“Delgatti é muito importante para a história do Brasil”, diz ex-presidente Dilma Rousseff
“Ele é comparável a Assange e Snowden. Ele tem um valor importante por ter permitido que nós, de forma mais rápida, percebêssemos a dimensão do monstro. Essa armação que envolveu a Lava Jato”, disse ao Pauta Brasil, na TV 247, a ex-presidente, que também tratou da política de preços da Petrobras e falou sobre o papel de Haddad em 2022. Assista
247 - Em entrevista ao programa Pauta Brasil, na TV 247, a ex-presidente Dilma Rousseff falou da importância do hacker Walter Delgatti Neto para a história brasileira. Delgatti foi responsável por acessar celulares de autoridades brasileiras, principalmente de membros da Lava Jato, e escancarar ao país as tramoias do ex-chefe da força-tarefa Deltan Dallagnol, do ex-juiz Sergio Moro e demais procuradores da operação.
Segundo Dilma, Delgatti pode ser comparado ao jornalista Julian Assange e a Edward Snowden. “Eu acho que esse rapaz, o Delgatti, é uma pessoa muito importante para a história do Brasil. Eu acho que ele é comparável, para nós, a qualquer Assange, ao Snowden. Ele tem um valor muito importante por ter permitido que nós, de forma mais rápida, percebêssemos a dimensão do monstro. O que é o monstro? É essa armação que envolveu a Lava Jato e muitos outros que se mostram arrependidos agora e que endossaram todos as falas, iniciativas, vazamentos e encobriram os vazamentos também. Ali ninguém é inocente”.
Repercutindo a fala do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, Dilma chamou a Lava Jato de “organização criminosa” e a acusou de ter cometido crimes contra o Brasil e o povo brasileiro. "Eu concordo com o que disse o ministro Gilmar Mendes. Por que é uma organização criminosa? Porque se juntaram para cometer um grande delito contra o Brasil. Contra o Lula, contra o Brasil, contra a democracia e contra cada um de nós. Eu fui objeto deles também. Eles criaram o clima de que havia um elemento de pedaladas fiscais no exercício do orçamento do país. Todos os governos tinham práticas de exercício do orçamento. Quem é que criou o ambiente para que isso se transformasse em crime de repente? A Lava Jato. Mas não é só a Lava Jato. A Lava Jato cria o clima mas corrói o Judiciário, veja o que acontecia no TRF4".
Sobre as condenações da Lava Jato contra o ex-presidente Lula, cada vez mais insustentáveis justamente por conta das revelações de Delgatti, Dilma estabeleceu uma comparação com a ditadura militar. Para ela, os processos contra Lula foram conduzidos de forma muito semelhante àqueles contra os presos políticos do regime militar. A ex-presidente pediu a anulação das sentenças contra o petista. “Os processos contra o Lula, todos eles fazem parte de um processo que eu conheço. Sabe como é que funcionava na ditadura? Em 1970 você era preso pela Operação Bandeirante, DOI-CODI [Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna] de São Paulo. Você era preso lá. Depois passava um tempo e você ia para o DOPS [Departamento de Ordem Política e Social]. Você fazia o ‘cartório’ e depois você saía para o Presídio Tiradentes. Aí você ia para a ‘auditoria’. Qual era o método? Picote de processos. Eu tive três processos. A Lei de Segurança Nacional dizia o seguinte: 'praticar crimes destinados a promover a guerra revolucionária e instituir ditadura de classe ou de partido’. E eu recebi um processo por cada estado da federação. Nós tínhamos advogados, eles entravam na Justiça e conseguiam derrubar cada um dos processos. Entendeu como é? Ficava um, e aí você era julgado por um. No caso do Lula fizeram a mesma coisa. Primeiro era o triplex, depois era o sítio de Atibaia. No sítio de Atibaia quem faz a denúncia é o Moro, e aí entra a juíza, a [Gabriela] Hardt, que outro dia foi repreendida pelo método que ela usa do ‘corta e cola’. Então eu acho estarrecedor que toda a criminalização da Lava Jato, do Moro e do Dallagnol não signifique a anulação dos processos do Lula, feitos por eles. E aí tem outros que são visíveis. Os processos contra o Lula são ridículos”.
"OAS tem que mijar sangue"
Na última semana, veio à tona um diálogo entre procuradores da Lava Jato, obtidos por meio do hacker Delgatti, no qual um dos procuradores da Lava Jato afirma que "essa reportagem só me convence que a OAS tem que mijar sangue para voltar para mesa".
Dilma, que foi presa e torturada durante a ditadura militar, afirmou que esta fala era típica de torturadores à época. “Eu escutei nesses dias uma frase que eu escutei antes, lá na década de 1970. Os procuradores dizendo o seguinte: ‘nós vamos fazer ele mijar sangue’. Esta era a fala dos torturadores para nós. Essa fala foi dita, redita, ‘tredita’ para os militantes, os que foram presos e que foram torturados. Era dita e redita. E muitos, de fato, mijaram sangue. É estarrecedor isso partindo de procuradores. Você tem uma ideologia de um autoritarismo e de um desrespeito aos direitos humanos fantástico. Isso é fala de torturador”.
Neste sentido, a ex-presidente cobrou um debate público sobre o papel das instituições civis do Brasil. “Tem de discutir as instituições não do ponto de vista para romper com elas, mas para reforçar o que são as práticas positivas. O Ministério Público tem muitas práticas produtivas, que fizeram o Brasil avançar, que defenderam os direitos difusos, deram imensas contribuições no combate ao crime. Mas você tem um quadro terrível a partir da Lava Jato, de contaminação geral. Quantas vezes o Dallagnol foi para o Conselho Nacional do Ministério Público e não aconteceu nada? Acho que em outro momento há de ter uma discussão clara sobre isso”.
