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    Pepe Escobar

    Pepe Escobar é jornalista e correspondente de várias publicações internacionais

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    As três principais mensagens de São Petersburgo à maioria global

    "Quando o Ocidente Coletivo lançou uma guerra econômica total contra a Rússia, o estado-civilização inverteu a situação", escreve Pepe Escobar

    Vladimir Putin discursa no SPIEF 2024, em São Petersburgo (Foto: Kremlin.ru)

    No ano da presidência russa dos BRICS, o Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF) tinha que entregar alguma coisa de muito especial.

    E entregou mesmo: mais de 21 mil participantes representando nada menos que 139 países – um verdadeiro microcosmo da Maioria Global, discutindo cada uma das facetas do impulso rumo a um mundo multipolar, multimodal (itálicos meus) e policêntrico.

    São Petersburgo, além de todos os contatos estabelecidos e do ritmo frenético do fechamento de acordos – 78 bilhões de dólares em apenas três dias – produziu três importantíssimas mensagens correlacionadas, que já ressoam por toda a Maioria Global.

    Mensagem Número Um:

    O Presidente Putin, um "russo europeu" e verdadeiro filho dessa deslumbrante e dinâmica maravilha histórica às margens do Neva, proferiu, na sessão plenária do fórum, um discurso extremamente detalhado de uma hora de duração sobre a economia russa.

    A principal conclusão: quando o Ocidente Coletivo lançou uma guerra econômica total contra a Rússia, o estado-civilização inverteu a situação, conseguindo se posicionar como a quarta maior economia do mundo por paridade de poder de compra.

    Putin demonstrou que a Rússia ainda tem o potencial de lançar nada menos que nove mudanças estruturais abrangentes – de escala global – em uma iniciativa ampla envolvendo as esferas federal, regionais e municipais.

    Tudo está em jogo – do comércio e mercado de trabalho globais até plataformas digitais, tecnologias modernas, fortalecimento de pequenas e médias empresas e exploração do fenomenal potencial ainda inexplorado das regiões russas.

    O que ficou perfeitamente claro foi que a Rússia conseguiu se reposicionar, indo muito além de apenas se evadir do tsunami de sanções ilegítimas, para criar um sistema sólido e diversificado, orientado para o comércio global – e totalmente vinculado à expansão dos BRICS. Os estados simpáticos à Rússia já respondem por três-quartos do volume de negócios de Moscou.

    A ênfase colocada por Putin na aceleração do impulso da Maioria Global rumo ao fortalecimento de sua soberania liga-se diretamente ao fato de o Ocidente Coletivo dar o melhor – ou o pior – de si para solapar a confiança em sua própria infraestrutura de pagamentos.

    O que nos leva a…

    Glazyev e Dilma sacodem o barco.

    Mensagem Número Dois:

    É possível afirmar que esse tenha sido o principal avanço em São Petersburgo. Putin declarou que os BRICS estão trabalhando na criação de sua própria infraestrutura de pagamentos, independente das pressões/sanções do Ocidente Coletivo.

    Putin teve uma reunião especial com Dilma Rousseff, presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) dos BRICS. Eles conversaram detalhadamente sobre o desenvolvimento do banco – e acima de tudo, como mais tarde confirmado por Rousseff, sobre A Unidade, cujos contornos foram revelados com exclusividade pela Sputnik: uma forma de pagamentos transfronteiras apolítica e transacional, ancorada no ouro (40%) e nas moedas do BRICS+ (60%).

    No dia seguinte a seu encontro com Putin, a presidenta Dilma teve um encontro ainda mais crucial às dez da manhã, em uma sala privada do SPIEF, com Sergey Glazyev, Ministro de Macroeconomia da União Econômica Eurasiana (UEEA) e membro da Academia Russa de Ciências.

    Glazyev, que anteriormente havia dado plena sustentação acadêmica ao conceito da Unidade, explicou à Presidenta Dilma todos os detalhes. Ambos pareciam extremamente satisfeitos com o resultado da reunião. Uma radiante Dilma Rousseff revelou que já havia discutido A Unidade com Putin. Ficou combinada a realização de uma conferência especial sobre A Unidade no NBD em Xangai, no mês de setembro.

    O que significa que o novo sistema de pagamentos tem todas as chances de ser levado à mesa no decorrer da cúpula dos BRICS, a ser realizada em outubro, em Kazan, e de ser adotado pelos atuais BRICS 10 e, em um futuro próximo, expandido para o BRICS+.

    Agora vamos à ...

    Mensagem Número Três:

    Que, é claro, tinha que ser sobre os BRICS que, segundo todos, Putin inclusive, serão significativamente expandidos. A qualidade das sessões tratando dos BRICS, em São Petersburgo, demonstra que a Maioria Global se confronta agora com uma conjuntura histórica inédita – que traz a possibilidade real de, pela primeira vez em 250 anos, partir decididamente para uma mudança estrutural do sistema mundial.

    E não se trata apenas dos BRICS.

    Ficou confirmado em São Petersburgo que nada menos que 59 países – número que continua aumentando – planejam se juntar não apenas aos BRICS, mas também à Organização de Cooperação de Xangai (OCX) e à União Econômica Eurasiana (UEEA).

    Não é para menos: essas organizações multilaterais agora, finalmente, se firmaram na vanguarda do impulso rumo ao que Putin denominou de "mundo multipolar harmônico" e multimodal (itálicos meus).

