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    Eduardo Vasco

    Jornalista especializado em política internacional

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    Brasil não agiu apenas contra a Venezuela, mas contra todo o “Sul Global”

    O governo brasileiro agiu contra os BRICS. Agiu contra os seus parceiros de maior confiança

    Presidentes da Venezuela, Nicolas Maduro, do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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    Por Eduardo Vasco - Os jornais da direita (seus inimigos, mas em quem Lula e o governo confiam mais do que em seus aliados históricos) citam fontes anônimas no Itamaraty dizendo que o Brasil foi “essencial” para barrar a entrada da Venezuela como parceiro oficial dos BRICS.

    O Brasil não foi “essencial”, foi única e exclusivamente ele quem barrou a Venezuela. Há muito tempo havia um consenso sobre o convite à Venezuela e o único que se opôs, no frigir dos ovos, foi o governo brasileiro. Como as decisões fundamentais do bloco são sempre por consenso, se há um único divergente a proposta não é adotada.

    Na verdade, o Brasil se isolou. Mas falo sobre isso daqui a pouco.

    Foi um crime a postura brasileira. Um golpe nos princípios da esquerda, de Lula e do PT. Foi também contra os próprios princípios declarados da diplomacia brasileira, que supostamente prega a não intervenção na política interna de outros países. Mas o voto contra a Venezuela foi uma intromissão nos assuntos venezuelanos, como se Maduro tivesse alguma obrigação de prestar contas ao Brasil ou a qualquer outro país sobre as eleições venezuelanas – decididas, como ocorreu, pelo povo venezuelano.

    Tanto o “veto” à Venezuela como a razão deste foram um golpe também nos princípios dos BRICS. O bloco não integra países em virtude de sua política interna, mas sim de suas aspirações internacionais. E a Venezuela compartilha das aspirações fundamentais declaradas por todos os países do bloco – mais do que outros países a cuja entrada o Brasil não se opôs.

    Lula já falou tanto em acabar com as sanções unilaterais dos Estados Unidos contra a Venezuela, porque elas são o principal motivo da devastação econômica do país, levando à escassez de produtos e serviços básicos e à emigração de tantos venezuelanos.

    Pois bem, os BRICS poderiam reduzir significativamente os efeitos nefastos dessa guerra econômica imposta pelos EUA à Venezuela há mais de dez anos. O acesso de Caracas aos BRICS como parceiro facilitaria a sua integração econômica com seus membros, possibilitaria elevar exponencialmente o volume de investimentos e recuperar o país, econômica e mesmo politicamente. A estabilização da economia conduziria à pacificação política, ao menos relativa, pois diminuiriam as tensões políticas e sociais. Não é justamente nisso que o presidente Lula aposta internamente?

    Se Lula e o governo se preocupam com a situação dos direitos humanos no país vizinho, seria uma obrigação integrar a Venezuela nos BRICS. As causas principais da violação dos direitos humanos dos venezuelanos são a guerra econômica e as tentativas sucessivas de golpes de Estado, que empobrecem o povo e geram uma onda de violência.

    Os BRICS poderiam concretizar aquilo que o presidente Lula limita apenas ao discurso. Fica muito feio para o Brasil, pois parece que tudo o que dizemos ao mundo não passa de demagogia barata.

    E aqui chegamos à questão do isolamento do Brasil. Além de ser o único que se opôs à inclusão da Venezuela como país parceiro, também evidenciou que é contrário à rápida expansão dos BRICS. Assim como no caso da Venezuela, isso denota uma subserviência do governo brasileiro aos interesses dos Estados Unidos, que não querem a expansão do bloco – muito pelo contrário, querem o seu enfraquecimento, enxugamento e destruição.

    Muito bem. Ao tentar agradar os Estados Unidos, o governo brasileiro queima o próprio filme com todos os cerca de 40 países que estão ansiosos para entrar nos BRICS – além das dezenas de outros que também querem se alistar. É uma ação contrária ao “Sul Global”, termo que o próprio presidente tem utilizado, buscando se apresentar como um líder dessa maioria mundial.

    Todos esses países certamente começam agora a ver o Brasil como um parceiro não muito confiável, que diz uma coisa e faz outra.

    Por último, uma aspiração histórica do Brasil é ser membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Típico de um setor mais avançado da burguesia nacional – o outro é abertamente capacho e não quer o Brasil no meio dos grandes. Aquele setor acha que é possível entrar no clube da elite, fazer parte dele de igual para igual, porque o mundo é justo. 

    Ultimamente, o governo Lula tem indicado que já não acha o mundo tão justo assim e exige uma reforma para que o Brasil possa entrar no clube. Entendendo que um exemplo dessa injustiça é o poder quase despótico do Conselho de Segurança da ONU, o presidente quer o fim do poder de veto nas decisões da cúpula. Já criticou os vetos exercidos por Rússia e Estados Unidos.

    No entanto, acaba de vetar, sozinho, a parceria oficial da Venezuela com os BRICS. Fez o que tanto tem criticado os outros de fazer.

    Essa não é uma política soberana, independente, não-alinhada. É um pseudonacionalismo barato que às vezes beira o chauvinismo. Como costuma ocorrer com os chauvinistas, esse jogo está a serviço de uma terceira força, um poder imperialista.

    Durante a campanha, em 2022, Lula disse que a política externa brasileira “nunca permitiu que a gente falasse grosso com a Bolívia ou com o Uruguai, ou qualquer outro país pequeno; mas também nunca permitiu que falasse fino com os EUA”. Isso não é bem verdade, porque em governos lacaios dos EUA o Brasil até enviou tropas como bucha de canhão para a República Dominicana (1965), ou para o Haiti, em pleno Lula 1.

    Mas ele quis dizer que a diplomacia “ativa e altiva” de seu governo não lhe permitiria adotar dois pesos e duas medidas a depender da envergadura do país em questão. Porém, está contradizendo essa norma ao tratar a Venezuela do jeito que está tratando. 

    Isso pode até dar a impressão de que está impondo a sua vontade aos outros. Quando, na verdade, se está agindo como procurador de um outro país.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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