A arma tem sido a intolerância
"Não precisamos desmerecer os nossos adversários; não precisamos ignorar a ótica deles; e, sobretudo, não precisamos ser intolerantes", diz Maura Montella
Nas redes sociais, quando escrevo algo que julgo ser sensacional, recebo uma meia dúzia de curtidas; quando escrevo coisas, na minha opinião, menos significativas, recebo mais de mil.
O que quero postar hoje, ainda nem arrisquei; temo ser cancelada ao dizer o que penso. É que nos últimos dias tivemos pelo menos três polêmicas, que, para minha surpresa, suplantaram a dita polarização entre direita e esquerda. Foram elas: Zé de Abreu × Frota; bolsonaristas × Alexandre de Moraes; e torcer pela Seleção × Neymar. Quem me conhece sabe muito bem da minha posição, do meu drama e da minha luta, o que me dá estofo suficiente para opinar, mas ainda assim temo ser vítima da intolerância que vem reinando nos meios digitais.
Com todos os riscos de um resumo, vou tentar resumir os três casos. POLÊMICA 1: Frota, que foi bolsonarista aguerrido e virou lulista ferrenho, foi chamado para compor o governo de transição na área da cultura. Zé de Abreu, inconformado, fez vários tuítes dizendo que Frota não entendia de cultura e que sua nomeação era um desrespeito à classe artística. Com admirável tranquilidade, Frota declinou do convite. Quando parecia que a polêmica tinha acabado e que só tinha restado, como disseram, a "agressividade e intolerância" do Zé, Frota postou um tuíte dizendo que Zé de Abreu não tinha o controle de nada, nem sequer de seu filho que cometeu suicídio.
POLÊMICA 2: Os bolsonaristas não sabem o que é democracia e, exatamente por isso, não entendem que, numa democracia, às vezes se ganha e às vezes se perde. Eles não aceitam a derrota para Lula. O PL, partido do atual presidente da República, entrou com uma esdrúxula ação no TSE pedindo anulação das eleições, mas, pasmem, anulação só do segundo turno!!! Alexandre de Moraes, presidente do TSE, disse que, para aceitar a ação, o PL teria que incluir o questionamento ao primeiro turno também. O PL não o fez e tomou uma multa de coincidentes 22 (número do partido) milhões de reais.
POLÊMICA 3: Depois do sequestro, pelo atual governo, dos símbolos nacionais, como a bandeira do Brasil e a camisa da Seleção, ficou mais difícil se envolver com a Copa do Mundo e com a premiada Seleção Canarinho. Para completar, Neymar, o camisa 10 da Seleção, é um craque, mas, na mesma proporção, é mimizento, arrogante e, pior, bolsonarista. Neymar, em toda a sua empáfia, prometeu fazer um gol e dedicá-lo a Bolsonaro, num apoio explícito aos movimentos golpistas e antidemocráticos que pipocam pelo País. Para não assistirem a essa cena medonha, torcedores do campo dito “democrata” decidiram torcer para que o Neymar se machucasse e não participasse de mais nenhum jogo na Copa.
Na boa, não sou santa, impoluta, dona da verdade, conselheira ou qualquer coisa parecida, mas, convenhamos, gente, até quando vamos combater a intolerância com intolerância?
Zé de Abreu foi intolerante ao desqualificar o Frota; Frota foi intolerante ao trazer à baila um tema (o suicídio) que nunca, mas nunca deveria ser tratado com tamanha superficialidade.
Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, quis dar uma de esperto e se ferrou, mas, pelos motivos que explicito no meu livro
(https://clubedeautores.com.br/livro/era-so-para-envolver-o-lula-na-zelotes),
fui uma das mais ferrenhas defensoras de que Moro jamais, em hipótese alguma, poderia julgar Lula. Moro estava por demais envolvido emocionalmente para conseguir ser imparcial. Por mais que eu acredite nos conhecimentos jurídicos de Moraes, por mais que eu acredite que ele esteja fazendo o certo, não posso simplesmente tapar os olhos e ignorar que, sob a ótica dos bolsonaristas, Moraes está sendo, sim, parcial.
Por fim, com relação ao Neymar, e colocando os memes à parte, porque me divirto muito com eles, não há Cristo nem anticristo que me leve a desejar a dor física ou a morte a alguém.
Quando eu estava escrevendo o roteiro de um longa-metragem de tribunal, chamado O ALVO (previsão de lançamento no final de 2023), me inspirei no Dallagnol e acabei criando um procurador idiota e patético, e um advogado de defesa muito inteligente e astuto. Então, o diretor Leonardo Domingues, que é também um dos roteiristas, me advertiu: o espectador não quer ver um jogo entre o Flamengo e um time da terceira divisão; o espectador quer ver um Fla-Flu! Então, eu “consertei” o personagem e criei um procurador tão inteligente e astuto quanto o advogado.
Moral da história: temos munição para bater um bolão. Não precisamos desmerecer os nossos adversários; não precisamos ignorar a ótica deles; e, sobretudo, não precisamos ser intolerantes nem com eles nem com ninguém.
Era sobre isso que eu queria falar, a despeito das críticas e dos likes que virão (ou não virão). Agora está dito.
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