    As Principais Sessões para Referência Futura

    Tudo o que foi dito acima pôde ser acompanhado ao vivo no decorrer dos frenéticos dois dias e meio das sessões do fórum. Aqui vai uma amostra das sessões que podem ser vistas como as mais interessantes. Esse material pode vir a ser de grande utilidade como referências futuras – inclusive para a cúpula dos BRICS a ser realizada em outubro e para outros encontros posteriores.

    Sobre a Rota Marítima do Norte e a expansão para o Ártico. O melhor slogan da sessão: "Precisamos de quebradores de gelo!" O cerne da discussão foi a compreensão de que as atuais cadeias de fornecimento do comércio global deixaram de ser confiáveis, e como a Rota Marítima do Norte é mais rápida, mais barata e mais confiável.

    Sobre a expansão empresarial dos BRICS.

    Sobre as metas dos BRICS para uma verdadeira nova ordem mundial.

    Sobre os 10 anos da UEEA.

    Sobre uma maior integração entre a UEEA e a ASEAN.

    A mesa-redonda dos BRICS+ sobre o Corredor Internacional de Trasnsportes Norte-Sul (CITNS).

    Esta última sessão foi particularmente importante. Os principais atores do CITNS são Rússia, Irã e Índia – todos eles membros dos BRICS. Os atores mais periféricos que irão se beneficiar do CTINS, do Cáucaso à Asia Central e do Sul – já estão interessados em se juntar aos BRICS+. Igor Levitin, consultor de primeiro escalão de Putin, foi uma figura central nessa sessão.

    A Parceria da Grande Eurásia (GEP).

    Essa foi uma discussão essencial sobre o que vem a ser um projeto eminentemente civilizacional – em contraste com o enfoque exclusionista do Ocidente Coletivo. A discussão mostra de que forma a GEP se interliga com a OCX, a UEEA e a ASEAN, ressaltando a inevitável complementaridade entre transportes, logística, energia e estrutura de pagamentos por toda a Eurásia. Glazyev, o Primeiro-ministro Adjunto Alexey Overchuk e a antiga ministra das relações exteriores austríaca Karin Kneissl – sempre ultra-afiada – foram participantes de primeira importância. Um surpreendente bônus adicional: Adul Umari, Ministro do Trabalho e exercício do Afeganistão talibã, interagindo com seus parceiros eurasianos.

    Sobre a filosofia da multipolaridade.

    Em termos conceituais, essa sessão interage com a sessão sobre a Parceria Grande Eurásia. Ela oferece a perspectiva de um conciso diálogo intercivilizacional no âmbito dos BRICs+. Alexander Dugin, a irreprimível Maria Zakharova e o Professor Zhang Weiwei da Universidade de Fudan estão entre os participantes.

    Sobre o Policentrismo. O tema envolve todas as instituições da Maioria Global: BRICS, OCX, UEEA, a Comunidade de Estados Independentes (CIS), a Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO), a Conferência sobre Medidas de Interação e Construção de Confiança na Ásia (CICA), a União Africana, o novo Movimento Não-Alinhado (NAM). Glazyev, Maria Zakharova, o Senador Pushkov e Alexey Maslov – diretor do Instituto de Estudos Asiáticos e Africanos da Universidade Estadual de Moscou – discutem formas de construção de um sistema policêntrico de relações internacionais.

    Enquanto o Projeto Ucrânia Enfrenta a Ruína...

    Por fim, é inevitável o contraste entre o – esperançoso e auspicioso – estado de espírito reinante no Fórum de São Petersburgo e a histeria do Ocidente Coletivo no momento em que o Projeto Ucrânia se vê frente à sua própria ruína. Putin deixou bem claro: a Rússia prevalecerá, aconteça o que acontecer. O Ocidente Coletivo pode requentar a "solução Istambul", como observado por Putin, mas modificado "com base na nova realidade" do campo de batalha.

    Putin, com grande habilidade, também desativou toda a tola e pré-fabricada paranoia nuclear que infesta os círculos atlanticistas.

    Mesmo assim, isso não será suficiente. Nos superlotados corredores do SPIEF, e também em reuniões informais, havia plena consciência do belicismo fantasiado de "defesa" que só faz revelar o desespero do Hegêmona. Aqui, não havia a menor ilusão de que a atual demência posando de "política externa" está apostando em um genocídio, não apenas em benefício do "porta-aviões" do Oeste Asiático mas, principalmente, para forçar a Maioria Global à submissão.

    Isso colocaria a grave possibilidade de a Maioria Global ter que construir uma aliança militar a fim de deter essa Guerra Global planejada.

    A Rússia-China, é claro, mais o Irã e uma defesa árabe com credibilidade, com o Iêmen apontando o caminho: tudo isso tem que se converter em um sine qua non. Uma aliança militar da Maioria Global terá que surgir de uma forma ou de outra: ou antes do desastre, planejado para um futuro próximo, a fim de mitigá-lo, ou após esse desastre ter engolfado por completo o Oeste Asiático em uma guerra monstruosa e maligna.

    É lamentável que talvez estejamos muito próximos a esse ponto. Mas, ao menos, São Petersburgo ofereceu vislumbres de esperança. Putin: "A Rússia será o coração de um mundo multipolar harmônico". É assim que se fecha um discursos de uma hora.

    Tradução de Patricia Zimbres

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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