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    O processo que resta: ação sobre compra de caças suecos é última contra Lula, e a mais frágil

    Acusação é a única remanescente de mais de 15 ações propostas pela Lava Jato contra o ex-presidente

    (Foto: Reprodução)
    Gisele Federicce avatar
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    Vinícius Segalla e Thales Schmidt, Brasil de Fato - No dia 20 de setembro deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) defendeu que siga aberta ação penal contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por ter cometido suposto tráfico de influência em troca de dinheiro na compra, pelo Estado brasileiro de 36 aviões-caça de uma empresa sueca, quando já não era presidente da República. 

    É este o último processo que resta aberto contra Lula, que, nos últimos anos, teve propostas contra si pelo menos 18 aberturas de inquérito, indiciamentos e ações penais, passou 580 dias preso, teve seus direitos políticos cassados, foi impedido de ser candidato e a até de conceder entrevistas durante o período eleitoral de 2018, tendo sido impedido, inclusive,  de acompanhar o sepultamento de um irmão.

    Atualmente, na acusação que resta e que o Ministério Público ainda escuda, Lula, que deixou o cargo de presidente em 2010, exerceu ou "fingiu poder exercer" predominante tráfico de influência que levasse o governo brasileiro a adquirir caças de uma companhia sueca em detrimento das outras duas que concorriam no processo brasileiro de aquisição de aeronaves de defesa.

    No processo penal, o MPF-DF acusa Lula de ter “vendido” a falsa ideia de que teria como influenciar o governo Dilma Rousseff para ela este comprasse 36 aviões-caça da empresa sueca SAAB, e não da companhia francesa Dassault que com ela ainda competia -- a outra concorrente, a norte-americana Boeing, já havia deixado o certame.

    Tudo ocorria dentro de um intrincado processo de compra de equipamentos militares pelo Estado brasileiro, que vinha sendo negociado desde o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e cuja conclusão só se deu no governo Dilma, em agosto de 2015.

    Na ação, os procuradores afirmam que o ex-primeiro-ministro da Suécia, Stefan Löfven, teria tentado marcar uma reunião com o ex-presidente Lula no final de 2013, e que essa reunião seria para que Lula usasse de sua influência no governo Dilma para convencê-la a comprar os caças suecos.

    Os procuradores alegam ainda que o mandatário sueco (que, à época, ainda não era primeiro-ministro daquele país), teria escrito uma carta a Lula pedindo que ele "fizesse este favor".

    Isso é o que alega o MPF-DF. Na acusação, porém, não consta qualquer comprovação de que a carta sequer tenha chegado a Lula, conforme apontado em processo pela defesa do ex-presidente, tampouco explica como teria sido possível ou se dado o arranjo ilegal entre o presidente a empresa. Como o ex-presidente teria intercedido junto ao governo federal para que a compra se efetivasse?

    A peça acusatorial do MPF não traz essas respostas, mas sugere um motivo para que a empresa norte-americana tenha deixado o processo concorrencial antes de seu término: "O fator determinante na opção da ex-presidente [Dilma Rousseff] parece mesmo ter sido a crise dela com o então presidente americano, Barack Obama, a partir de documentos vazados por Edward Snowden”.

    “O processo de aquisição dos caças Gripen NG (o produto sueco) foi permeado de apuro técnico e atenção às questões econômico-financeiras e à situação fiscal do país. A complexidade de fatores envolvidos não permite que justificativas singelas elaboradas pela acusação expliquem o processo decisório. Assim, é pouco relevante a contribuição do Parquet (Ministério Público) ao emitir opiniões rasas sobre temas que fogem de sua alçada", foi a resposta, no mesmo processo, da defesa de Lula sobre a peça acusatória.

    A renovação da frota de caças da Força Aérea Brasileira (FAB) é um projeto de longa data, cujo embrião remonta ao governo de José Sarney, e carrega uma importante decisão geopolítica. A avaliação é do professor da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap) Alcides Peron.

    “A compra de armamentos não é a compra de um produto qualquer, ela obedece conjuntos de interesses e alinhamentos geopolíticos muitos sólidos, importantes e sensíveis”, afirma o pesquisador ao Brasil de Fato.

    Peron estudou o programa FX-2 da FAB, como a compra de caças pelo Brasil foi batizada, em seu mestrado na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e ressalta que os suecos da SAAB foram escolhidos porque ofereceram o melhor offset, termo usado para tratar do pacote de compensações que acompanha a negociação. A venda dos caças Gripen prevê a produção de peças da aeronave no Brasil, pela Embraer, além do treinamento de pessoal e transferência de tecnologia. 

    “A gente não pode pensar que é só o governo ou três, cinco ou dez militares em uma salinha discutindo isso, não. Você tinha participação ativa da indústria nacional, setores da Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], setores de defesa amplamente engajados nesse processo”, avalia Peron.

    É nesse contexto que a então secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, visitou o Brasil em 2010 e defendeu a compra de caças da Boeing. E a embaixada estadunidense no Brasil emitiu nota defendendo a compra dos caças F-18. Além disso, Donna Hrinak, embaixadora dos EUA no Brasil de 2002 a 2004, é presidente da Boeing no Brasil desde 2011.

    Os Estados Unidos, contudo, nunca estiveram perto de fechar o contrato com o governo brasileiro. A escolha ficou entre os franceses da Dassault, como os favoritos da disputa, e os suecos da SAAB, avalia o professor da Fecap.

    Em 2013, um episódio contribuiu para diminuir as chances da Boeing: a revelação feita por Edward Snowden de que os EUA espionaram a então presidenta Dilma Rousseff e a Petrobras, além de outros líderes mundiais como a chanceler alemã Angela Merkel.

    “O episódio do Edward Snowden ajuda a abalar um pouco as relações entre Brasil e EUA, mas naquele momento a escolha do caça norte-americano já estava escanteada há muito tempo porque era muito fajuto o que eles ofertavam como offssets e uma compra como essa exige um conjunto de benefícios, porque se trata de um alinhamento geopolítico.”

    A previsão é de que a Justiça Federal no DF decida ainda este ano pela continuação ou não da ação penal.

    Edição: Leandro Melito

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