Cultura desata o nó do desemprego
A cultura nos conecta ao sonho e ao talento criativo, característico da experiencia humana. O mapa que indica a direção do crescimento econômico e da paz social está aí, para quem tiver olhos de ver.
O desemprego é substância e alimento das dores mais profundas do Brasil. Tem parte nos alarmantes índices da criminalidade, da violência doméstica, da evasão escolar, da dependência de álcool e drogas, da exploração econômica de idosos, do trabalho infantil. Esse é um nó que não foi desatado com a reforma trabalhista. Pelo contrário: as mudanças na legislação só precarizaram as relações de trabalho. Não foi desatado com a mudança de comando no Planalto Central. Pelo contrário: políticas públicas de garantia de direitos à populações historicamente vulnerabilizadas (as mais atingidas pelo desemprego) têm sido aceleradamente desidratadas. O estudo mais recente do IBGE dá conta de que batemos um recorde histórico: são 28,5 milhões de pessoas subutilizadas no Brasil. Gente prontinha pra trabalhar, que só tem dado com a cara na porta. Muitos já até desistiram de pular de fila em fila, depositando tempo e esperança na assinatura da desbotada carteira de trabalho.
Em relação ao desemprego clássico - que diz mais respeito à semântica do que à que vida real - estacionamos, há quase 3 anos, nos 13 milhões. As teses em favor da renda universal partem do alarme aceso pelo aumento da automação nos processos produtivos e da necessidade de fortalecimento dos Estados sociais. Uma fórmula que desatrelaria o emprego do colchão da proteção. É a aritmética básica da distribuição de renda que evitaria cenas da miséria humana, traduzida, por exemplo, nas mais de 105 mil pessoas vivendo em situação de rua hoje na cidade de São Paulo. Não é difícil engrossar o caldo de quem levanta esta bandeira, quando lembramos que a concentração de renda no Brasil tem contornos obcenos: 6 homens tem a mesma riqueza que os 100 milhões mais pobres do país.
O nó tá aí, engasgando a garganta da gente e, daqui a pouco, a asfixia social contaminará tudo ao redor. E se não há saída pra gerar emprego no médio prazo, há um caminho pra gerar renda já. A resposta está na cadeia produtiva da cultura. As práticas culturais tem seu calendário próprio, respondem a uma dinâmica que independe do estado, são percebidas como valores autênticos da identidade dos territórios e da comunidade, além de envolverem uma quantidade gigantesca de pessoas. A qualificação no setor se abastece, tanto dos saberes empíricos, quanto da oferta de cursos profissionalizantes. E o fato candente: a indústria criativa apresenta a mais auspiciosa curva ascedente no combalido gráfico da economia brasileira. De 2004 a 2013, teve um crescimento de quase 70%; representa cerca de 2,6% do PIB; movimentou em 2017 - segundo estudo da FIRJAN - mais de 170 bilhões de reais, gerando 10 bilhões em impostos e empregando mais de 106 mil pessoas. É gente que pode trabalhar o ano inteiro no restauro do patrimônio, produzindo o carnaval, a quadrilha junina, o longa-metragem, o Boi de Máscara, o Cordão de Pássaro, o festival de rock, a mostra de cinema, a circulação de espetáculos cênicos, de circuitos de artes visuais, envolvendo e qualificando a meninada das periferias que só quer uma oportunidade para mostrar seu talento.
Investir na economia da arte já gerou resultados surpreendentes na Colômbia, assolada pela criminalidade. Mudou a face da economia de Portugal, que abastece seus visitantes com doses generosas de cultura, dando ao mundo uma aula de preservação do patrimonio histórico material e imaterial. Neste momento de crise civilizatória, de sobra cognitiva, de consumo patológico de coisas das quais não precisamos, as experiencias com a música, a dança, a gastronomia, a literatura e os saberes tradicionais são o alimento que ainda preenchem nossa alma cansada e agastada. O turismo nos conecta aos lugares e às gentes. A cultura nos conecta ao sonho e ao talento criativo, característico da experiencia humana. O mapa que indica a direção do crescimento econômico e da paz social está aí, para quem tiver olhos de ver. E que bom que o Brasil não precisa inventar nada - é só investir e dar chace pra essa gente bronzeada mostrar seu valor.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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