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    Lula: ‘o povo quer emprego, não quer arma’

    Na TV 247, o ex-presidente criticou a política armamentista de Bolsonaro: “ele quer dar arma para os milicianos, para as pessoas atirarem em sem terra, em quilombola, para matarem Marielle”. Na entrevista, Lula tratou também de temas como a alta dos combustíveis no país e planos para a campanha de 2022. Assista

    (Foto: Ricardo Stuckert)

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    Guilherme Levorato, 247 - O ex-presidente Lula, em entrevista à TV 247, exaltou a necessidade da criação de emprego e renda no Brasil e criticou duramente a política armamentista de Jair Bolsonaro, que em meados de fevereiro editou quatro decretos que facilitam a comercialização de armas e munições no país.

    Segundo Lula, a saída para a normalização da segurança pública não é armar a população, pelo contrário: é gerar postos de trabalho para que o povo possa ter sua renda de forma lícita e digna. “Dê emprego para o povo que ele não vai precisar roubar celular. Dê emprego para o povo que ele vai aprender a cuidar da sua família, ele vai fazer sua casinha, ele vai fazer seu barraquinho, vai fazer seu puxadinho. O que o povo quer é tranquilidade. O povo não quer arma. Quem quer arma é bandido, é grileiro, são os bolsominions. O povo quer trabalhar e o povo quer cuidar da sua família. É esse país que nós precisamos recuperar. Vamos dar emprego, vamos dar salário, vamos levar escola, vamos dar educação e cultura e vamos ver se a gente não vai diminuir a bandidagem e a violência nesse país”.

    De acordo com o petista, Bolsonaro quer, na realidade, armar aqueles que o alçaram ao poder, seus apoiadores, dentre eles os milicianos e fazendeiros. “Um país que está nessa situação não tem o direito de fazer apologia à arma. Eu vou dizer ao senhor Bolsonaro e aos bolsominions: o povo está precisando de carteira profissional assinada, o povo está precisando de aumento de salário, o povo está precisando de emprego, está precisando de escola, está precisando voltar às universidades, está precisando de investimento em ciência e tecnologia, o povo quer cidadania e respeito, e não arma. É disso que o povo está precisando. Ele quer dar arma para os milicianos, para os fazendeiros, quer dar arma para as pessoas atirarem em sem terra, para atirarem em quilombola, para matarem Marielle; é isso”.

    Petrobrás e a alta dos combustíveis

    Desde o início de 2021, a Petrobrás já elevou o custo dos combustíveis para a população por diversas vezes, prática que já vinha ocorrendo no final de 2020. Com os aumentos sucessivos, a pressão gerada forçou Bolsonaro a sacrificar o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, que será substituído pelo general Joaquim Silva e Luna.

    Para Lula, a situação como está é insustentável e, acima de tudo, consequência do golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff em 2016, financiado por empresas do setor petroleiro e pelo governo dos Estados Unidos. “Não há sistema de transporte que suporte. É por isso que os caminhoneiros estão revoltados. É por isso que há uma pressão na sociedade. O aumento no combustível tem ligação direta com o aumento do custo de vida. O que aconteceu para chegarmos nessa situação? É resultado do golpe. O golpe foi feito para isso. As regras da Petrobrás, a lei de partilha, aquela história da Petrobrás produzir o petróleo e o petróleo ser do povo brasileiro, tudo isso incomodava as empresas que detém o petróleo no mundo, incomodava o governo americano e o chamado ‘mercado brasileiro’. Era preciso dar o golpe para se assenhorarem da Petrobrás”.

    O caminho para a destruição, segundo o petista, foi a criação da força-tarefa da Lava Jato e da narrativa de que a Petrobrás deveria ser destruída e reformulada do zero para cessar a suposta corrupção enraizada na estatal. “Para fazer o que eles fizeram com a Petrobrás eles precisaram construir uma mentira, uma mentira que talvez seja a maior da história desse país, vendendo um volume de corrupção que nunca existiu. Se houvesse corrupção na Petrobrás, e certamente deve ter havido, você apura a corrupção, pune quem corrompeu e a empresa continua trabalhando normalmente. Isso vale para a Petrobrás, para as empreiteiras, para JBS, para o banco. Acontece que eles resolveram contar uma mentira para enfraquecer, porque era necessário dizer que tinha que fazer todas as mudanças possíveis porque tinha muita corrupção na Petrobrás”. 

