A morte, como solução barata, serve de trampolim político às polícias, analisa cientista política e antropóloga Jacqueline Muniz
A pesquisadora mencionou o assassinato da ex-vereadora Marielle Franco
247 - Doutora em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IUPERJ), vinculado à Universidade Candido Mendes (1999), e mestre em Antropologia Social pelo Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jacqueline Muniz alertou para a existência do chamado "mercado da morte" principalmente em áreas periféricas do estado do Rio de Janeiro.
A estudiosa mencionou o assassinato da ex-vereadora Marielle Franco (Psol) ao dizer que o homicídio "foi uma elevada mercadoria política, extremamente valorizada". A entrevista foi concedida ao Instituto Humanitas Unisinos.
"A solução 'morte' tem sido uma solução barata. Quem mata tem o mérito de limpar a sociedade do crime. Quem morreu, mereceu. O 'bandido bom é bandido morto' tem elevado a rentabilidade política eleitoral, porque produz queima de arquivo, mata-se a galinha dos ovos de ouro da investigação, do trabalho de inteligência. Mata-se o sujeito que pode dizer como as coisas funcionam, quem está acima dele, quem manda", afirmou a estudiosa, graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
Caso Marielle
A pesquisadora comentou sobre o assassinato da ex-vereadora do Rio Marielle Franco (Psol) e seu então motorista Anderson Gomes, vítimas de homicídio em março de 2018. "A morte da Marielle foi uma elevada mercadoria política, extremamente valorizada. A morte dela custou muito caro, porque foi um presente para alguns, um pagamento de dívida para outros e produziu benefícios políticos. Nós precisamos compreender e envolver as autoridades. Como sabemos, este não é o primeiro assassinado político no Rio de Janeiro. Nos últimos anos, tivemos mais de 50 entre vereadores, outros políticos e associados", continuou.
O próprio Ronnie Lessa é um matador assim como Adriano [da Nóbrega], que foi assassinado, era um matador, ambos saídos da polícia com um lastro e uma blindagem política. Portanto, a impunidade é uma mercadoria política de elevado valor. Por isso eu digo que a assassinato da Marielle foi um presente. Neste caso, a família Bolsonaro [foi presenteada], porque naquele momento o Jair Bolsonaro patinava nas eleições.
“Esse caso é exemplar, tragicamente exemplar, que foi tratado pelos governantes, em função dos seus oportunismos políticos e do seu populismo penalista. O tema foi tratado como série da Netflix, porque produz o medo. Se há uma coisa que é dramática, é subordinar o tempo tático da polícia ao tempo político. O tempo político da exibição de produtos funciona numa lógica, o tempo investigativo é outro. Quando você subordina o tempo tático da polícia às exigências do político, dá em 174, a vítima sai morta”.
Crime e Estado
A antropóloga afirmou que "existe uma indústria da insegurança". "É por isso que há o discurso do 'tiro, porrada e bomba', é por isso que existe uma guerra contra o crime. Faz-se a guerra contra o crime para vender a paz da propina, a paz do arrego, a paz do cemitério, para subir o preço do alvará, do arrendamento dos territórios, e para subir o preço de funcionamento da firma criminosa. Toda empresa criminosa, digamos assim, todo “CNPJ criminoso”, tem ao lado o Estado, seja o PCC [Primeiro Comando da Capital] em São Paulo, seja o CV [Comando Vermelho], o Terceiro Comando ou as milícias", disser.
"Não há como atravessar um elefante, corpos, órgãos humanos, cocaína ou o que quiser sem um carimbador audaz do Estado. Vai ter sempre um carimbador para atravessar fronteiras de um lugar para outro. Precisa ter conhecimento da máquina pública, precisa conhecer, ter conhecimento do funcionamento das burocracias, de modo que temos aqui vários grupos armados que disputam território".
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