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    Carla Teixeira

    Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em História Membro do Conselho Editorial da Revista Temporalidades - Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG

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    8M: tire sua misoginia do caminho que nós vamos passar com a Revolução

    O feminismo é a salvação para sermos 'socialmente iguais, humanamente diferente e totalmente livres', afirma a colunista Carla Teixeira ao citar Rosa Luxemburgo

    Filósofa Rosa Luxemburgo, de chapéu (1871-1919), e um ato pelo fim da violência contra mulheres (Foto: Fernando Frazão/EBC)

    O 8 de março é marcado como o dia internacional de luta das mulheres por direitos e dignidade. As históricas mobilizações de mulheres resultaram em conquistas como o direito de voto, melhores salários e proteção específica do Estado para casos de violência. Apesar dos inúmeros avanços, ainda há um longo caminho até que o machismo, a misoginia, o capitalismo e o patriarcado deixem de exercer seu poder destrutivo sobre os corpos das mulheres e de outras minorias.

    No caso do Brasil, a violência de gênero está atrelada à violência colonial e à escravidão. Como mostrou o Projeto DNA BRASIL, cerca de 75% dos brasileiros foram concebidos ou possuem genomas indicando a prática do estupro de mulheres pretas e indígenas por homens brancos europeus. Está em nosso DNA o que a história nos conta: o papel dessas mulheres era gerar filhos para os homens brancos e cuidar do trabalho doméstico não remunerado.Atualmente, as mulheres dedicam, em média, 10,4 horas a mais por semana do que os homens nas tarefas de casa. O Brasil é o país com o maior contingente de empregadas domésticas em todo o mundo: são mais de 5.7 milhões de mulheres desempenhando esse trabalho de forma precarizada. Essas trabalhadoras, em sua maioria, são pretas, indígenas e pobres.

    Assim, não adianta dizer-se de esquerda, lutar contra o capitalismo e a violência da direita, mas não limpar o próprio vaso sanitário. Esta é uma crítica que vale para todos os homens, mas também para algumas mulheres brancas que utilizam do seu lugar de privilégio na cadeia econômica para explorar outras mulheres em condições de vulnerabilidade.

    O golpe de 2016, na prática, representou um grande retrocesso para os direitos das mulheres brasileiras. Deixamos de ter uma presidenta cujo perfil inspirava independência para ter de engolir o estereótipo submisso da “bela, recatada e do lar” encarnado pela esposa do presidente golpista e exaltado pela grande mídia burguesa. A partir de então a misoginia ganhou força, assim como os movimentos de extrema-direita como Redpill e Incel, formados por homens que não têm receio de expressar seu ódio às mulheres.

    Como apontou a pesquisadora Valeska Zanello, a misoginia é tão naturalizada em nosso país que não se dá o nome correto em suas manifestações. A imposição de determinado ideal estético sobre os corpos das mulheres – que muitas vezes são obrigadas a estarem maquiadas ou de salto alto durante toda a jornada de trabalho – nada mais é do que misoginia. Ela chama a atenção que no Brasil o racismo, a homofobia e a transfobia são crimes, mas a misoginia, não. Ou seja, a violência de gênero segue amparada pela ausência de uma lei que tipifique crimes cotidianos sofridos pelas mulheres brasileiras.Essa situação de violência explodiu durante o governo Bolsonaro com o aumento vertiginoso de estupros, feminicídios e violência doméstica. A pandemia ampliou o fosso da desigualdade de gênero. O papel de cuidadora expôs as mulheres a um risco aumentado de contrair Covid-19. Constituindo a maioria dos profissionais de saúde, as mulheres estiveram na linha de frente nos cuidados sanitários e representaram 72% de todos os casos de covid entre profissionais da saúde nas Américas.

    É evidente que a derrota eleitoral do genocida e a chegada de Lula à presidência da República poderá mudar o trajeto que ampliou essa desigualdade. As 29 ações anunciadas pelo governo neste 8 de março representam quase 1 bilhão do orçamento de 2023 e é apenas o primeiro passo para corrigir as violências sofridas pelas mulheres nos últimos anos.

    No entanto, é preciso ter em perspectiva que sem uma legislação pujante, as mulheres seguirão ganhando menos que os homens ao desempenhar as mesmas funções e se manterão excluídas da política. Apesar do aumento de mulheres no Poder Legislativo, ainda estamos longe da paridade de gênero e representamos menos de 20% do total de integrantes do parlamento, apesar de sermos 53% da população brasileira.

    É necessário fazer crescer a organização e a participação das mulheres na política e nos espaços de decisão institucional, rompendo com as práticas violentas seculares que nos oprimem. A luta de classes tem rosto feminino, com as mulheres pretas e indígenas assumindo a linha de frente no processo de libertação dos corpos e das mentes aprisionadas pelo patriarcado e pelo capitalismo.

    Num mundo em que a masculinidade branca normativa propaga guerras, mortes e a iminente destruição do planeta, o feminismo aparece como tábua de salvação da humanidade para a construção de um mundo em que sejamos “socialmente iguais, humanamente diferente e totalmente livres”. Feliz dia de Luta a todas as mulheres trabalhadoras! “Feliz” para comemorar as conquistas históricas; “Luta” porque ainda temos muito o que avançar.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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