Campanha de 2022
A ex-presidente avaliou como positiva a indicação de Lula para que o ex-ministro Fernando Haddad coloque o ‘bloco do PT na rua’ para disputar a presidência em 2022 contra Jair Bolsonaro. Segundo Dilma, Haddad é uma “liderança emergente” do partido e teve desempenho em 2018 até mesmo melhor do que os registrados por ela mesma e por Lula em anos anteriores. “Acho muito importante a questão do ‘bloco na rua’ com o Haddad porque o Haddad teve o melhor desempenho de todos nós em termos relativos. Ele teve um desempenho na pior situação possível. Eu sei o que é fazer campanha presidencial. Para uma pessoa com um mês só para fazer campanha presidencial, ele teve um ótimo desempenho. Então eu acho que ele é, de fato, uma pessoa extremamente qualificada para colocar o bloco na rua. O PT tem de ir para rua. Foi um grande acerto a escolha do Haddad pelas características do Haddad e pela importância que para nós o Haddad tem, porque uma liderança se constrói. O Haddad vem se construindo e, sem dúvida nenhuma, a última etapa dele, que foi disputar a eleição, lhe dá credencial para isso. Ele tem de assumir essa liderança porque é a nossa liderança emergente. Tem de apostar nele, valorizá-lo e dar espaço para ele exercer essa atividade. Eu acredito que ele tem essas condições”.Dilma, no entanto, reconheceu que o melhor candidato seria o ex-presidente Lula, dada sua experiência, suas virtudes e sua ligação com o povo brasileiro. Ela defendeu principalmente o direito de o ex-presidente concorrer às eleições, mesmo que este não seja seu intuito. “Um país, para ter lideranças, essas lideranças têm de ter história, elas vão construindo sua história. Cada um de nós vai construindo ao longo da vida sua própria história, e as partes da história vão mudando na gente. O Lula não é uma pessoa sem história, e a história do Lula coincide com a história do povo trabalhador desse país. Não é só por conta dos governos do Lula, é pela história dele, de como ele surge para a vida pública. Isso significa uma quantidade de virtudes. Ele tem a virtude da negociação. O Lula é capaz de negociar com todo mundo, só tem uma coisa que ele nunca negocia: o Brasil, o povo trabalhador e seus interesses. Nunca. Essa pessoa tem também toda uma trajetória no governo. Então eu acho que o Lula conseguiu, entre nós todos, não porque quis, mas por conta da sua vida, ser uma liderança nesse país. A gente sabe que o Lula pode governar e conduzir o país para a democracia. Então eu acho que a nossa luta democrática é pelo direito do Lula não só estar livre, mas de estar livre no sentido dos direitos políticos recuperados. O que cometeram contra o Lula foi uma injustiça. É você pegar uma pessoa inocente e condenar. Não tem nada pior. Eu acho que o melhor candidato nesse país à presidência da República para pacificar esse país e desenvolver é o Lula, e obviamente isso não significa ‘ou Lula ou nada’. Nem para ele. Ignorar que ele é o melhor candidato para nós todos é um absurdo. Ignorar que ele tem direito de ser um candidato é um absurdo”.
Ciro Gomes
Sobre o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), ainda na esteira dos efeitos da Lava Jato no Brasil e da contaminação promovida pela operação no sistema político do país, Dilma disse que “respeita bem menos” o pedetista do que respeitava antes. “Você contamina o sistema político, eles percebem que podem ter um pouquinho de espaço para ter um grande poder. Aí eles aceitam qualquer coisa. E isso está expresso, inclusive, quando gente que eu respeitava bem mais e hoje respeito bem menos, como Ciro Gomes, vai para Paris durante a eleição contra Bolsonaro. E aí você tem um quadro de deterioração extrema no Brasil, mas que não aconteceu apenas com a pandemia. Deteriorou naquela época [do golpe de Estado]. Ele vem deteriorado pela omissão, pelo grau de violência que aconteceu no Brasil; quando prenderam o Lula; tínhamos nós todos ali em São Bernardo, mas o resto do Brasil estava silencioso”.
Política de preços da Petrobras
Diante dos recorrentes reajustes nos preços dos combustíveis no Brasil em razão da valorização internacional do barril de petróleo, a ex-presidente rechaçou completamente a política de atrelar o preço do petróleo nacional ao preço externo. Para ela, esta prática “é um verdadeiro absurdo para um país como o Brasil, que tem petróleo, e que tem petróleo em custos reais, ou seja, denominados pela nossa moeda. Ela [essa política] não é necessária. Seria necessária se essa empresa fosse privada, mas ela não é. Todos nós somos acionistas dessa empresa em um determinado sentido. Somos os donos dessa empresa, somos os donos das reservas de petróleo”.
“Eles estão enganando o povo brasileiro com essa política de extorsão do bolso do povo brasileiro por conta de aumentar o preço do petróleo todo dia. Estão tentando explorar os governadores, porque a razão não são os tributos, a razão é a política de preços. É extorsão do povo brasileiro, ameaça à soberania nacional, porque já começaram a vender parte da Petrobras e estão quebrando o bolso do trabalhador, fazendo ele passar fome com o preço do gás de cozinha no nível em que está. Achar que a situação se resolve pelos tributos é brincar com a gente. Não são os tributos que são responsáveis por esses aumentos extraordinários do preço do petróleo. Quer tirar dos governadores para dar para quem? Para o mercado internacional? Para os especuladores? Não é nem só para as grandes empresas de petróleo, é para os especuladores internacionais”, completou.
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