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      Oliveiros Marques

      Sociólogo pela Universidade de Brasília, onde também cursou disciplinas do mestrado em Sociologia Política. Atuou por 18 anos como assessor junto ao Congresso Nacional. Publicitário e associado ao Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), realizou dezenas de campanhas no Brasil para prefeituras, governos estaduais, Senado e casas legislativas

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      A lei da liberdade de golpe

      Chamam isso de “pacificação nacional”. Mas o nome certo é outro: autogolpe legislado

      Atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

      Imagine uma lei tão escandalosa que faria até os fantasmas da Velha República arregalarem os olhos. Pois é exatamente isso que está em curso no Congresso: o Projeto de Lei 2.858, do sempre prestativo à peripécias Major Vítor Hugo (PL-GO), com relatoria de Pedro Valadares (UB-SE). O nome é técnico, o conteúdo é um escândalo em forma de papel timbrado. É o pacote completo da impunidade — o “Bolsolivre”, com anistia ilimitada, direitos políticos restaurados e um “passe golpista vitalício” para quem tentou enterrar a democracia debaixo de uma lona verde e amarela.

      Para começo de conversa, o projeto não só perdoa os golpistas do 8 de janeiro, mas estende o abraço da anistia a quem financiou, planejou, incitou e bateu palminha nos grupos de WhatsApp desde, pasme, março de 2021. Inclui o desfile patético de 7 de setembro, a espionagem da Abin, a reunião com embaixadores — aquele PowerPoint de quinta categoria — e o bloqueio de rodovias para impedir o voto em Lula.

      Mas calma que piora. O texto manda suspender todas as ações em curso, proíbe a polícia de investigar, o Ministério Público de denunciar, e ainda ameaça juízes com a pecha de “abusadores de autoridade” caso insistam em aplicar a lei. Uma beleza: se julgar golpista vira crime, o crime deixa de existir. É a inversão perfeita, redonda, maquiada com a caneta da desfaçatez.

      E tem mais: altera o Código Penal para que só exista crime contra o Estado Democrático de Direito se alguém for agredido pessoalmente e com eficácia. Ou seja, se o golpe for educado e sem soco na cara, tá liberado. E ainda extingue o crime “multitudinário”, aquele usado pra responsabilizar as turbas que invadiram Brasília em janeiro. Em resumo: se o quebra-quebra for coletivo, ninguém é culpado. É a doutrina da “baderna em grupo não dá em nada”.

      A cereja dessa feijoada golpista é a devolução dos direitos políticos de Jair Bolsonaro. Sim, o projeto pretende apagar todas as suas condenações, multas e inelegibilidades com um só parágrafo. Tudo limpinho, como se ele fosse um escoteiro expulso por engano. E ainda garante habeas corpus preventivo para futuros golpistas, caso resolvam repetir a dose.

      Chamam isso de “pacificação nacional”. Mas o nome certo é outro: autogolpe legislado. Um tapa na Constituição com a mão enluvada do cinismo. Se essa lei passar, o recado será claro: o Brasil aceita a tentativa de golpe como quem aceita um pedido de desculpas no Zap. E prepara terreno para o próximo. Porque onde a impunidade se instala, a democracia empacota.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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