constante estado de inflamação afeta o corpo, causando danos aos tecidos na forma de inflamação crônica.
Perturba o equilíbrio das bactérias intestinais
O álcool causa um crescimento rápido e quase sempre excessivo do número de certas bactérias intestinais. As toxinas produzidas por essas bactérias sobrecarregam outras bactérias, úteis e necessárias, interrompendo os delicados sistemas que processam os alimentos e enviam sinais ao sistema imunológico para proteger o corpo.
Um estudo descobriu que 30% das pessoas com doença hepática causada pelo álcool têm uma cepa rara de bactérias intestinais que produz uma toxina destruidora de células chamada citolisina.
Quando estimulada pelo álcool, outra bactéria que se reproduz rapidamente começa a produzir substâncias chamadas lipopolissacarídeos (LPS). O LPS sobrecarrega as bactérias intestinais, permitindo que essas toxinas penetrem na barreira intestinal e se espalhem por todo o corpo e invadam outros órgãos.
As toxinas afetam mais do que apenas seu intestino. O trabalho do fígado é filtrar essas toxinas e enviá-las para fora do corpo. Esse órgão consegue fazer isso dentro de certas medidas. À medida que elas forem superadas, seu fígado começará a degenerar e acabará desenvolvendo uma condição com risco de vida chamada cirrose.
Álcool e cigarro: a pior combinação
Segundo a CDC – Cleveland Clinic (EUA), aproximadamente 90% das pessoas que bebem 4-5 bebidas por dia durante décadas têm esteatose hepática (fígado gorduroso) (*). Só essa já seria razão suficiente para considerar parar de beber com tanta frequência e começar a pedir coquetéis não alcoólicos.
Como o álcool afeta a imunologia?
Quando o nosso corpo é exposto a uma ameaça (a presença de um vírus invasivo, por exemplo), o sistema imunológico prepara uma resposta ao ataque e elimina o patógeno estranho. Em geral, quanto mais saudável for o sistema imunológico de uma pessoa, mais rápido ele consegue eliminar a bactéria, o antígeno ou o vírus invasor e se recuperar da doença.
O álcool dificulta o funcionamento correto do sistema imunológico acarretando nele diferentes processos prejudiciais.
O álcool “distrai” seu sistema imunológico. Se seu corpo estiver constantemente trabalhando para se livrar do álcool, você poderá não perceber outros problemas começando a aparecer. Seu cérebro desempenha um papel importante na detecção de perigo na hora de acelerar sua resposta imunológica. Em resposta ao estresse, seu cérebro ativa os eixos hipotalâmico, hipofisário e adrenal (HPA). O eixo HPA, juntamente com as células imunológicas do seu corpo, mantem a inflamação sob controle. O problema é que o eixo HPA interpreta o álcool como um evento estressante e, quando você bebe, aumenta os níveis de hormônio do estresse. A exposição crônica ao álcool pode saturar o eixo HPA e diminuir a resposta do seu corpo a outros estressores. Isso significa que seu corpo terá mais dificuldade em controlar a inflamação. Além disso, o consumo de álcool aumenta suas chances de desenvolver seis tipos diferentes de câncer, e quanto mais você bebe, maiores são suas chances de que isso lhe aconteça.
O álcool danifica suas defesas físicas
O álcool pode danificar os cílios microscópicos que existem na parte alta dos pulmões, cuja função é capturar e impedir que bactérias, antígenos e vírus prejudiciais à medida que entram.
Se os invasores superam a barreira dos cílios, isso é uma má notícia, porque o álcool também danifica a última linha de defesa: a membrana mucosa no fundo dos pulmões, que geralmente impede que os invasores penetrem no corpo. Estudos mostram que beber álcool torna os pulmões mais suscetíveis a doenças como pneumonias e viroses.
Ao atuar dessa forma, o álcool nos torna vulneráveis ??a infecções, a inflamações e a outras doenças crônicas
O álcool tem uma ampla gama de efeitos sobre os componentes estruturais, celulares e endócrinos do sistema imunológico. Essa desregulação do sistema imunológico induzida pelo álcool torna o paciente suscetível a uma ampla variedade de patógenos infecciosos, resultando em consequências biomédicas, como aumento do risco de infecções após cirurgia, lesão traumática ou queimaduras; doença hepática, como infecção por hepatite C, fibrose e câncer de fígado; infecções nos pulmões; uma progressão acelerada das doenças provocadas pelo HIV.
A CDC define o consumo moderado de álcool como até uma bebida por dia para mulheres e até duas bebidas por dia para homens. Mas a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem adotado uma postura bem mais conservadora durante a atual pandemia da Covid-19, recomendando que a quantidade ideal de álcool por dia seja … nada.
Então, pelo menos durante a pandemia, devemos parar completamente de beber?
Antes de concluir, é preciso lembrar que muitas ameaças podem afetar o sistema imunológico do nosso corpo, da qualidade e quantidade do sono às bactérias intestinais. Mas, ao contrário de outros fatores de saúde, a quantidade de álcool que ingerimos está em nossas mãos.
O mais prudente seria considerar que – dado que o álcool faz parte de nossas vidas sociais; é parte de como interagimos com os amigos (virtualmente ou não); é algo que desfrutamos no jantar com nossos entes queridos – se bebermos de vez em quando, poderemos obter alguns benefícios. Mas, se bebermos demais e com muita frequência, perderemos esses benefícios. Em tempos de pandemia, podemos perder inclusive as nossas vidas.
(*) O fígado gorduroso (ou esteatose hepática) é mais comum em pessoas que têm sobrepeso, obesidade, ou a chamada síndrome metabólica (conjunto de doenças como colesterol e triglicérides alterados, diabetes ou pressão alta, que aumentam os riscos de doenças cardíacas). O consumo excessivo de álcool também pode causar a doença.
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