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    Política de segurança pública do Rio é entrar com milícia ou atirar na 'cabecinha', diz analista

    De acordo com Pedro Barreto Pereira, professor do Núcleo de Estudo em Políticas Públicas e Direitos Humanos da UFRJ, avalia que "a política de segurança pública no Rio de Janeiro atualmente, se é que podemos chamar assim, são as milícias, que é o Estado presente [...]. Outro pilar da segurança do Rio é "o tiro na 'cabecinha'", diz ele

    Pesquisador Pedro Barreto Pereira e uma operação policial do Rio (Foto: Reprodução | Ricardo Moraes/Reuters)

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    Agência Sputnik - A Sputnik Brasil conversou com professor do NEPP-DH/UFRJ e autor do livro "Notícias da pacificação: outro olhar possível sobre uma realidade em conflito" sobre as UPPS e a segurança pública no Rio de Janeiro.

    A chacina do Jacarezinho, que vitimou 28 pessoas e se tornou a mais letal do Rio de Janeiro, completou quarta-feira (6) cinco meses e permanece impune. O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) criou uma força-tarefa, mas o órgão ainda não concluiu as investigações.

    Dias após a chacina, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), prometeu um novo projeto de segurança pública para ocupar as comunidades do estado. Castro afirmou que o programa seria diferente das Unidades de Polícia Pacificadora e acrescentou que os moradores teriam cursos profissionalizantes e outros serviços. O programa segue em fase de planejamento.

    A Sputnik Brasil conversou com Pedro Barreto Pereira, professor do Núcleo de Estudo em Políticas Públicas e Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NEPP-DH/UFRJ) e autor do livro "Notícias da pacificação: outro olhar possível sobre uma realidade em conflito", sobre as UPPS e a segurança pública no Rio de Janeiro.

    Ascensão e queda das UPPs

    No dia 19 de dezembro de 2008, o Morro Santa Marta, em Botafogo, ganhava a primeira UPP do Rio de Janeiro. O programa foi lançado durante o primeiro governo de Sérgio Cabral e chegou a ter 38 postos, com um efetivo total de cerca de 9.500 policiais atuando em 264 áreas.

    "Até 2011, os investimentos foram vultosos, mas com a saída de alguns investidores, com a quebra [do empresário] Eike Batista, em 2012, 2013, voltou a ter a volta do aumento de casos de tiroteio e homicídios nessas favelas, mas o governo federal, estadual e a prefeitura quiseram manter a aparência de normalidade para a Copa do Mundo de 2014, porque era um projeto de venda da cidade, isso ficou claro depois", afirma Pedro Pereira.

    O especialista acrescenta que para quem era de fora o projeto pode ter tido a aparência de sucesso, mas para quem morava nas áreas ocupadas desde cedo ficou claro que não haveria melhora.

    "Quando houve a ocupação do Morro do Alemão em 2010, alguns dias depois já tinham casos da polícia extorquindo a população", relata.

    De acordo com o professor, esse projeto de venda da cidade permanece até o fim dos Jogos Paralímpicos, no Rio de Janeiro, em 2016, quando o secretário de Segurança Pública do estado, José Mariano Beltrame, deixa a pasta e o governador Luiz Fernando Pezão anuncia que o governo não tem recursos para investir nas UPPs.

    "Elas [UPPs] são abandonadas, como aconteceu com outras políticas de segurança pública anteriores, [como o] Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais [GPAE], na época do [governador Anthony] Garotinho. Quando [o governador Sérgio] Cabral assume, ele acaba com o GPAE e cria outra política em segurança pública com o nome e marca dele. Isso é praxe no Brasil, a política pública é de governo e não de Estado, como deveria ser. Quem entra mantém o mesmo padrão, mas muda o nome e fala que ele inventou a roda. Foi o que aconteceu também com as UPPs", aponta Pereira.

    Tripé da política de segurança pública atual

    O professor do NEPP-DH/UFRJ sublinha que, formalmente, as UPPs continuam, embora algumas tenham sido descontinuadas e outras fundidas, e estão sem investimento, de forma que elas perderam eficiência e eficácia.

    "A política de segurança pública no Rio de Janeiro atualmente, se é que podemos chamar assim, são as milícias, que é o Estado presente [...]. Outra é a Segurança Presente, parceria público-privada do governo do estado com a Fecomércio", começa por explicar o especialista.

    A Segurança Presente realiza o policiamento em algumas regiões com policiais militares que, mediante gratificação, atuam quando estariam de folga. Aterro do Flamengo, Lagoa, Méier, Lapa e Centro são algumas das zonas que a Segurança Presente atua.

    Para o especialista, a Segurança Presente segue a mesma lógica miliciana: "A diferença é que a chantagem e a intimidação são mais sutis". Ele acrescenta que miliciana tomou conta do estado e tem apoio da população.

    Citando estudo do feito pelo Grupo Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), o datalab Fogo Cruzado, o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), a plataforma Pista News e o Disque-Denúncia, Pereira destaca que 57,5% do território da capital fluminense é controlado por milícias, contra 15,4% sob controle do tráfico de drogas.

    "As intervenções policiais [atualmente] ocorrem principalmente em locais ocupados pela [organização criminosa] Comando Vermelho e as favelas ocupadas por milícias não são alvos de operações porque existe um projeto político e econômico do controle das milícias para que esse domínio de [cerca de] 60% seja expandido", afirma Pereira.

    Além das milícias e da Segurança Presente, na avaliação do professor, o "terceiro pé do tripé" da política de segurança pública do Rio de Janeiro seria "o tiro na 'cabecinha'".

    A frase é uma referência a uma declaração do então candidato a governador Wilson Witzel, em 2018, que afirmou em entrevista: "A polícia vai fazer o correto: vai mirar na cabecinha e... fogo!". Witzel foi eleito governador do Rio de Janeiro com 59,87% dos votos.

    "No lugar onde não podemos entrar com a milícia e não interessa implementar o Segurança Presente, é tiro na 'cabecinha', mata essas pessoas todas", comenta o especialista.

    Pereira não é muito otimista e não enxerga uma solução a curto prazo, recordando que essa lógica miliciana tem aval da população. Ele conclui afirmando que vivemos em uma necropolítica, termo cunhado pelo filósofo camaronês Achille Mbembe e que caracteriza a gestão de um país ou território com a política da morte ou promoção da morte.

    ​"Outros autores dizem que [a conjuntura atual] é uma fase do capitalismo que estamos vivendo, que diz que tem que matar as pessoas descartáveis."

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