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Tereza Cruvinel

Colunista/comentarista do Brasil247, fundadora e ex-presidente da EBC/TV Brasil, ex-colunista de O Globo, JB, Correio Braziliense, RedeTV e outros veículos.

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Bolsonaro estimula o "novo cangaço"

Jair Bolsonaro "vem tomando medidas a favor do armamento da população - que supostamente deve cuidar da própria segurança, desistindo da proteção do Estado", afirma Tereza Cruvinel, do Jornalistas pela Democracia. "E com isso turbina a violência, inclusive em novas modalidades, como o 'novo cangaço'", complementa

Jair Bolsonaro (Foto: Isac Nobrega - PR)

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Por Tereza Cruvinel, do Jornalistas pela Democracia

No purgatório em que vivemos no Brasil, afligidos por tantos males, vamos deixando alguns acontecimentos em segundo plano, deixando de conectá-los com suas causas políticas, vale dizer, com a responsabilidade que por eles têm o desgoverno de Jair Bolsonaro. 

Esta semana, por exemplo, bandos armados e violentos aterrorizaram os moradores de Criciúma (SC) e Cametá (PA). Para estourar caixas eletrônicos do Banco do Brasil, eles chegaram em carros blindados, portando armas pesadas, como fuzis exclusivos das Forças Armadas ou importados, gastando munição a rodo para assustar a população. Moradores foram humilhados e usados como reféns ou como escudos. Os vídeos feitos pelos habitantes mostram a similaridades dos métodos. A diferença foi que em Cametá eles acabaram estourando a máquina errada e não conseguiram levar o dinheiro. Mas  deixaram um morador morto na ação.

Estes casos não são isolados. Ações semelhantes já aconteceram este ano em outras cidades do Pará, como Ipixuna, e do interior de São Paulo, como Araraquara e Botucatu. E também no interior de Minas e em alguns pontos do Nordeste. De lá veio o apelido de "novo cangaço" para estas ações violentas e rápidas, com uso de armas pesadas e de explosivos, tomada de reféns e cerco aos quarteis ou delegacias. Assim agiam também, com menor poder de fogo, os cangaceiros que espalharam o terror pelo Nordeste no final do século XIX e começo do século XX. 

Muitas causas têm sido apontadas, como a chegada do final do ano, quando bancos movimentam muito dinheiro, a busca de compensação por quadrilhas ou organizações criminosas que "faturaram" pouco durante a pandemia, entre outras. Mas certo mesmo é que nestas ações chama a atenção o grande volume de armas e explosivos utilizados,  e  a presença de fuzis e outras armas de uso exclusivo das Forças Armadas. E isso tem uma relação clara com a política bolsonarista de flexibilizar as regras para posse, uso e circulação de armas no país.

E onde estavam os órgãos de inteligência (ABIN) e de segurança (Polícia Federal e outras polícias) que não foram capazes de perceber que num mesmo período houve um número enorme de roubos de carros blindados? Ah, estavam muito ocupados, principalmente com a defesa de familiares do presidente, como o encrencado senador Flávio Bolsonaro.  Ou colaborando com a elaboração de listas de antifascistas ou de detratores de ministros do governo.

Nesta quinta-feira, o deputado Eduardo Bolsonaro foi fotografado com uma arma na cintura durante uma visita ao Palácio do Planalto. Entrar armado no palácio presidencial é proibido mas certamente isso deixou de valer para  filhos do presidente. Eduardo não perde chance de fazer proselitismo a favor das armas, seja com gestos ou com declarações.

Desde o início, o governo vem tomando medidas em série para flexibilizar a posse de armas, inclusive as de uso exclusivo das Forças Armadas. Bolsonaro acabou com o controle e o rastreamento de munições, liberou quantitativo maior para compra de munição, e armou e municiou, descontroladamente, os clubes de tiro,  que potencialmente  podem ser usados para armazenagem e distribuição de armas e munição para milícias e para o crime organizado. O "novo cangaço" recebe uma inegável ajuda das medidas tomadas por Bolsonaro.

Em abril passado ele revogou três portarias do Exército, importantes para o controle de armas. A de número 46 estabelecia a criação do SisNaR (Sistema  Nacional de Rastreamento de Produtos Controlados). Neste sistema deveriam ser lançados mais de 380 itens controlados pelo Exército.  Ele revogou também a portaria 60, que previa a identificação e marcação de todas as armas de fogo produzidas no país ou importadas, que passariam a ter inscritos dados como nome do fabricante, país de origem, calibre, número de série, ano de fabricação e modelo. Revogada foi também a portaria 61, que estabelecia mecanismos de controle de embalagens e cartuchos, obrigando os fabricantes e comerciantes a  manter um banco de dados sobre todas as operações, importações, expedições, vendas, movimentação e eventuais sinistros envolvendo munições. Um general do Exército demitiu-se da função em protesto contra a revogação dos controles.

Outra medida armamentista do governo foi o aumento, quantitativo e qualitativo, das armas que podem ser adquiridas por pessoas físicas ou pelos CACs (colecionadores, atiradores e caçadores), o que inclui os clubes de tiro. O ex-sargento Ronnie Lessa, aquele vizinho de condominio de Bolsonaro que está preso e é tido como um dos assassinos de  Mariele Franco,  tinha autorização para comprar armas e munições, pois possuía um certificado de CAC. Outro que tinha a mesma regalia era o miliciano Adriano da Nóbrega, de forte conexão com Fabrício Queiróz e o gabinete de Flavio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio, o vale da "rachadinha".

Estelionato eleitoral também é isso. Bolsonaro, na campanha, prometia jogo duro contra o crime. No cargo, vem tomando medidas a favor do armamento da população - que supostamente deve cuidar da própria segurança, desistindo da proteção do Estado. E com isso turbina a violência, inclusive em novas modalidades, como o "novo cangaço". 

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* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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