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    Emir Sader

    Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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    A hegemonia do capital improdutivo

    'Os fluxos financeiros para os países mais pobres financiam os mais ricos, através do sistema financeiro internacional', escreve o sociólogo Emir Sader

    Pobreza, dinheiro e a Bolsa de Valores (Foto: ABr)

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    A lógica da acumulação de capital mudou. O neoliberalismo fez com que o capital entrasse numa era de capital improdutivo. Historicamente, habituamo-nos a identificar o capital com a produção de riqueza. Nas últimas décadas, a riqueza social produzida pelo trabalho foi capturada pelo capital financeiro.

    Não é a falta de recursos financeiros que gera as dificuldades atuais, segundo o economista brasileiro Ladislau Dowbor, mas sim a sua apropriação pelas corporações financeiras, que os utilizam para especular em vez de investir. O sistema financeiro começou a utilizar e a drenar o sistema produtivo em vez de o energizar.

    Mesmo antes da pandemia, as desigualdades sociais no mundo já eram brutais: oito indivíduos possuíam mais riqueza do que metade da população mundial, enquanto 800 milhões de pessoas sofrem de fome. O 1% mais rico tem mais recursos do que os 99% restantes. O aumento da riqueza nos EUA deve-se basicamente aos investimentos financeiros. Desde a década de 1980, o capitalismo entrou na fase de domínio da intermediação financeira sobre os processos produtivos.

    No entanto, só a partir da crise de 2008 é que os mecanismos que produzem desigualdades e a apropriação financeira da riqueza se tornaram mais claros. Tornou-se mais evidente que as grandes fortunas do mundo estão nas mãos de quem administra os papéis financeiros. “A financeirização dos processos produtivos tem sido alimentada há décadas pela apropriação de ganhos de produtividade, possibilitados essencialmente pela revolução tecnológica.” (Ladislau Dowbor)

    Os investimentos financeiros rendem mais do que os investimentos produtivos. O PIB mundial cresce em média entre 1 e 2,5% ao ano, enquanto os investimentos produtivos rendem acima de 5% e muitas vezes muito mais. Existe uma dinâmica de transformação do capital produtivo em ativos financeiros, sendo a economia real vítima da financeirização.

    Da mesma forma, os recursos não declarados, colocados em paraísos fiscais, recursos que não pagam impostos, chegam a 32 trilhões de dólares, quando o PIB mundial era de 80 trilhões de dólares. Os fluxos financeiros para os países mais pobres significam que financiam os mais ricos, através do sistema financeiro internacional.

    Os paraísos fiscais são uma espécie de bordéis do capitalismo internacional, contribuindo decisivamente para o processo de acumulação de capital. Os países pequenos alugam a sua soberania aos processos de especulação financeira, que não pagam os impostos que pagariam nos seus países de origem. Neles o capital é reciclado para diversos usos, repassado a empresas com outros nomes e outras nacionalidades, lavado e limpo formalmente, livre de qualquer tipo de imposto. É um sistema que normalmente não acrescenta valor, pelo contrário, redistribui a riqueza para cima e arrisca para baixo.

    O Brasil participa com algo em torno de 530 bilhões de dólares, o equivalente a 27% do PIB. Não é a falta de recursos que afeta o mundo, mas sim o seu descontrole ou controle apenas por aqueles que não têm interesse em torná-lo social e economicamente útil.

    Os recursos são multiplicados pela imensa renovação tecnológica do mundo, mas não são os produtores que se apropriam desses recursos. Pelo contrário, as esferas pública e empresarial estão em dívida com o sistema financeiro. É um processo global de financeirização da economia.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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