    O ex-presidente lembrou como a empresa era tratada em seu governo, como um instrumento para alavancar a economia do Brasil e reforçar ainda mais a participação internacional do país, e cravou: “soberania nacional é coisa sagrada”. “O que nós fizemos na Petrobrás foi o resultado de utilizar a Petrobrás como uma política não apenas de petróleo, mas uma política de investimento na economia brasileira, de investimento em infraestrutura, de criar uma indústria de óleo e gás nesse país, de criar uma indústria de transporte marítimo para transportar o próprio petróleo da Petrobrás. Nós chegamos a investir praticamente R$ 45 bilhões por ano na Petrobrás. A gente estava fazendo a refinaria de Pernambuco, a refinaria do Ceará, do Maranhão porque o Brasil não queria ser exportador de óleo cru. O Brasil queria ser exportador de derivados, a gente não queria ser importador de material petroquímico. Tudo isso era o pensamento de um país grande, de um país líder na América Latina, de um país de influência na África, de um país respeitado na Europa, de um país com ascensão política muito forte nos BRICS. Esse era o nosso desejo, era fazer com que o Brasil fosse protagonista internacional, que não fosse quintal dos Estados Unidos, embora a gente queira ter uma política de respeito com os Estados Unidos. A soberania nacional é uma coisa sagrada, a gente tem que tomar conta das nossas fronteiras terrestres, marítimas e espaciais. Quem pensa grande, fica grande. Quem pensa pequeno, fica como o Bolsonaro”.

    Lava Jato e as mensagens do hacker

    Em relação às mensagens trocadas entre procuradores da Lava Jato obtidas pelo hacker Walter Delgatti Neto e repassadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) à defesa do ex-presidente, Lula disse que o conteúdo apenas prova o que ele já dizia desde o início da perseguição empenhada pela operação. “O Moro tem que saber que ele era chefe de uma quadrilha, ele organizava a chamada Lava Jato, que envolvia delegados da Polícia Federal, que envolvia gente da Receita Federal, que envolvia toda a força-tarefa do Ministério Público e que envolvia ele pessoalmente. Ele só tinha um objetivo: tentar evitar que o Lula fosse presidente em 2018”.

    “A única certeza que o Moro tem na vida é que ele é mentiroso e que eu sou inocente. A única coisa que Dallagnol tem certeza na vida é que ele é mentiroso e que eu sou inocente. A única coisa que ele deve ter certeza na vida é que ele estava montando uma quadrilha para pegar dinheiro da Petrobrás, extorquindo ladrão, extorquindo gente que roubou, e ele sabe que eu não estava. Essa é a grande verdade”, completou

    Lava Jato tinha um porta-voz em cada redação

    Lula não deixou de lado a participação dos veículos de comunicação no processo ilegal de perseguição da Lava Jato. O ex-presidente afirmou que a Globo “amamentava” os procuradores da força-tarefa e o ex-juiz Sergio Moro e apontou culpa da emissora na “criação desse monstro”. 

    Lula ainda cobrou que a Globo divulgue as conversas que provam o modus operandi ilícito do grupo de Curitiba. “A Globo era a mãe de leite dessa turma toda. Ou seja, não importava o tamanho da mentira, a Globo dava como se fosse verdade e não permitia que houvesse a contraparte, não permitia que meus advogados falassem. Então a Globo tem responsabilidade pela criação desse monstro, dessa quadrilha que hoje nós conhecemos por Lava Jato. É uma pena que não haja uma pressão da sociedade para obrigar a Globo a divulgar [as conversas entre procuradores da Lava Jato]. Ela só divulga aquilo que interessa para ela”.

    O petista falou também que havia profissionais da imprensa nas redações que atuavam como porta-vozes da Lava Jato. “Se você pegar a Istoé, a Veja, o Estadão, a Folha, O Globo, SBT, Record, Bandeirantes e a Globo, tudo era uma coisa só. O Moro e a força-tarefa da Lava Jato fizeram a mais importante política de comunicação que já foi pensada em ser feita em um processo de trabalho de tentar apurar a corrupção, como eles diziam que iam fazer. O Moro visitou todas as redações, o Dallagnol visitou todas as redações e eles tinham em cada redação um porta-voz. Eles chegaram a se reunir com os Marinho. Tudo que eles mandavam não tinha aferição, era verdade, e tudo que a gente mandava não era lido. Era uma acusação única sem defesa”.

    Forças Armadas

    Além da Lava Jato e da imprensa, outro componente do golpe no Brasil foram as Forças Armadas que, segundo depoimento do general Eduardo Villas-Bôas em livro, chegaram a pressionar o STF para que a Corte não permitisse que Lula saísse da cadeia. O ex-presidente confessou ter se ofendido com a revelação de Villas-Bôas. Caso o PT volte à presidência, as Forças Armadas serão cobradas a exercerem papel “civilizatório”, disse Lula. “Eu fiquei muito ofendido, e talvez eu fique mais ofendido ainda quando eu ler o livro. Esta gente tem que saber que a gente pode voltar à presidência, e vamos voltar sem espírito de vingança, mas vamos exigir um comportamento civilizado, um comportamento civilizatório”. “Eu imaginei que o Alto Comando das Forças Armadas estivesse fora desse processo, mas, pelo livro, não está”, acrescentou.

