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    Moisés Mendes

    Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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    E se o povo desistir das ruas?

    "O Brasil está à espera da prova de que ainda tem juventude e estudantes com vitalidade física e política. É doloroso, mas é a realidade. Negá-la pelo silêncio é uma forma de reforçar a inércia e o desalento, escreve Moisés Mendes, do Jornalistas pela Democracia

    (Foto: Ricardo Stuckert)

    Por Moisés Mendes, do Jornalistas pela Democracia

    Muito antes da eleição de Bolsonaro, desde o golpe de 2016, as ciências sociais fraquejaram como orientadoras de rumos e de previsões. As ciências não são videntes, mas erraram quase tudo sobre as chances de Bolsonaro e o que veio depois.

    Agora, as ciências nos abandonam, talvez pelo medo de errar de novo, às portas do que nos espera em 2021. E um dos grandes dilemas acumulados no Brasil é o da inércia paralisante.

    As esquerdas lidam mal com uma questão elementar para qualquer possiblidade de protagonismo político. As esquerdas já não sabem, e a academia também não, se as pessoas têm força para voltar às ruas.

    Voltar não agora, não amanhã, mas quando as vacinas nos devolverem quase tudo do que tínhamos de normalidade. O povo pode voltar às ruas depois da pandemia?

    O povo que vai às compras sem medo na 25 de março, o espaço das mais famosas aglomerações do Brasil, pode retornar às ruas para reagir à inflação, ao desemprego, ao desalento, ao fim do auxílio emergencial e aos rolos da família Bolsonaro?

    Essa pode ser uma expectativa da classe média branca e crítica do que considera como o imobilismo dos outros. Mas essa mesma classe média que derrubou Dilma não reage desde antes da pandemia.

    Há silêncio nos corredores das universidades públicas ocupadas como nunca por pobres e negros. As velhas universidades e os novos institutos federais são o reduto de pobres, pardos e negros. E nunca o ambiente do ensino superior foi tão silencioso.

    A resignação é um incômodo para as militâncias e as ciências que ainda tentam compreender as esquerdas. Tudo está silencioso. O povo que chegou à universidade, o professor que acolhe o povo, a ciência que deveria entender o que se passa com o professor e o povo.

    O Brasil parece ter desistido de querer entender o alheamento geral. Somos um país de atritos e de torcidas, e toda torcida virtual parece militância, mas quase sempre é apenas torcida.

    Viramos o país do abaixo-assinado e das lives que nos confortam com ideias compartilhadas sempre pelas mesmas turmas.

    O Brasil pode ser um dos poucos países do mundo todo, inclusive o mundo paupérrimo, que não tem um plano de vacinação. É certamente a única grande democracia que nunca teve um planejamento de saúde pública contra a pandemia.

    E nada de consequente acontece. No Brasil, dois terços da população desistiram do governo e aguardam pelas instituições, que esperam pelo povo. A possibilidade de volta à normalidade pode ser apenas o aprofundamento das desilusões.

    Voltar à normalidade talvez não signifique a possibilidade de ver o povo nas ruas de novo (como aconteceu no golpe de 2016). Porque a normalidade política passou a ser o povo quieto em casa.

    As pessoas só saíram às ruas na pandemia por cansaço e para afrontar as medidas de prevenção. Quando puder sair para protestar e manifestar raivas, medos, demandas e os sonhos que restam, é provável que volte a ficar em casa, onde estava desde o golpe de agosto de 2016.

    O Brasil está à espera da prova de que ainda tem juventude e estudantes com vitalidade física e política. É doloroso, mas é a realidade. Negá-la pelo silêncio é uma forma de reforçar a inércia e o desalento.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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