    O ex-presidente destacou que os militares, segundo ele, nunca foram tão bem tratados como foram em seu governo, nem mesmo durante o regime militar. “Eles nunca foram tratados com o respeito e a decência com que eu os tratei. Eles sabem disso. A Marinha sabe disso, a Aeronáutica sabe disso e o Exército sabe disso. É inaceitável”. Para Lula, é inexplicável a “loucura desse general [Villas-Bôas], de alguns membros das Forças Armadas, que não tinham o direito de ter o comportamento que tiveram com o PT, que não tinham o direito de ter o comportamento que tiveram no meu julgamento, no processo eleitoral. É inexplicável. Um comportamento fascista, de alguém que não tem nada de nacionalista, de alguém que não compreendeu o que foi o meu governo para as Forças Armadas brasileiras”.

    Campanha de 2022

    Questionado sobre suas perspectivas para a campanha presidencial de 2022 e sobre a possível criação de uma frente ampla para derrotar Jair Bolsonaro no próximo pleito, Lula disse que prefere um caminho mais viável para uma aliança contra o bolsonarismo.

    Em sua opinião, os partidos deveriam lançar candidatos próprios para o primeiro turno da votação e formarem um pacto de apoio mútuo para o segundo turno. O ex-presidente ainda alfinetou o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), dizendo que neste pacto só não pode ser permitido correr do Brasil para não votar, como fez Ciro em 2018, viajando para Paris, na França, e deixando de votar em Fernando Haddad (PT) contra Bolsonaro. 

    “Se você conversar com o Boulos, com o Flávio Dino, com o companheiro Haddad, como o companheiro Ciro Gomes ou se você conversar com outro companheiro eles vão dizer: ‘primeiro temos que construir um programa. Com base nesse programa é que nós vamos construir essa frente ampla a partir da escolha de um candidato’. Aí é que começa o problema. Nós não temos problema de fazer um programa, já tem dois programas feitos. Qual é o problema, na hora que você vai fazer uma frente ampla, você precisa juntar PT, PCdoB, PSOL, PDT, PSB, e botar uma direção que coordene os partidos políticos sem abrir mão da autonomia dos partidos. Essa coordenação terá que ser proporcional ao tamanho de cada partido e terá que se escolher quem é o coordenador dessa frente ampla. Aí essa frente ampla pode surgir sem ferir a autonomia dos partidos. É como se fosse uma instância superior aos partidos políticos respeitando os partidos. Na hora que você escolher o candidato, você tem que escolher qual é o critério. Estou dizendo isso para mostrar a dificuldade de montar uma frente ampla”.

    “No primeiro turno cada partido tem o direito de lançar candidato, defender seu programa, se apresentar para a sociedade e vai haver uma aferição da sociedade. Aquele que for escolhido entre nós terá mais votos e será o representante dos demais. É a forma mais tranquila de construir uma aliança política. A única coisa que não pode é, quando terminar o primeiro turno, eu ir embora do Brasil e não querer votar. Tem que ter um pacto, uma política de não agressão, de comportamento civilizado no primeiro turno, e aí você constrói. Eu apenas estou dizendo o razoável, o acúmulo de experiência política que já passamos no Brasil”, explicou.

    Acerca da declaração de Haddad sobre “colocar o bloco na rua” que ganhou a imprensa, Lula esclareceu que não lançou o companheiro de partido como candidato a 2022, mas o aconselhou a não ficar parado, dada sua importância no cenário político nacional. “Eu falei: ‘Haddad, de todas as pessoas que estão se colocando como candidatas, você é o único que tem um passaporte diplomático com 47 milhões de assinaturas para viajar esse país, para defender o PT, para defender a educação que você tanto criou, para defender a nossa política econômica. Você não precisa pedir favor, Haddad. Você saiu de 2018 com 47 milhões de votos. Você tem mais autoridade que o Ciro, tem mais autoridade que qualquer um para fazer isso, Haddad. Não fique esperando, pedindo licença. Vá a luta, meu filho’”.

    “Isso não quer dizer que eu lancei o Haddad. Quem lança é o partido”, acrescentou.

    Perguntado se seria candidato, Lula falou que aceita o desafio caso seja necessário e uma vontade das esquerdas, mas deixou claro que não lutará pela vaga e muito menos se aposentará. “Eu não tenho necessidade de ser candidato. Eu já fui presidente e tenho certeza que fui o melhor presidente que esse país já teve. Eu não vou disputar com ninguém. Se chegar na época de disputar as eleições e os nossos parceiros de esquerda entenderem que eu posso ter viabilidade de ganhar do Bolsonaro e quiserem que eu seja candidato, eu serei com o maior prazer, mas não vou brigar para ser. Acho que já cumpri com a minha tarefa e acho que posso continuar fazendo isso viajando o Brasil”.

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